Repensar a missão no Haiti
A s questões obviamente não se relacionam, mas é natural que a morte, segundo tudo indica por suicídio, do general Urano Teixeira da Matta Bacellar, que comandava desde agosto passado as forças de paz da ONU no Haiti, tenha tornado público um debate que de há muito se trava em surdina nos centros do poder federal. O tema é o da conveniência, para o interesse nacional, da expressiva presença militar brasileira naquele país caribenho assolado desde sempre por inviabilidades de toda ordem, nenhuma das quais alguma vez deu sinais consistentes de arrefecimento.
Em fevereiro de 2004, no que foi apenas a manifestação mais recente da selvageria política haitiana, uma revolta de setores da população e do Exército, com o apoio dos Estados Unidos, entre outros, derrubou e mandou para o exílio o presidente Jean-Bertrand Aristide, por corrupção e nepotismo - tão endêmicos ali como a miséria absoluta, o banditismo incontido, o tráfico de drogas e a aids. Para construir um simulacro de normalidade política, a ONU criou uma Missão para a Estabilização do Haiti (Minustah) amparada por uma força militar. O Haiti é nominalmente governado pelo presidente interino Boniface Alexandre.
A missão começou a operar em julho de 2004 e seu mandato, renovável, termina daqui a um mês. Os capacetes azuis que a integram somam 7.265. A Jordânia, com 1.500 soldados, e o Brasil, com 1.200, são os países mais engajados no que, diferentemente de outras missões do gênero, equivale antes a uma atividade policial contra a criminalidade disseminada, do que a um trabalho de separação e cumprimento de tréguas acertadas entre grupos políticos ou populacionais em conflito armado. O contingente argentino, para dar idéia, não chega a 500 homens.
Evidentemente, a decisão do presidente Lula de engajar intensamente o Itamaraty e o Exército na tentativa de impedir a desagregação total do Haiti, numa hobbesiana guerra de todos contra todos, faz parte da diplomacia de faróis altos que o Planalto considera um dos pontos altos do atual governo. A única diferença em relação a outras discutíveis iniciativas de criar alianças estratégicas e econômicas na periferia do sistema mundial de poder é que, neste caso, a convergência de pontos de vista entre Brasília e Washington não poderia ser maior (embora a última coisa que pudesse passar pela cabeça dos americanos seria voltar a ter tropas no Haiti).
Na enésima demonstração de que o país é um poço sem fundo de problemas e desgraças, o conselho eleitoral haitiano cancelou uma semana atrás as eleições presidenciais marcadas para o último domingo. A nova data anunciada é 7 de fevereiro, como exigiu a ONU, ficando o segundo turno para 19 de março. Valha o que valer essa decisão, o fato é que a força multinacional trava uma batalha sem perspectiva de vitória contra a delinqüência e - algo de que pouco se fala - a fúria dos partidários do deposto presidente, que não são poucos nem estão resignados.
Sintomaticamente, o diplomata chileno Juan Gabriel Valdez, comandante político do Minustah e representante pessoal do secretário-geral das Nações Unidas no Haiti, numa entrevista depois da morte do general brasileiro Urano Bacellar, precisou destacar que "estamos intensificando as ações militares em toda a cidade (a capital Porto Príncipe) para dar mais segurança à população e identificar os criminosos para combater os seqüestros" - a mando, acusou, de um dos candidatos à sucessão de Jean-Bertrand Aristide.
Esse é o substrato do debate sobre a presença brasileira no Haiti. Embora seja evidente que "o momento é inadequado" para questionar a missão, como diz o vice-presidente e ministro da Defesa, José Alencar - o Brasil ficaria desmoralizado se aproveitasse a tragédia pessoal do general Urano como pretexto para reduzir a sua participação na missão da ONU -, dado o caráter policial de suas atividades e o descumprimento da promessa do organismo de aplicar US$ 1 bilhão para melhorar a vida dos haitianos, antes cedo do que tarde a decisão brasileira terá de ser repensada.
Isso não significa que o presidente não deveria ter acionado o chanceler Celso Amorim para assegurar que o substituto do general falecido também seja brasileiro. Mas conviria que o Planalto não menosprezasse o risco diuturno a que estão expostos os "pracinhas" no Haiti - e a repercussão que teria a morte de um deles nas favelas de Porto Príncipe.
Entrevista:O Estado inteligente
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