Entrevista:O Estado inteligente

sexta-feira, julho 25, 2008

Merval Pereira - Presidente do mundo




O Globo
25/7/2008

Os alemães levaram a sério a piada que diz que todos os cidadãos do mundo deveriam ter direito a votar para presidente dos Estados Unidos, devido à influência americana nos rumos do mundo em que vivemos, e foram às ruas de Berlim aos milhares para saudar "o seu candidato". Mesmo com a redução relativa dessa influência, devido ao surgimento de novas forças econômicas, entre as quais países emergentes, à frente China e Índia, que já representam quase metade do PIB mundial, e toda a crise econômica que está devastando sua economia, os Estados Unidos continuam sendo a maior, se não a única, potência mundial.

E foi na qualidade de candidato a "presidente do mundo", como ressaltou um jornal alemão, que Barack Obama falou para mais de 200 mil pessoas em Berlim. O discurso, que está sendo considerado histórico, teve uma dimensão muito maior do que aquela que o próprio Obama procurou transmitir, ao dizer que falava não como candidato a presidente dos Estados Unidos, mas como "cidadão do mundo".

Exatamente por explicitar de maneira tão clara e natural esse "sentimento do mundo", o sentimento de que "diversos muros" ainda têm que ser derrubados para acabar com as diferenças de raça e religião, e de aproveitar a presença simbólica em Berlim para falar da necessidade de união aos aliados da Segunda Guerra, é que seu discurso ganhou força própria, a força de um momento histórico.

Obama é o candidato preferido em cinco países europeus contra o republicano John McCain, segundo uma pesquisa publicada recentemente em Londres, com 52% da preferência entre os pesquisados pelo instituto Yougov no Reino Unido, França, Alemanha, Itália e Rússia. Na Alemanha, então, a preferência é avassaladora: 74% declararam que, se pudessem, votariam nele. Na eleição anterior, o resultado foi o mesmo: o democrata John Kerry dava uma surra em George Bush não apenas na Europa, mas também no resto do mundo.

Mas, como a eleição é nos Estados Unidos, é bom olhar para resultados mais ligados aos assuntos internos. O "Washington Post.com" e o "Wall Street Journal" revelaram ontem uma pesquisa que mostra que em alguns estados-chave, como Colorado, Michigan e Minnesota, McCain e Obama estariam "estatisticamente empatados", o que representa uma recuperação do candidato republicano.

A economia continuaria sendo o tema crucial para os eleitores americanos, com a Guerra do Iraque aparecendo em um segundo lugar distante nas preocupações. Mesmo assim, atribui-se à percepção de que McCain tem mais experiência do que Obama nas questões internacionais a melhora de posição do senador republicano.

Os eleitores parecem mais tendentes a aceitar a estratégia cautelosa de McCain, de manter as tropas no Iraque até que a situação se estabilize, do que a apoiar o plano de McCain de retirada das tropas em 16 meses, mesmo que considerem que ter entrado na guerra foi um erro.

Ontem, enquanto Obama era ovacionado por uma multidão nas ruas de Berlim, McCain, além de ironizar o adversário comparecendo a um restaurante de origem alemã, disse que Obama não tem noção do que significaria uma saída das tropas americanas do Iraque "e por isso trata essa questão como se fosse uma questão puramente política".

Confrontado com outra pesquisa, que mostra que a maioria dos eleitores ainda o considera a escolha "mais arriscada", Obama mostrou-se compreensivo, chamando a atenção para o fato de que ele é relativamente novo no cenário político nacional, enquanto McCain o freqüenta "há 25 a 30 anos".

Enfatizando essa diferença de tempo, Obama estava também tocando em outro tema sensível na campanha deste ano, a idade do seu adversário, que fará 72 anos na época da convenção republicana que deve indicá-lo candidato a presidente.

Outra novidade ontem foi a pesquisa do Pew Institute mostrando um crescimento do apoio a Obama entre os latinos, que representam cerca de dez milhões de eleitores. A margem de apoio, que sempre foi de cerca de 60%, aumentou para 66%, o que, juntamente com as outras mudanças comentadas anteriormente, fez a CNN alterar seu mapa eleitoral.

Para vencer as eleições, um candidato tem que ter 270 delegados no Colégio Eleitoral, e a vitória no voto em cada estado lhe dá a totalidade de delegados daquele estado. Na contagem atual, Obama conta com 221 contra 189 de McCain, enquanto 128 ainda são considerados indefinidos.

O sucesso da viagem internacional de Obama, que se transformou no assunto principal da mídia nos últimos dias, será testado nas próximas pesquisas eleitorais. Existe a possibilidade de os indecisos se convencerem de que estão diante de um novo líder, mas há o perigo para Obama de que a dose exagerada de exposição e um sentimento de "patriotismo reverso" que está sendo explorado por McCain prejudiquem sua votação internamente.

Em vez de se orgulharem de ter um possível futuro presidente amado pelos países aliados, um sentimento contrário poderia nascer dessa "adoração estrangeira".

McCain considerou o discurso em Berlim como uma "comemoração antecipada" de uma hipotética vitória de Barack Obama e tratou de falar aos eleitores menos "cosmopolitas" que, na definição de Samuel Huntington, representam a verdadeira essência do americano médio.

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