O Globo |
29/7/2008 |
Diante do anúncio de que o próximo presidente dos Estados Unidos terá pela frente um déficit público de U$482 bilhões, tanto o candidato democrata Barack Obama quanto o republicano John McCain voltaram suas críticas e suas preocupações para o campo econômico, abandonando os temas internacionais que deram a Obama destaque especial na percepção do eleitorado depois de sua viagem ao exterior. No centro da discussão, a dependência da gasolina e políticas alternativas que tanto compensariam os custos do atual modelo quanto atenderiam às necessidades de proteção ambiental. Os Estados Unidos importam aproximadamente 70% do petróleo que consomem, ao custo anual de US$700 bilhões. Da metade da década de 70 até a década de 90, o consumo médio de combustível de todos os veículos existentes nos EUA dobrou, de 6 para 12 km por litro. Para se ter uma idéia do que isso representa, o preço médio da gasolina nos Estados Unidos ficou nas últimas semanas acima dos US$4 por galão (US$1,06 por litro), mais que o dobro de cinco anos atrás. A previsão é que, com os preços subindo, cerca de dez milhões de automóveis deixem de circular. Os efeitos já estão sendo sentidos, e são negativos na economia, embora positivos para o meio ambiente. Um estudo do Departamento de Transportes mostra que nos últimos sete meses os americanos rodaram menos 3,7% milhas em maio em relação ao mesmo mês do ano passado. A queda representa pouco mais do dobro da redução que já havia sido registrada em abril. Em conseqüência, a arrecadação de taxas e impostos para conservação das estradas caiu drasticamente. As pesquisas mostram que as questões econômicas estão no centro das preocupações dos eleitores e, embora a crise possa ser atribuída ao governo Bush, esse fato não favorece Obama, embora também seja prejudicial a McCain. O fato é que os eleitores não sentem firmeza em nenhum dos dois candidatos, diante do tamanho da crise econômica. A maneira de enfrentar a questão energética é crucial para a definição do eleitorado, e cada um dos candidatos tenta jogar em cima do outro a culpa pela alta do preço da gasolina. McCain recentemente divulgou um anúncio na televisão acusando políticos como Obama de serem responsáveis pela alta do preço do petróleo, por não aprovarem a exploração costeira, ao mesmo tempo em que parabenizou o presidente Bush quando o barril do petróleo teve uma queda grande nos últimos dias. Obama, por sua vez, atribui a políticos como McCain a dependência do petróleo estabelecida por um modelo econômico montado nos últimos 30 anos, tempo em que Obama não estava na política, mas McCain estava. O assunto é tão delicado para o consumidor americano que, nas primárias, a senadora Hillary Clinton propôs que um imposto sobre a gasolina fosse cortado, pelo menos durante o verão, para baratear seu preço, mais ou menos o que fez no Brasil o presidente Lula ao reduzir a Cide. Enquanto Obama a acusava de populista, e propunha o aumento de investimentos em energias alternativas - e votou a favor do subsídio do milho para a fabricação do etanol - McCain tem propostas mais amplas, embora discutíveis, como trocar a frota governamental por carros que gastem menos combustível e prêmio de US$300 milhões para quem inventar um carro a bateria. Mas a base de seu programa de energia é de longo prazo: a reabertura da exploração do petróleo e gás em áreas da costa no país, cujo resultado é bastante improvável. Basta ver que o número de permissão para exploração de poços de petróleo dobrou nos últimos cinco anos sem que houvesse efeito no preço. E a crítica ao projeto de McCain veio de onde menos se esperava, de um antigo e fiel aliado político dos conservadores, o magnata do petróleo T. Boone Pickens. Os serviços prestados por Pickens aos republicanos são incontáveis, desde o puro financiamento de campanha quanto o apoio financeiro a grupos que atuam a favor dos republicanos. O episódio mais conhecido aconteceu na eleição de 2004, quando ele financiou com US$3 milhões uma campanha na televisão de veteranos da Guerra do Vietnã contra o candidato democrata John Kerry na campanha de reeleição de Bush, no que foi considerada uma das campanhas difamatórias mais violentas das eleições presidenciais. O grupo chamado Swift Boat Veterans colocava em dúvida os feitos de Kerry que lhe valeram medalhas e honrarias no Vietnã, e o acusava de ter traído a pátria quando criticou a guerra em campanhas públicas. Pois foi este aliado, e ainda por cima dono de poços de petróleo, quem patrocinou uma campanha pela televisão que custou cerca de US$60 milhões advertindo que de nada adiantará perfurar mais poços de petróleo, pois o que é preciso é reduzir a dependência do petróleo. Pickens está investindo no Texas US$10 bilhões na construção do que é considerado o maior projeto de energia eólica do mundo, e o governo do Texas já aprovou um programa de linhas de transmissão no valor de US$4,9 bilhões. Esse "patriotismo" pragmático do magnata Pickens é que pode trazer novos ventos para a economia americana. Assim como ele está trocando o petróleo pelo vento, também a economia americana vai ter que se adaptar aos novos tempos, trocando a poluição e a dependência do petróleo por energias alternativas. Esse é um tema que definitivamente entrou na agenda americana. |
Entrevista:O Estado inteligente
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