Trata-se do surgimento global de uma nova massa de consumidores de classe média, que parece pegar desprevenidos analistas de todas as tendências que nunca deram grande importância a esse segmento.
Os marxistas os denominavam pequeno-burgueses, cujo papel político e social era servir de massa de manobra para o jogo das classes dominantes. Os defensores da Teoria das Elites tampouco viam neles capacidade de inovação e de liderança, embora reconhecessem sua importância no suporte dos modelos democráticos de governo.
Os novos fatos exigem aprofundamento. Há três semanas, a equipe dirigida por Jim O?Neill, economista-chefe do banco americano Goldman Sachs, divulgou estudo (The expanding middle: the exploding world middle class and falling global inequality) que chega a conclusões surpreendentes.
Uma delas é a de que as classes médias protagonizam processo sem precedentes na história recente da humanidade. Vêm contribuindo para uma melhora substancial da distribuição de renda e tendem a mudar os padrões de consumo e das relações de poder. As classes médias globais crescem 70 milhões de pessoas por ano. Até 2030, serão 2 bilhões a mais do que hoje.
O?Neill foi o economista criador da sigla Bric, formada pelas iniciais dos quatro países emergentes (Brasil, Rússia, Índia e China) que, segundo ele, são fortes candidatos a se tornarem países de economia de ponta.Também se notabilizou por defender a tese do descolamento (decoupling), segundo a qual os emergentes estão imunes à atual crise financeira dos países ricos.
Tentar definir o que seja classe média é caminhar sobre campo minado. Discute-se até mesmo sua relevância econômica, social, política e cultural. Um tanto vagamente, fazem parte das classes médias (ou remediadas) gerentes, intelectuais, profissionais liberais. Às vezes, são chamadas de "minoria silenciosa", outras, de "colarinhos brancos", ou os que ganham a vida nas administrações públicas e privadas.
Os autores do estudo do Goldman as definem de acordo com o padrão de consumo: "São aqueles cuja renda se situava em 2007 entre US$ 6 mil e US$ 30 mil por ano, medida pelos Padrões de Poder de Compra (PPP, na sigla em inglês)." Na prática, correspondem à faixa central de três quintos da estrutura de renda da população mundial (veja o gráfico).
Não existem apenas as classes médias. Existem também economias (ou países) de classe média. Em 2050, serão pelo menos nove: Brasil, Índia, China, Egito, Filipinas, Indonésia, Irã, México e Vietnã, e serão responsáveis por pelo menos 60% do PIB global.
A professora Lourdes Sola, da USP, avança que não dá para negar que coisas novas acontecem e que as tentativas de sistematizá-las estão apenas começando. Uma das conclusões que se podem tirar é que o processo de globalização é includente e não excludente, como parecia consensual entre estudiosos.
Ficam para amanhã as implicações econômicas, políticas e culturais desse novo fenômeno.