O prenúncio de que a ministra-chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff, participará das campanhas petistas “nas horas vagas” mostra que o governo Lula está deixando de lado a tese de que eleições municipais nada têm a ver com as nacionais, para testar a viabilidade de sua candidata preferencial à sucessão presidencial. E foi o PT quem nacionalizou o debate, disposto a checar nas urnas a recuperação de imagem que as pesquisas de opinião apontam. Por elas, o PT voltou a ser o partido político mais reconhecido dos eleitores. Na capital mineira, o PT vetou o acordo formal com o governador do PSDB, Aécio Neves, apenas para não fortalecer sua posição na corrida sucessória.
A eleição paulista, por exemplo, é sintomática dessa nacionalização da campanha eleitoral. Lá estarão em confronto não apenas os candidatos a prefeito, mas dois possíveis candidatos a presidente em 2010: o governador José Serra e a ex-prefeita Marta Suplicy.
Confirmando nas urnas os atuais prognósticos, Marta Suplicy surgirá imediatamente como forte candidata a candidata dentro do PT, ofuscando a ainda incipiente candidatura de Dilma Rousseff.
O fato é que a campanha municipal deste ano já está sendo fortemente impactada por questões nacionais, desde a busca do PT pela hegemonia nas grandes cidades até a disposição da oposição de levar para os palanques a inflação, que volta a dar o ar de sua desgraça. Ao lado de repetir a tática de todo governante, que é acusar a oposição de impatriótica quando levanta a questão da inflação como bandeira de campanha eleitoral — o mesmo que o PT fazia quando era oposição, relembrese —, o governo faz muito pouca coisa para tentar controlar esse problema.
O programa agrícola para ajudar a reduzir o preço dos alimentos é de longo prazo, e as medidas para reduzir os financiamentos que estimulam o consumo são tímidas, tudo porque o governo, na definição crua do ministro do Planejamento, Paulo Bernardo, quer combater a inflação “sem esculhambar a economia”.
O presidente Lula tem se queixado a interlocutores de que seu esforço para o governo fazer um superávit primário cada vez maior não é reconhecido.
Na verdade, mesmo aumentando o superávit para 4,3%, os gastos do governo continuarão crescendo mais do que o PIB, o que neutraliza qualquer efeito e pressiona a inflação. Segundo o economista Fábio Giambiagi, do BNDES, quando o PIB crescia pouco era compreensível que a relação gasto/PIB aumentasse, porque há custos que crescem demograficamente.
Quando a economia está crescendo forte, como em 2007 e neste ano, seria a oportunidade para determinadas rubricas crescerem menos. “Estamos perdendo a chance de reduzir a relação gasto/PIB, e apesar disso o investimento público tem sido inferior ao que era nos anos 80”, ressalta Giambiagi.
O que está acontecendo este ano é que as quatro principais rubricas de gasto do governo (transferências para estados e municípios, gasto com pessoal, INSS e outras despesas de custeio e capital) estão se comportando de maneira atípica, o que dá a falsa impressão de que o superávit primário, de 6,5% nos primeiros cinco meses, é um número para ser levado em conta.
A rubrica Pessoal e Encargos Sociais, por exemplo, está crescendo apenas 2% até agora, mas todos os acordos que o governo fez vão impactar fortemente o segundo semestre, e a taxa de crescimento do ano será superior.
A receita total das transferências para estados e municípios está crescendo em torno de 11% mas sem CPMF, o que significa, realça Giambiagi, que outros impostos estão crescendo muito. O IPI e o Imposto de Renda, que são a base de arrecadação das transferências para estados e municípios, estão crescendo em torno de 20%.
O gasto com aposentadorias está controlado este ano por conta da maior fiscalização na concessão do auxíliodoença, que nos anos 2005 e 2006 cresceu muito por culpa de fraudes que estão sendo combatidas. O economista Fábio Giambiagi adverte, no entanto, que no ano que vem este fator vai acabar e o aumento do salário mínimo e dos aposentados, com base no INPC, será maior devido à inflação este ano.
Segundo os estudos de Giambiagi, os gastos públicos que mais aumentaram no período 1991/2008 — passaram de menos de 14% do PIB para uma estimativa de mais de 22% este ano — foram aqueles considerados como “gastos sociais”. O país vive uma situação paradoxal. Embora seja defensor ferrenho de novas reformas, especialmente a da Previdência, Giambiagi admite que a idéia de que, na ausência de reformas estruturais o país poderá enfrentar um colapso das contas públicas no horizonte dos próximos anos, “poderá se revelar equivocada, se a economia tiver um crescimento anual da ordem de 4% a 5%”.
Mas com a crise internacional que se agrava e a inflação aumentando internamente, muito influenciada pelos problemas internacionais, caso a economia tenha um crescimento modesto, abaixo de 4% do PIB, sérios problemas poderão surgir, adverte Giambiagi. Para ele, o risco de não fazer novas reformas está exatamente em “não abrir espaço fiscal para a realização das obras de infraestrutura de que o país tanto precisa, e que devem em parte implicar uma participação importante do governo”.
E que são fundamentais para garantir um crescimento sustentado maior, mais próximo de 5% ao ano.
Saio de férias por 15 dias e volto a publicar a coluna na terça-feira, 22, diretamente de Nova York, de onde acompanharei a campanha eleitoral americana no segundo semestre.
Estarei na Universidade de Columbia, no Centro de Estudos Latino-Americanos, como visiting scholar.
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