Não sei se é intencional, mas o fato é que, do jeito que as coisas estão caminhando, o sistema de fundos de pensão do Brasil vai acabar inviabilizado. Há mais de seis meses os fundos estão sendo massacrados no noticiário com base em denúncias cujo tom está muito acima daquilo que se conseguiu provar até o momento. Fatos concretos têm sido levantados, punições têm sido aplicadas, e não há reclamações quanto a isso. Mas há um inconformismo entre administradores e participantes dos fundos em face da leviandade com que denúncias sem comprovação têm sido lançadas contra todo o sistema. Fatos isolados, pinçados de investigações ainda inconclusas, são apresentados como o “padrão” de todo um segmento.
É verdade que alguns fundos de pensão aplicaram recursos nos dois principais bancos investigados pela CPI? Sim, é verdade. Mas é também verdade que aplicaram em condições de mercado; que tiveram ganhos com essas aplicações e que aplicaram muito mais em outros bancos. É verdade que tiveram prejuízos em algumas operações? Sim, é verdade. Assim como é verdade que a grande maioria dos fundos tem superávit, com rentabilidades acima dos padrões do mercado. Esta dinâmica de selecionar fatos e lançá-los como denúncia antes que sejam devidamente apurados tem gerado um linchamento moral.
O sistema de fundos de pensão é composto por mais de 300 entidades, mas a CPI decidiu investigar somente 14. O critério de escolha ninguém sabe. Com base nas informações divulgadas pelo sub-relator, os fundos apresentam realidades muito diferentes entre si. Mas as manchetes, em 90% dos casos, diziam: “Fundos perdem mais de 700 milhões”. Como? Quando? Por quê? Para quem? A generalização combinada com a precipitação tem produzido um verdadeiro arraso na imagem dessas entidades.
Já tivemos a situação de quebra de bancos, e nem por isso vimos manchetes do tipo: “Bancos estão quebrados”. Segundo a lista de perdas divulgada, há dezenas de beneficiários dos “prejuízos” dos fundos de pensão, e entre esses beneficiários (cautelosamente não identificados) certamente estão os maiores bancos do país. E esse é o procedimento correto. Não se pode generalizar e jogar lama num setor importante como o setor bancário, sob pena de incorrermos em graves prejuízos.
Essa mesma lógica deveria ser aplicada aos fundos de pensão, que também são vitais para o país. Somente a Previ paga mais de R$ 4 bilhões anuais a aposentados e pensionistas. São recursos que ajudam as pessoas a consumir mais, criando um círculo virtuoso: mais consumo, mais produção, mais empregos. Os fundos são sócios das maiores empresas; geram empregos e, indiretamente, suportam relevantes projetos sociais. Duas das principais exportadoras, a Vale do Rio Doce e a Embraer, têm recursos dos fundos de pensão em seu capital. A Perdigão, cujos controladores são fundos de pensão, já anunciou um novo investimento que vai gerar mais de 10 mil postos de trabalho. É ou não é um setor fundamental para o país?
Os fundos de pensão estão pagando um preço alto pelos defeitos até agora identificados, e talvez estejam pagando um preço ainda maior pelo que fizeram de melhor. Não há nenhuma prova até agora de que este ou aquele fundo tenha contribuído para algum “dinheiroduto”. Mas todos sabem que o ano de 2005 foi marcado pela batalha onde alguns fundos pisaram na mangueira que provavelmente irrigava de forma bem liberal alguns jardins. Boa parte dos ataques que tem vitimado os fundos de pensão tem como pano de fundo uma disputa empresarial, na qual assumimos uma intransigente defesa dos interesses dos seus participantes.
Os fundos formam um sistema muito importante para o país. Mas estão tendo dificuldade em mostrar o que fazem e como fazem. Justamente quando vivem um momento virtuoso em termos de rentabilidade, padrões de gestão, contribuições para o mercado de capitais, melhoria da segurança atuarial etc. Defeitos existem e há um grande esforço para enfrentá-los. No entanto, a crise jogou os fundos no olho de um furacão que ameaça destruir tudo que está sendo feito.
Está na hora deste alerta. Que os que se preocupam com o futuro do país se apressem.
SÉRGIO ROSA é presidente da Previ, fundo de pensão dos funcionários do Banco do Brasil.