FOLHA
Na discussão sobre TV digital, pela primeira vez há uma presença -ainda que simbólica- de ONGs (organizações não-governamentais). São personagens desse jogo alguns atores que já existem -como TVs educativas e rádios comunitárias-, e outros que ainda não entraram no jogo: como produtores independentes, promotores de eventos, federações esportivas etc. Esse grupo de ONGs se reuniu em torno da Intervozes e tem como principal analista o jornalista Gustavo Gindre.
O pecado original brasileiro, diz Gindre, foi ter criado uma Lei Geral de Telecomunicações em um momento em que, em todo o mundo, se unificavam as legislações de telecomunicações e radiodifusão.
Agora, se está em uma sinuca. A União Européia criou o serviço de licença universal. Tem-se o espectro eletroeletrônico, a empresa paga pelo uso e coloca o que quiser. A Anatel (Agência Nacional de Telecomunicações) tende a adotar esse conceito, só que não pode radicalizar porque a legislação impede. Recentemente, pegou 23 outorgas da Marinha Mercante, serviços de pager, e unificou todas em um SCM (Serviços de Comunicações Multimídia) em regime privado (isto é, disponível para públicos com acesso restrito).
Hoje em dia o espectro de VHF e UHF só serve para a TV aberta. Cada emissora possui 6 mHz para o canal analógico. Se der outra janela de 6 mHz para o digital, dobra o latifúndio, diz Gindre. E aí não haverá como entrarem novos canais no Rio, na Grande São Paulo, na Baixada Santista e em Porto Alegre.
Para contornar esse problema, a Intervozes propõe a figura do operador de rede, separado da figura do programador. A legislação diz que não existe direito adquirido sobre espectro, que é bem público. O operador de rede quebraria o paradigma atual, de a TV ser conhecida pelo canal. Na era digital, a TV será conhecida pela programação. O que diferenciará a TV aberta dos demais serviços será a grade de programação.
Por isso mesmo, a Intervozes é favorável ao padrão europeu, que permite quatro transmissões simultâneas em um mesmo espectro. As emissoras abertas defendem o padrão japonês, que permite a imagem em alta definição, mas que ocupa todo o espectro de freqüência. Gendri sustenta que poucos aparelhos teriam condição de captar toda a sua qualidade. A imagem estendida, do padrão europeu, além de ocupar muito menos espectro, teria mais qualidade do que a dos DVDs atuais e liberaria espectro para outros usos.
Outra das vantagens do operador é que ele arcaria com o custo das torres de transmissão. Se cada emissora bancar a sua estrutura, as mais fortes prevalecerão sobre as mais fracas, criando diferenciais importantes na cobertura nacional.
Gendri reconhece que, com o novo modelo, haverá dispersão das verbas publicitárias o maior temor das emissoras abertas. Mas acredita que elas possam se reinventar. Com a TV digital, seria possível às emissoras criarem seus serviços de e-mail e outras maneiras de rentabilizar o negócio.
Mas ainda não está claro o que seria essa "reinvenção" da TV aberta.
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