GLOBO
Pois não é que, depois de uma única experiência, o pessoal horizontalizou a verticalização?
Este nome comprido nasceu numa decisão do Tribunal Superior Eleitoral em 2002; só nas eleições daquele ano foi aplicada. Não existe, portanto, avaliação continuada de seus méritos ou defeitos. O que se viu foi o conjunto dos partidos tomando uma decisão mais pensando nos fins do que nos princípios. O que era conveniente para os grandes partidos em 2002 deixou de sê-lo quatro anos depois.
O TSE determinara que, como os partidos brasileiros são nacionais, só poderiam fazer alianças eleitorais regionais com agremiações a que estivessem aliados no plano federal. Pelo menos em tese, era uma exigência a favor da coerência e da lógica na arena política.
Seria também parte importante da reforma política — embora mereça meditação o argumento de que o carro estaria adiante dos bois: a exigência de uniformidade nas alianças só faria sentido quando as regras do jogo produzissem coerência ideológica dentro dos próprios partidos, levando-os a pactos federais com legendas aparentadas.
Ou seja, ela por si só não tornava o sistema político brasileiro mais coerente e mais honesto. E talvez interessasse defender sua sobrevivência apenas na esperança de que à verticalização se juntassem, fortalecendo-a, outros itens da reforma que a classe política, há anos, declara necessários e urgentes.
Chega a ser engraçado algo ser considerado urgente há muitos anos.
Sozinho, qualquer item da reforma política é como isoladas andorinhas: não faz verão. As possíveis virtudes da verticalização talvez só pudessem ser avaliadas corretamente num quadro em que cada partido, no plano federal, fosse devotado, de forma consistente, a princípios e metas programáticos. Isso não existe no Brasil. Só vêm à memória dois partidos que mostravam essa consistência: o velho Partido Comunista Brasileiro e o igualmente falecido Partido Liberal de Raul Pilla, defensor histórico da adoção do parlamentarismo no Brasil.
Hoje, não há qualquer partido sobre o qual seja possível dizer, a priori, que tomarão esta ou aquela decisão porque assim determina seu programa. No entanto, em geral, apenas diretórios estaduais e municipais são denunciados como infiéis que rezam nos altares da conveniência e aceitam fechar alianças com legendas que adotam cartilhas inteiramente diferentes das suas.
Essa distorção seria evitada, em tese, pela exigência de fidelidade às alianças negociadas no plano federal. Ou seja, pela agora abatida verticalização. Mas quem diz que as alianças federais têm coerência programática? Se não têm — examine-se, a propósito, o casamento PT-PL nas últimas eleições — a disciplina vertical obviamente deixa de ser sinônimo de fidelidade a idéias e princípios.
Pode-se sonhar que a reforma política acabará sendo levada a cabo dentro de uns tantos anos: quem viver, verá cada legenda reunindo políticos com idéias essencialmente iguais. Eventualmente, partidos farão alianças eleitorais, coerentemente verticais, com outros que talvez não sejam irmãos, mas pelo menos primos ideológicos.
Contra o sonho há o argumento de que o pragmatismo — ou o oportunismo barato, segundo eleitores impacientes a ponto de dar aos bois seus verdadeiros nomes — sempre será eleitoralmente vantajoso. E por isso sempre prevalecerá.