Artigo - Jarbas Vasconcelos |
O Globo |
4/7/2008 |
As recentes denúncias de tráfico de influência na venda da Varig e da VarigLog expuseram, outra vez, a face mais atrasada do governo do PT. Essas sérias acusações trazem o DNA do escândalo do mensalão, quando, há exatos três anos, o país descobriu que o governo comprava votos de parlamentares distribuindo recursos públicos. Naquela ocasião, ficou evidente que o PT utilizou empresas públicas para atingir seus objetivos, arrastando para a lama estatais como Furnas, Banco do Brasil, Eletronuclear, Petrobras, Instituto de Resseguros do Brasil (IRB) e a Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos. Todas, de uma forma ou de outra, utilizadas como fontes de financiamento espúrio da base governista. Já eram públicas e notórias as divergências do governo do PT para com o papel independente das agências reguladoras, criadas na gestão do presidente Fernando Henrique. Essas agências foram formadas para fiscalizar e regulamentar setores da economia que foram abertos ao setor privado, como telecomunicações, energia e petróleo. Ao assegurar regras estáveis para esses setores, as agências reguladoras não beneficiam apenas os investidores, como afirmavam os petistas. É um modelo que funciona bem em outros países, onde as regras de regulação são seguidas por todas as partes envolvidas - a começar do próprio governo - com o objetivo de proteger principalmente os consumidores. A verdade é uma só: o governo do PT incorporou a defesa do livre mercado, mas se prende a algumas teses ultrapassadas quando as regras vão contra seus interesses. O ataque petista começou ideológico, criticando o "neoliberalismo" das agências. Com o tempo, ficou patente que as razões eram bem menos nobres do que os princípios socialistas do passado petista. As agências reguladoras foram criadas para que a ligação entre o governo e esses setores econômicos não fosse de compadrio, de submissão. Mas de isenção, independência e imparcialidade. São órgãos de Estado e não deste ou daquele governo em particular. As agências reguladoras não eram de Fernando Henrique e não deveriam ser de Luiz Inácio Lula da Silva. No entanto, o recente escândalo em torno da Varig revela o aparelhamento, o uso e abuso da coisa pública em benefício deste ou daquele grupo, deste ou daquele interesse menor. Problemas desse tipo se tornaram, infelizmente, uma marca do PT. A raiz de todos os escândalos envolvendo o governo Lula decorre exatamente dessa imensa dificuldade que o PT tem em separar o público do privado. O problema é que os petistas acreditam ser os escolhidos, aqueles que levarão o Brasil à redenção. Esse discurso messiânico não combina com o caminho que desejamos para o nosso país. O cerco do governo às agências reguladoras começou antes mesmo da primeira posse do presidente Lula, em janeiro de 2003. Durante o período de transição, todo dia saía algum "recado" na imprensa, dando conta de que o novo governo pretendia mudar o modelo criado pelo governo FHC. Já no poder, o PT adotou uma nova estratégia para asfixiar as agências: não repassar recursos. Em 2005, as seis principais agências do setor de infra-estrutura foram contingenciadas em mais de R$4,4 bilhões dos R$5,2 bilhões previstos, o que representava 84% do total. Esse mesmíssimo problema voltou a ocorrer há poucos dias. A etapa seguinte deste desmonte começou a tomar forma com o término dos mandatos dos dirigentes das agências. A partir daí, o governo tomou conta dessas entidades, aparelhando-as, conduzindo-as ao bel-prazer dos interesses econômicos e políticos do PT e de sua base de apoio no Congresso. Para comandar as agências foram escolhidas pessoas, muitas vezes, sem condições técnicas. Contanto que estivessem sintonizadas com o PT e seus satélites. Essa interferência não poderia dar em outra coisa, que não má gestão e escândalos. O setor aéreo, por exemplo, foi vítima dos dois problemas. As agências reguladoras precisam de autonomia política, financeira e de gestão para cumprir as suas missões. Ao esvaziá-las, o governo compromete o papel dessas entidades - e prejudica não apenas os investidores, mas também os consumidores. Ou será que o governo acredita piamente que os seus interesses são os mesmos interesses da maioria dos brasileiros? Como afirmou, apropriadamente, a jornalista Míriam Leitão: as agências reguladoras devem "defender o mercado da ingerência indevida do governo; defender a sociedade das distorções criadas pelo mercado e defender as empresas participantes do abuso de poder de mercado de empresas dominantes". Isto só é possível se o governo não aparelhar as entidades e não submetê-las aos interesses deste ou daquele grupo. A relação institucional do governo federal com os demais poderes seria muito mais produtiva se houvesse o mínimo de respeito. O problema é que a arrogância do governo não tolera a independência de ninguém. O governo quer submissão voluntária de todos. O próprio presidente da República, nos palanques do PAC por este país afora, já atacou o Senado Federal, o Tribunal de Contas da União, o Tribunal Superior Eleitoral. É um péssimo exemplo. Quem não aprende com os erros do passado corre o sério risco de repeti-los. O governo, pelo seu comportamento, dá demonstrações de que não leva esta máxima em consideração. Ao Congresso Nacional cabe o papel de fiscalizar a fundo este problema. Não apenas o recente escândalo envolvendo a Agência Nacional de Aviação Civil, a Anac, no caso da Varig. Problemas já ocorreram na Agência Nacional do Petróleo (ANP), com o seu presidente colocando os pés pelas mãos, ao antecipar a descoberta de novas reservas de petróleo. Já a Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) se prepara para homologar uma das maiores fusões do mercado brasileiro do setor de telefonia. Talvez seja a hora de o Senado Federal prestar mais atenção ao que ocorre nas diversas agências reguladoras, de forma a defendê-las do aparelhamento político e da vocação autoritária do governo federal. |
Entrevista:O Estado inteligente
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O cerco às agências reguladoras
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