Entrevista:O Estado inteligente

terça-feira, fevereiro 19, 2008

O ‘DINHEIRISTA’ por Adriana Vandoni

No começo do escândalo do mensalão, quando aquelas denúncias de compra de parlamentares começaram a vir à tona, abismava-me ao ver a que ponto havia chegado o parlamento brasileiro. As declarações recentes do deputado José Eduardo Cardozo, secretário-geral do PT, são claras e inequívocas: "não tenho dúvida de que houve situações de ilegalidade com a destinação de recursos financeiros de forma indevida a aliados políticos". O que se passava na cabeça daqueles homens que usavam aquela casa como se fosse um prostíbulo, só que no lugar de seus corpos vendiam suas idéias? Porque tanta ganância? Haveria prazer naqueles atos? Tal qual as meretrizes, talvez o negócio fosse dinheiro, apenas isso.

É certo que nos subterrâneos, nos rendez-vous de toda sociedade, convivem de gigolôs e aprendizes a prostitutas. O que difere uma casa de tolerância do parlamento brasileiro, é que as "moças" da casa de tolerância não hipotecaram seus corpos como representante de um povo, elas vendem uma mercadoria que lhes pertence, enquanto que o ocupante do parlamento vende sua opinião depois de ter sido hipotecada a serviço do povo, ou seja, vende uma mercadoria que não é só dele, que não lhe pertence.

Comecei então a procurar pessoas de bem parlamento brasileiro. Mirava em um e acompanhava o seu desempenho, suas posturas e opiniões. Alguns pareciam se indignar com aquilo tudo, mas a maioria não tem opinião formada de nada, apenas uma conveniência da hora. Um exemplo que me chocou foi do então parlamentar Eduardo Paes, na época do PSDB, opositor e ferrenho orador contra os aqueles atos ilícitos cometidos na república do PT, tornou-se secretário de esportes do Rio de Janeiro e passou a elogiar o governo que tanto combatia antes. Seu exemplo deixou claro que o certo hoje é o errado amanhã, o errado hoje é a certeza da correção de amanhã. Não se está lá para defender os princípios ou ideais, sejam os da situação ou da oposição. Assuntos de relevância pública só são considerados quando o clamor popular os obriga a fazer algo. Se esse clamor cessa, instala-se a pasmaceira, e o trabalho volta a ser a procura pela liberação de suas emendas e de verbas para "as suas bases". São eles, em sua maioria, os "dinheiristas", termo que ouvi certa vez de um interlocutor revoltado com alguns desdobramentos políticos.

Sentados à mesa de um restaurante, batendo com a mão, forte a ponto de chacoalhar copos e garrafas, chamando a atenção das mesas vizinhas, dizia-me: "fulano é 'dinheirista', não é oposição nem situação, é 'dinheirista'!, essa turma só pensa em dinheiro e não tem compromisso com ideais." 

Ouvia atenta e com a admiração que nutro pelas pessoas que são capazes de defender suas posições. Ouvia com o respeito que tenho pelos coerentes, seja qual for sua inclinação ideológica. A discordância de idéias é parte da democracia, e almejar ideais de consenso é acreditar em um regime opressor e totalitário. Compreendo e louvo a mudança de opinião, quando isso representa amadurecimento intelectual. Mas alguns ideais são básicos e independem da linha ideológica. 

E assim aquela palavra "dinheirista" ficou na minha cabeça. Acreditei piamente nesse meu interlocutor. A veemência com que defendia seus argumentos e com que atacava os tais "dinheiristas" era coerente com o que penso, e imaginava que isso também ocorresse com ele.

O tempo passou e me reservou uma surpresa. Aliás, esse é o lado bom do tempo. Ele cura feridas, dissolve nós, amadurece e principalmente, mostra a verdadeira face de uma pessoa. Pois o tempo me fez compreender que aquele ferrenho interlocutor nada mais era que um dos "dinheirista". O tempo me explicou que aquele bater na mesa, aquele espumar de raiva ao defender um ideal coletivo não passava de uma crise de rebeldia adolescente de um filho bastardo do "dinheirismo".

Essa compreensão que o tempo me trouxe, foi de grande representatividade para a minha percepção da política brasileira. Este é um fato que deve ser corriqueiro a muitos e muitos brasileiros que como eu, ainda insistem em acreditar.

Bem-aventurado seja o dia em que os guardiões da ética e da população mais humilde não sejam aqueles para os quais a corrupção significa um bom negócio, mas descrito assim porque ele não fez parte.

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