Entrevista:O Estado inteligente

sexta-feira, fevereiro 15, 2008

Alvo de CPI deveria ser outro - Barbara Gancia



Artigo
Folha de S. Paulo
15/2/2008

A grita da oposição não passa de demagogice destinada a desgastar a imagem do governo em ano eleitoral

O NOBRE LEITOR poderá contar nos dedos da mão (esquerda, se preferir) as vezes em que defendi o governo nesta coluna.
Pois é, não concordo com quase nada do ideário da "esquerda" (entre aspas) instalada aí e sou da turma que acha que o mensalão existiu, sim, senhor, e que, sendo assim, a cúpula do governo não tinha como não saber o que estava acontecendo.
Creio também que os assassinatos de Celso Daniel e do prefeito Toninho de Campinas foram muito bem abafados. E julgo criminoso o inchaço da máquina estatal promovido pelo governo Lula.
Dito isto, gostaria de voltar o meu porrete à oposição, no que tange o novo "escândalo" (de novo, as aspas) em torno dos cartões corporativos usados pelo governo. Marcelo Coelho disse quase tudo o que precisava ser dito sobre a questão em sua coluna de ontem na Ilustrada.
A grita de parlamentares do PSDB, do DEM e afins contra o uso dos cartões não passa de show pirotécnico. Trata-se de demagogice destinada exclusivamente a desgastar o governo em ano eleitoral. E a CPI que advirá dessa histeria só servirá para, mais uma vez, paralisar os trabalhos em andamento.
Existem cartões demais nas mãos de funcionários públicos? A resposta é sim. Se há coisa de 22 mil cartões de crédito circulando, deveriam ser, no máximo, 2.000. Com Lula, as despesas da Presidência aumentaram? É evidente que sim, o presidente e sua família deitaram e rolaram e continuam a aumentar seus gastos. O controle do uso dos cartões é precário? Mais uma vez, ninguém duvida de que isso seja uma verdade tão inegável quanto o fato de a ministra Matilde ter recebido um chute no traseiro por motivo mais que justo.
Mas, vem cá: sair no "Jornal Nacional", como grande notícia do dia, que a Marinha gastou cem merréis em bombons na Kopenhagen ou que torrou dinheiro público em flores é uma aberração. Por acaso, nas visitas dos dignatários que recebe, a Marinha deveria deixar de seguir o protocolo? E como é que os seguranças de Lula vão se manter em forma se não tiverem aparelhos de ginástica para se exercitar? Segundo os guardiões da moralidade, o reitor da Universidade de Brasília, Timothy Mulholland (parece nome de presidente da Irlanda), deveria morar aonde, numa kitchenette?
O dileto leitor, por acaso, acha que os salários do presidente, de governadores e prefeitos sejam suficientes? Note que eu não estou falando de congressistas ou de certos juízes. Mas, se contasse apenas com o que ganha, Lula conseguiria nos representar dignamente? A não ser que a gente queira vê-lo andar por aí de camisa pólo puída e sapatos curtidos, feito o Evo da Bolívia, vamos ter de continuar a aceitar que se gaste a mais até com a primeira-filha, Lurian, que não vive em Brasília.
Mas o ponto crucial da história é um só: a oposição esperneia com os R$ 150 milhões, R$ 170 milhões ou quiçá R$ 200 milhões gastos pela Presidência, mas ninguém nunca diz um "ai" sobre as obras públicas. Perto do que vai para campanhas e bolsos dos que encomendam as obras, a gastança dos cartões é dinheiro de pinga.
Despesas de governo devem ser escrutinadas continuamente e é justo que exista pressão para que isso aconteça. Mas, para moralizar de vez a administração pública, deveríamos começar por investigar a fundo as concorrências públicas.

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