Entrevista:O Estado inteligente

quarta-feira, fevereiro 20, 2008

Lulomania

 

Desta vez, o presidente Lula não discursou - nem precisava. No lançamento da Timemania, anteontem, no Palácio do Planalto, ele se limitou a posar ao lado de Pelé, sentado à sua esquerda, tendo como pano de fundo a imagem agigantada de uma bola de futebol. Havia cartolas por toda parte no salão, um mais grato do que o outro a Lula pela nova loteria criada para permitir que 98 clubes finalmente paguem, com dinheiro do apostador, suas montanhosas dívidas fiscais. Esse, de fato, será o destino de 22% do volume apostado - R$ 114 milhões já no primeiro ano, estima a Caixa Econômica Federal. Designado para falar pelos seus pares, o presidente do São Paulo Futebol Clube, Juvenal Juvêncio, definiu a iniciativa como “um saneamento do esporte mais popular deste país”. Transportado pelo júbilo, emendou: “Aquele que não fizer uma reverência (a Lula) vai ficar em débito com a história e os filhos irão cobrar de seus pais.”

Reminiscente das bajulações com que os áulicos se prostram diante dos autocratas - o que clamorosamente não é o caso de Lula -, a presepada merece registro apenas por ter sido proferida na mesma segunda-feira em que se divulgaram os resultados da mais recente rodada de pesquisas do Instituto Sensus para a Confederação Nacional do Transporte (CNT) sobre o que o público acha do governo e do seu dirigente. Pois com tanta nitidez esses resultados evidenciam o contentamento da grande maioria dos brasileiros com o presidente que poderiam ser invocados pelo deslumbrado cartola para justificar a forma bajulatória como exprimiu a sua gratidão. Lula não só continua nas nuvens, como foi alçado para maiores altitudes. Dois terços da população aprovam o seu desempenho - marca apenas superada pelos números do primeiro ano do seu primeiro mandato. E passam de 52% os que avaliam positivamente o governo - quase tanto quanto os 56% de janeiro de 2003.

Já não bastasse isso, 37% afirmaram ou que votariam ou que poderiam votar este ano em candidatos apoiados por Lula, ante 26% dos que não o fariam. A prova dos noves da popularidade de Lula está num paradoxo. À pergunta sobre o eventual efeito para a sua imagem das denúncias de mau uso dos cartões da administração federal, 48% dos entrevistados (ou 75% dos que disseram ter conhecimento do assunto) responderam que a crise a afeta, sim. Mas, cotejando esse dado com o da aprovação a Lula, na casa de 67%, chega-se forçosamente à conclusão de que parcela preponderante do público supõe que o caso prejudica a imagem presidencial - mas eles mesmos não se incluem entre os que teriam passado a vê-lo, em razão daquilo, através de lentes menos favoráveis. É o presidente-teflon: o que vai mal é culpa alheia, o que vai bem é mérito seu.

“A popularidade em alta de Lula”, observa o diretor do Sensus, Ricardo Guedes, “está ancorada no bom desempenho da economia e nos programas sociais.” A tal ponto que, para 61% das pessoas ouvidas na pesquisa, o País não vai parar de crescer, embora 39% temam que o Brasil não esteja preparado para enfrentar uma crise mundial. (Só pouco mais de metade da amostra se considera informada da questão.) O grosso da população tem razões objetivas e subjetivas para otimismo. De um lado, a vida melhorou. De outro, o otimismo de Lula contagia. Aliás, a própria trajetória dele, no imaginário popular, como que avaliza o seu otimismo. O fato é que o presidente brasileiro é o governante mais benquisto do mundo democrático - imune, de resto, ao desgaste do tempo no poder. Não surpreende que a Lulomania tenha escassos pontos de contato, se tanto, com a imagem do seu partido, qualquer que seja.

Por sinal, ele faz o que sabe para se dissociar ostensivamente do PT: nem apareceu na festa dos seus 28 anos, semana passada. E os companheiros nem podem se queixar, por serem devedores, e não credores de Lula. Fossem outros os ventos, Lula não poderia passar ao largo da confissão do novo secretário-geral petista, deputado José Eduardo Cardozo, de que o mensalão existiu. “Vou ser claro: teve pagamento ilegal de recursos para políticos aliados? Teve. Ponto final”, disse ele à revista Veja. “Não podemos esconder esse fato da sociedade.” Mas, para boa parte da sociedade, Lula não tem nada a ver com isso.

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