Entrevista:O Estado inteligente

segunda-feira, fevereiro 04, 2008

RUY CASTRO Legados de amor e beleza

RIO DE JANEIRO - Sambista, quando morre, vira samba, disse Chico Buarque. Mas, e quando morre um carnavalesco no Carnaval ou às vésperas? Ary Barroso morreu no domingo de Carnaval de 1964. Em 1930, sua marchinha "Dá Nela", cantada por Francisco Alves, ajudara a fixar o gênero. E seu samba "Camisa Amarela", de 1939, já nasceu como a crônica mais que perfeita do tríduo. A morte de Ary foi anunciada no instante em que o Império Serrano ia adentrar a Presidente Vargas com "Aquarela Brasileira", de Silas de Oliveira.
Nove dias depois de Ary, morreu Vicente Paiva. O nome de Vicente talvez já não diga muito para os infiéis, mas o Brasil o conhece por uma marcha de 1935 (com Nelson Barbosa) cantada todo ano, até hoje, por milhares nas ruas do Rio: "Quem não chora não mama/ Segura, meu bem, a chupeta/ Lugar quente é na cama/ Ou então no Bola Preta". E o território de seu outro sucesso, de 1937 (este, com Jararaca), cobre simplesmente o mundo: "Mamãe, Eu Quero".
Benedito Lacerda também morreu no Carnaval, o de 1958. Entre tanta coisa que deixou, foi o autor (com Humberto Porto) da "Jardineira", em 1939. E Paulo da Portela, a quem as escolas devem a pose e o garbo, morreu no domingo anterior ao Carnaval de 1949. Uma multidão o levou ao cemitério de Irajá e, no bicho daquele dia, deu a centena do seu túmulo: 2.908.
Mas nada supera em simbolismo a morte de Pixinguinha: em 1973, de repente, numa igreja em Ipanema, enquanto a poucos metros, sob chuva forte, saía a própria Banda de Ipanema. Na rua, alguém levou a notícia a Albino Pinheiro. A Banda cantou "Carinhoso" e chorou Pixinguinha de corpo presente.
O acaso ajudou, mas todo o confete e o amor do mundo não pagam o que esses homens nos legaram em alegria e beleza.

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