Entrevista:O Estado inteligente

domingo, janeiro 29, 2006

ALBERTO TAMER: Carta aberta ao ministro Furlan

OESP

ALBERTO TAMER: Carta aberta ao ministro Furlan

Alberto Tamer

Meu caro ministro, nos conhecemos há muito tempo.Tenho acompanhado a sua luta vitoriosa e inglória, desde que entrou no governo levando a enorme experiência de um empresário exportador de sucesso. Todos no País estão vendo os resultados obtidos com este extraordinário aumento das exportações, embora relativamente pequeno diante da verdadeira explosão do comércio mundial. Todos estão vendo sua luta, emperrada pelo próprio governo, de consolidar o esforço que, o senhor e todos nós sabemos, não poderá ser mantido com o mesmo êxito nas condições atuais nas quais falta quase tudo, o essencial, investimento, infra-estrutura, juros, câmbio, estímulo. O senhor sabe muito bem que só as grandes empresas estão conseguindo absorver o choque das contradições geradas pelo próprio governo.

Esta carta tem como objetivo louvar a sua extrema coragem ao denunciar novamente a falta de metas de crescimento a longo prazo, de investimento, de taxa de câmbio, de infra-estrutura.

O senhor repetiu o diagnóstico na reunião de Davos; não pode ser acusado de criticar o Brasil no exterior simplesmente porque o senhor tem insistentemente repetido tudo aqui, no Brasil, onde ninguém, pelo menos em Brasília, o ouve.

Por coincidência, ministro, foi esse o tema da coluna de quinta-feira, sob o título Confiam, mas não acreditam. Dizíamos que os personagens do mercado financeiro nos emprestam dinheiro porque, graças à boa administração financeira e fiscal, somos um bom risco, mas não investem no Brasil porque não temos metas, não temos planos, não respeitamos acordos, não abrimos a economia para esta pletora de recursos ociosos que circula pelo mundo numa fase inaudita de extrema liquidez. Esses recursos, ministro, como o senhor disse em Davos, estão indo para a China, na qual "o novo plano qüinqüenal obviamente motiva investimentos", e para a Índia.

O senhor lembrou com muita coragem – e é só isso que ainda o mantém num governo surdo – que "o Brasil tem metas para o comércio exterior, mas não tem assumido compromissos públicos de longo prazo, nem sobre taxa de câmbio, nem sobre investimentos em infra-estrutura". Está subentendido que sem projetos confiáveis, que sejam concretizados, as empresas investidoras não virão para o Brasil, como não estão vindo. Foi isso o que o senhor ouviu em Davos.

NÃO É TUDO

Ministro, o senhor foi extremamente honesto ao reconhecer o êxito da política no que diz respeito à situação fiscal e financeira. "Há uma situação inusitada de quem dirige a política econômica e mantém os mercados tranqüilos, mas, no final, este componente de oportunidade de crescimento está associado à possibilidade de assunção de riscos." E vai mais longe: "No momento em que alcançamos metas estabelecidas (a confiança do mercado financeiro), obrigatoriamente temos de pensar em desafios novos, além da manutenção daquilo que foi conquistado. Em nenhum momento devemos pensar em abandonar o que se conquistou, mas isso não é suficiente. É necessário, mas não suficiente."

Precisamos atrair capitais externos com urgência, abrir a economia, ter metas!!!!

MAS NÓS JÁ TEMOS!

É o que devem estar dizendo em Brasília. O governo deu prioridade a metas sociais – estas sim, importantes, pois ajudam a tirar a maior parte da população da miséria – e, quando falo em miséria, falo do salário mínimo de R$ 300 recebidos pela maioria dos trabalhadores. Temos metas para atender aos que passam fome, para dar-lhes um pouco mais de renda, coisa aí de R$ 50.

Mas estas são metas assistencialistas, são "a cultura da esmola". Não são metas, são subterfúgios da pobreza, não atacam a essência do desafio de um país que ainda não encontrou seu destino.

Por que esta divagação? Não é divagação. Abandono social não se combate só com "ajuda". Mas com emprego. E aqui, ministro, o senhor acertou de novo: emprego só se cria com investimento que gera emprego, produção, consumo, abre oportunidades, gera crescimento num círculo virtuoso que a China já põe em prática.

E o senhor disse muito bem, não temos meta de longo prazo de crescimento econômico. E, sabe, meu caro ministro, sem isso, vamos ficar ainda marcando passo enquanto outros, como a China e a Índia com todos os seus problemas de castas, religiões, atraso e 1 bilhão de habitantes passam à nossa frente, arrancam (não, nem precisam arrancar, nós os escorraçamos...) os investimentos externos que poderiam estar vindo para o Brasil, criando melhores condições de vida para uma população pobre; só doação de esmolas não não cria um cidadão, um país menos pobre.

Vou finalizar esta carta aplaudindo sua extrema coragem em dizer o que ninguém em Brasília quer ouvir, pedindo que resista ao desânimo, à vontade – e sei que isso existe, pois é humano – de voltar para casa. Fique, ministro. Lute para que alguém neste governo desmembrado se convença de que só com investimento é que este País pode sair da modorra. Investimento venha de onde vier, desde que, a exemplo do que fazem nos EUA: invista aqui nos setores em que precisamos e lhes prometemos dar até mesmo a cidadania americana!

Ministro Furlan vá em frente! O senhor sabe do que este País precisa e este País precisa saber que precisa do senhor. Não deixe que continuemos a repetir, como até agora, videotapes de gols que não marcamos!


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