O Estado de S. Paulo
19/2/2008
A Vale, a segunda maior mineradora do mundo, anunciou ontem reajuste de 65% nos preços do seu principal produto, o minério de ferro. É um esticão substancial, de 369% desde 2003, ano em que a demanda por aço em todo o mundo começou a dar saltos consecutivos (veja o gráfico).
A novidade tem desdobramentos. O primeiro pode ser formulado por uma pergunta que encerra a resposta em si própria: se a demanda por aço no mundo é tão forte a ponto de ser capaz de justificar um reajuste do minério de ferro dessas proporções, que recessão global é essa, a mesma que tanto medo vem espalhando pelos mercados?
O desaquecimento pelo qual a economia americana está passando (e que talvez não seja recessão) não pode ser extrapolado para o resto do mundo. Como fica confirmado pela forte demanda por aço, as economias emergentes tendem a compensar em parte o rallentando americano.
Qualquer um sabe que o consumo de aço nunca cresce isoladamente. Onde vai aço vão outros materiais, especialmente metais. Se a produção e o consumo aparente dele vão se comportar dessa maneira neste ano, fica fácil entender que as outras commodities metálicas, um pouco mais ou um pouco menos, deverão acompanhar essa marcha. E é o que permite concluir que as matérias-primas metálicas, cujos preços são definidos diariamente nas bolsas de mercadorias, continuarão em alta.
O reajuste acertado pela Vale terá forte impacto na balança comercial brasileira. No ano passado, as exportações de minério de ferro alcançaram US$ 10 bilhões. Como as receitas tendem agora a crescer 65%, pode-se dar como mais ou menos certo que apenas as exportações desse item garantirão um faturamento de US$ 17 bilhões por um período de 12 meses. Ou seja, as atuais projeções de um superávit comercial neste ano da ordem de US$ 30 bilhões terão de ser refeitas para mais.
O reajuste do minério de ferro melhora as condições da Vale no seu pleito de compra da mineradora suíça Xstrata. Maior faturamento melhora sua capacidade de endividamento e tende a puxar para cima o valor de suas ações. A proposta original previa o pagamento de cerca de US$ 50 bilhões em empréstimos e de outros US$ 35 bilhões em ações preferenciais da própria Vale. Ontem, elas fecharam com alta de 5,08% na Bolsa de Valores brasileira. (A Xstrata é forte produtora mundial de cobre, zinco, níquel e carvão.)