Entrevista:O Estado inteligente

domingo, janeiro 29, 2006

CLÓVIS ROSSI Hipocrisia

FSP

DAVOS - Os Estados Unidos e Israel fizeram tudo o que podiam para tirar de cena o mais histórico líder dos palestinos, Iasser Arafat. Acusavam-no de estimular o terrorismo ou, no mínimo, de ser conivente.
Arafat morreu, subiu Mahmoud Abbas, o terrorismo continuou, assim como a pressão norte-americana sobre o, digamos, déficit democrático nos territórios palestinos e sobre a corrupção dos quadros dirigentes.
As duas acusações são verdadeiras, inteiramente no segundo caso, com ressalvas no primeiro. Afinal, a eleição palestina de 1996, primeira e única até quinta-feira, foi legitimada pelos observadores internacionais como "livre e justa", tal como rezam os cânones globais. Não há outro país árabe a cujas eleições se possa aplicar idêntico carimbo.
Bom, aí vêm as eleições, ganha o Hamas, movimento que tem um braço terrorista e outro assistencialista. O Ocidente fica feliz pelo triunfo da democracia? Nadica de nada.
É uma tremenda hipocrisia ocidental. Não pode haver democracia se se impede alguém ou alguma corrente política de concorrer e, mais ainda, de vencer.
Já aconteceu na Argélia, há 14 anos. Os fundamentalistas islâmicos ganharam o primeiro turno de uma eleição, e o segundo foi cancelado para evitar a cristalização da vitória. Instalou-se uma ditadura, veio a guerra civil e um banho de sangue. Mas o Ocidente nem ligou porque a Argélia fica fora do radar.
Aconteceu antes na América Latina toda: a pretexto de evitar supostas ditaduras comunistas, instalaram-se reais ditaduras militares, com seu cortejo de sangue.
Não dá para aceitar a tese implícita de que os palestinos votaram no Hamas porque são todos terroristas, hipótese em que se justificaria sufocar economicamente os territórios. Votaram porque vivem em condições precárias, e grande parte da culpa é de Israel e das potências ocidentais. Ou se enfrenta a questão como ela é ou só haverá mais terrorismo.

@ - crossi@uol.com.br

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