O Globo |
1/7/2008 |
Se juntarmos as declarações do influente e normalmente discreto chefe de gabinete do Palácio do Planalto, Gilberto Carvalho, em entrevista à "Veja", com as informações que pesquisas de opinião nos trouxeram nos últimos dias, temos um bom quadro para fazer prospecções sobre o futuro político. Como revela Carvalho, o presidente Lula sabe que 90% de sua popularidade estão ligadas à melhora da economia, e apenas 10% ao seu propalado carisma. Tanto que, na crise política de 2005 desencadeada pelo mensalão, o que abalava o presidente era saber que a situação econômica não estava melhorando: a inflação de 5,69%, embora em queda, continuava alta, e o PIB crescera apenas 2,3% naquele ano, ficando à frente apenas do Haiti na região. Quando, naquele momento delicado, se analisava a hipótese de que o presidente Lula não concorresse à reeleição, os petistas menos realistas que o rei acusavam a "mídia golpista" de trabalhar contra o governo. Gilberto Carvalho revela na entrevista que a hipótese foi longamente cogitada pela cúpula do governo, que considerava inclusive que o impeachment de Lula poderia acontecer. Os então ministros Antonio Palocci e Márcio Thomaz Bastos chegaram certa noite a sugerir ao presidente Lula que fizesse um acordo com a oposição: em troca de poder cumprir todo o seu mandato, abrirá mão da reeleição. Esse desfecho só não se deu porque, de um lado, Lula em nenhum momento perdeu o controle da situação, segundo o relato de Gilberto Carvalho - embora na ocasião houvesse informações de que o presidente tinha fases de bastante depressão -, mas também porque a oposição temeu uma reação dos chamados "movimentos sociais". Difundiu-se a imagem, feita pelo ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, de que havia o perigo de se criar um "Getulio vivo" com a deposição de Lula, e seria melhor deixá-lo "sangrando" até o fim do governo. Não se sabe se a avaliação de que a deposição de Lula provocaria uma revolta popular estava correta, mas, pelo relato de Gilberto Carvalho, essa hipótese não era levada muito a sério pela cúpula do governo. Por outro lado, sabe-se que Lula, em vez de "sangrar em praça pública", recuperou o fôlego, a inflação caiu bastante, para 3,14% em 2006, e a economia melhorou um pouco, com o PIB crescendo 2,9% naquele ano de eleição, permitindo que Lula acenasse com anos melhores, que se concretizaram em 2007, com o PIB crescendo 5,4%. Mas a inflação dava sinais de que não estava controlada, ficando em 4,5%, índice que, embora estivesse dentro das previsões do governo, era maior que o do ano anterior. Dois anos depois da reeleição, a inflação prevista para 2008 é mais do que o dobro da daquele ano, ficando próxima do teto da meta, de 6,5%, podendo mesmo ultrapassá-lo. Não é, portanto, uma tendência de alta devido apenas a um fenômeno internacional, mas um processo inflacionário em progressão que, como revela a pesquisa CNI/Ibope divulgada ontem, se ainda não atingiu a popularidade do presidente, que continua em níveis muito altos, está começando a afetar o grau de confiança dos brasileiros no futuro. A popularidade do presidente e a confiança no governo estão sustentadas pelo índice de satisfação atual, mas as expectativas futuras da população, que ainda são otimistas, estão dando indicações de que estão sendo afetadas por um receio que indica possíveis quedas de popularidade à frente. O Ibope identificou os setores da população em que já se refletem em redução da aprovação os efeitos da inflação: nas regiões Norte e Centro-Oeste, entre os mais jovens, na faixa entre 30 e 39 anos, nas capitais, entre as mulheres e na faixa de renda até um salário mínimo. A análise por estratos mostra ainda queda mais significativa da avaliação do governo nos municípios com mais de 20 mil habitantes e, na região agregada Norte/Centro-Oeste, a avaliação se aproxima da opinião dos habitantes das regiões Sul e Sudeste, enquanto no Nordeste a avaliação do governo é expressivamente superior. Os brasileiros de modo geral revelam preocupação com a evolução da economia a curto prazo, nos próximos seis meses: 65% acreditam hoje que a inflação vai aumentar, enquanto há três meses eram 51%. O Ibope revela, enfim, "uma sensível piora na avaliação do governo nos itens que compõem a agenda econômica". Entre os assuntos mais lembrados espontaneamente ligados ao governo, aparecem a tentativa de criação de um novo imposto do cheque, o aumento de preços e a elevação dos juros. Os brasileiros também passaram a ter uma visão "menos positiva" em relação à renda pessoal, segundo o Ibope. Há três meses, 42% tinham expectativa de que sua renda aumentaria nos próximos seis meses. Hoje, esse total é de 37%, e desses, apenas 6% acham que a renda "aumentará muito". No plano político, há algumas indicações positivas para o plano do presidente Lula de fazer a ministra Dilma Rousseff, chefe do Gabinete Civil, como candidata oficial do PT à sua sucessão. Os casos que a envolveram em polêmicas nos últimos meses, como o dossiê com gastos do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso e Dona Ruth, e sua interferência na venda da Varig para um grupo assessorado pelo compadre de Lula, o advogado Roberto Teixeira, não chamaram a atenção dos pesquisados pelo Ibope. Em outra pesquisa divulgada no fim de semana, da Vox Populi, a ministra Dilma Rousseff já surge com cerca de 8% da preferência como candidata à Presidência, junto com a ex-prefeita Marta Suplicy. Embora seja pouco diante do patamar que já atingiu o governador de São Paulo, José Serra, ou o deputado Ciro Gomes, na casa dos 30% e 20% respectivamente, é uma boa posição para quem nunca disputou uma eleição na vida. A questão é saber se o presidente Lula continuará com essa popularidade até a campanha de 2010 e se, em caso positivo, se conseguirá transferi-la para seu candidato. |
Entrevista:O Estado inteligente
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