Entrevista:O Estado inteligente

sábado, fevereiro 09, 2008

O custo de um filho: 1,6 milhão de reais

Sociedade
1,6 milhão de reais

Esse é o custo de criação do seu filho,
do nascimento até o fim da faculdade


Anna Paula Buchalla

Lailson Santos


Liderança e competitividade

"Cerca de 70% do que eu e meu marido ganhamos é investido na formação de nossas filhas. Além de freqüentarem uma boa escola, elas estudam dois idiomas. Queremos que dominem o inglês e o espanhol, para que tenham mais opções de escolha quando chegar a hora de estudar fora do país. Esse preparo não deve ser apenas intelectual, mas também emocional. Por isso, incentivamos a prática de esportes que desenvolvam o espírito de liderança. Marcella, a mais velha, faz equitação há três anos. São quatro aulas por semana, além das competições aos sábados e domingos. Gabriella, por sua vez, faz natação e tênis. São esportes que trabalham a competitividade."

Christiane Zanin, psicóloga, com o marido, Carlos Eduardo, e as filhas Marcella, de 12 anos, e Gabriella, de 7

VEJA TAMBÉM
Nesta reportagem
Quadro: Quanto custa ter um filho - do nascimento até o 23° aniversário

Há dois momentos de satisfação especial na vida de um pai e de uma mãe. O primeiro, obviamente, é o do nascimento do filhote. O outro é quando ele termina a faculdade, lá pelos 23 anos, em média. De uma alegria a outra, chora-se uma represa de lágrimas, consomem-se milhares de horas de sermões perfeitamente inúteis, ingerem-se toneladas de calmantes – e se gasta um Himalaia de dinheiro. Se a família for da classe média alta brasileira, papai e mamãe terão desembolsado, no mínimo, 1,6 milhão de reais, de acordo com um dos mais minuciosos levantamentos já feitos no país sobre o custo de criação de um filho. Para se ter uma idéia, esse valor é oito vezes maior do que o despendido com gasolina por uma família de quatro pessoas ao longo de 23 anos. Sob a coordenação do administrador Adriano Maluf Amui, pesquisadores do Instituto Nacional de Vendas e Trade Marketing (Invent) investigaram os hábitos de 320 famílias, de todos os estratos sociais. Mediram quanto cada uma delas gastava com alimentação, educação, saúde, babá, empregada, fraldas, roupas, sapatos, esportes, viagens de férias, mesada, festas, cinema, shows, equipamentos eletrônicos e brinquedos. A conclusão: criar um filho no Brasil, hoje, é cinco vezes mais caro do que há trinta anos – em todas as classes.

Os filhos tornaram-se mais dispendiosos, porque ao seu cotidiano e à sua formação foram incorporados diversos itens antes inexistentes ou que, de supérfluos, passaram a ser essenciais. A babá, por exemplo, deixou de ser um luxo reservado a poucos para se transformar numa necessidade de primeira ordem na vida das mães de crianças pequenas que trabalham fora – hoje, em número muito maior do que há três décadas. Os serviços dessas profissionais chegam a custar 1.500 reais mensais. Em relação à década de 80, no entanto, o quesito que registrou a maior alta foi aquele que os especialistas em pesquisa de mercado chamam de "tendências" ou "miscelânea". A saber, os gastos com brinquedos, computadores, telefonia e novas tecnologias. Hoje, essa cesta sai por dez vezes mais.

A educação também encareceu. Além de ninguém mais, em sã consciência, colocar os filhos na escola pública de livre e espontânea vontade, hoje se investe pesado em atividades extracurriculares. E isso significa muito mais do que o velho e bom curso de inglês. Não são raras as crianças que aprendem mais de um idioma estrangeiro. Para não falar das aulas particulares, contratadas nos momentos de maior aperto, e dos tutores. Sim, você leu certo: tutores. Muitas famílias contratam esse tipo de professor para auxiliar, durante todo o ano letivo, os filhos a tirar "proveito máximo" do que aprendem na escola e nos cursos de línguas. No campo das atividades físicas, à natação e ao balé vêm sendo agregados outros esportes – bem mais onerosos. "Cresceu o número de pais que buscam cultivar em seus filhos características como autocontrole, inteligência emocional e competitividade. Para isso, eles valorizam a prática de esportes diferenciados, como equitação, esqui, golfe, escalada e mergulho", diz Amui. A família Zanin, de São Paulo, gasta os tubos com escola, curso de idiomas e esportes para Marcella, de 12 anos, e Gabriella, de 7. A mãe, Christiane, calcula que 70% do orçamento da casa seja destinado à formação das meninas. Além de estudar inglês e espanhol, Marcella pratica hipismo – uma atividade que, na opinião dos pais, ajuda a desenvolver o espírito de liderança e a afasta dos videogames.

Stockbyte/Getty Images
Silêncio, criança ao teclado: os gastos com computador, telefonia e brinquedos são dez vezes mais altos do que nos anos 80

No levantamento do Invent, o item "lazer e entretenimento" ocupa o segundo lugar no ranking dos gastos. Ele consome, em média, 20% do orçamento familiar, superando inclusive as despesas com saúde. O clube (ou academia de ginástica), o cinema, o teatro, as festas de aniversário, as viagens de férias e os passeios custam cerca de 1 150 reais por mês. É um exagero? Possivelmente, sim. Se os filhos estão mais caros, é também porque inúmeros pais perderam o controle. Eles simplesmente não conseguem dizer "não", como se a frustração de expectativas materiais fosse um mal a ser evitado. Na verdade, é justamente o contrário. Ela é essencial no processo de constituição da personalidade, ao ajudar a demarcar limites.

As crianças e os jovens brasileiros são mais mimados do que a média mundial e, por isso mesmo, tendem a ser mais caros? Alguns dados apontam para uma resposta positiva. Um estudo realizado em doze países, feito por encomenda do canal de televisão Nickelodeon, revela que as crianças brasileiras são as que mais usam internet e celular. Ao todo, foram ouvidas 7 000 crianças de 8 a 14 anos. Aqui, 81% dos meninos e meninas usam o celular três ou mais vezes por semana e 66% acessam a internet diariamente. Outra pesquisa, realizada pela empresa TNS InterScience, com 500 famílias das classes A, B e C do Rio de Janeiro e São Paulo, mostra que 91% das crianças da classe A têm celular. Um quarto delas, aproximadamente, está na faixa dos 6 aos 9 anos. Será que meninos e meninas tão pequenos precisam mesmo de telefone portátil? "É importante fazer uma reflexão crítica sobre o que é necessidade e o que é apenas desejo dos filhos", diz a psicóloga Ceres Alves de Araujo, da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. "As necessidades, como um computador a ser usado nos estudos, devem ser atendidas na medida do possível. Já os desejos mais supérfluos devem ser controlados – para o bem dos próprios filhos." E para o bem do seu bolso, não esqueça.





Fotos Photodisc e Getty Images
Certifica.com

Arquivo do blog