PANORAMA ECONÔMICO
O mundo está diante de uma chance. As crises e os bons ventos se somam para criar a oportunidade.
O discurso emocionante de Barack Obama em Berlim mostra que os Estados Unidos podem voltar a ter liderança, aquela que é merecida, e não imposta. A crise americana e o fortalecimento de países emergentes vão reequilibrar o poder econômico. Há quedas que vêm para o bem; como Berlim já ensinou.
A queda do PIB relativo dos Estados Unidos é mais importante diante do crescimento da força dos emergentes.
O gráfico abaixo, feito com dados do FMI, é a tradução, em linhas, da idéia defendida pelo jornalista e escritor Fareed Zakaria no seu livro “The Post-American World”. Ele sustenta que o mundo está em transformação; não pela decadência dos EUA, mas, sim, pela “ascensão de todos os outros”.
Não é a queda do império, mas a superação dele e a evolução para um mundo pós-americano. O fim de um poder incontrastável, o começo de uma era de poder mais dividido e harmônico.
Os Estados Unidos, segundo o FMI, tinham 32% do PIB mundial em 2001; em 2010, terão 22%. Enquanto isso, os países emergentes e em desenvolvimento terão saído de 20% para 32%.
Neste aspecto, a crise econômica americana, por mais dolorosa que seja para quem a vive, fortalece o movimento de redução da parcela do PIB engolida pela primeira potência. Pode-se esperar disso um Estados Unidos menos unilateralista? O auge do unilateralismo foi a posição cega do governo de George Bush de passar por cima da resolução da ONU, atropelar velhos aliados, como a França, novos parceiros, como a Alemanha, para invadir um país atrás de armas de destruição em massa que não existiam a não ser em relatórios manipulados por assessores presidenciais.
O “improvável” Barack Obama, como ele se definiu diante dos berlinenses, ao falar da sua origem multiétnica, bicontinental e plurissocial — “eu sei que não me pareço com outros americanos que previamente falaram nesta grande cidade” —, mostrou o quanto ele se parece com outro líder americano que falou naquela mesma cidade, há 45 anos.
John Kennedy, ao dizer “eu sou berlinense”, sintetizou o espírito de um sonho de conciliação.
Obama, de novo, sintetiza uma época quando pede ao mundo que “olhe para Berlim” e ressalta o que ver: o lugar onde os muros caem. Lá americanos e alemães voltaram a confiar uns nos outros, três anos depois de se enfrentarem num campo de batalha; lá o povo derrubou um muro que dividia um país e o mundo.
Num planeta ameaçado pelo terrorismo, que derrubou duas torres no coração de Nova York há menos de sete anos, parece utópico falar em superação de diferenças, porém é inevitável ressaltar tais valores para superar a onda de intolerância que alimenta o ódio ao imigrante, ao diferente.
Duzentas mil pessoas aplaudindo, numa praça pública européia, um candidato a presidente dos Estados Unidos é mais um motivo para se olhar para Berlim.
E pensar. Os EUA exibiram a força do seu poder bélico e minaram sua liderança no mundo. A chance que as eleições trazem é de uma renovação da liderança, como só se viu nos breves anos do começo da década de 60. A chance da perda da importância relativa da economia americana no PIB mundial é a do reequilíbrio do poder econômico internacional, com o aumento da força de potências médias.
Zakaria, editor internacional da “Newsweek”, sugere que os americanos olhem em volta e atentem para fatos simples: o maior prédio do mundo fica em Taipé e, em breve, será um de Dubai; a maior companhia aberta fica em Pequim; a maior refinaria está sendo construída na Europa; o maior avião de passageiros é europeu; a maior indústria cinematográfica fica em Hollywood; o maior fundo de investimento é de Abu Dhabi. Aliás, o fundo que resgatou o emblemático Citibank.
Claro que poder não é essa coleção de recordes, mas até recentemente todos os maiores ficavam nos Estados Unidos. O escritor americano, nascido na Índia, acha que detalhes assim ilustram uma nova mudança do poder mundial.
Obama em Berlim usa o mesmo fato que separou os EUA do mundo — o terrorismo — para convocar à união no combate às drogas, à pobreza, e às ameaças terroristas.
“Neste novo mundo, essas perigosas correntes foram mais rápidas que nossos esforços para contê-las. Por isso não podemos nos dar ao luxo da divisão. Nenhuma nação, não importa qual seja seu tamanho e poder, pode vencer tais desafios sozinha.
Nenhum de nós pode negar estas ameaças ou fugir da responsabilidade de enfrentálas.” Liderança legítima e reequilíbrio de poder são as chances do mundo neste momento. Podemos perdêlas.
Ou não.
Entrevista:O Estado inteligente
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