Entrevista:O Estado inteligente

sexta-feira, abril 06, 2007

CLÓVIS ROSSI O leão talvez não seja manso

SÃO PAULO - Como Fidel e Chávez têm a mania do exagero, da retórica ribombante (e do anti-americanismo galopante), ninguém parece ter levado muito a sério as advertências de ambos sobre o risco de o mundo ser levado à fome pela expansão do biocombustível, na medida em que cultivos alimentícios seriam substituídos por culturas que gerem combustível alternativo.
Confesso que eu levei a sério, descontado o monumental exagero de ambos. Levei a sério porque, antes, José Sergio Gabrielli, o presidente da Petrobras, técnico competente e sereno, me dera uma aula grátis sobre biocombustíveis quando cruzamos em Davos, em janeiro. Parte da aula era o reconhecimento de que pode, sim, haver avanço de cultivos para combustíveis alternativos sobre a área plantada para alimentos.
Claro que Gabrielli nem chegava perto de falar em fome de milhões ou nem sequer de milhares.
Agora, além de Fidel e Chávez, dois especialistas da Universidade de Minnesota reproduzem os dois governantes, ao preverem que a alta demanda por etanol vai elevar os preços dos alimentos e pode criar 600 milhões de "cronicamente famintos" até 2025.
A tese sai em breve na revista "Foreign Affairs", que não é exatamente socialista ou apocalíptica.
Continuo achando um exagero, mas o sereno e didático artigo de Luiz Gonzaga Bertelli (Fiesp) na Folha de ontem, que nega o risco de a cana atropelar os alimentos, informa, não obstante, que a área plantada com cana se multiplicou por cinco em 50 anos e será dez vezes maior nos próximos 10 anos.
O risco é de o boom do etanol estimular não apenas o "espírito animal" do empreendedor, que é da lógica do capitalismo, mas o espírito predatório, que é da lógica do capitalismo brasileiro. Aí, pode haver, sim, alguma aproximação, mesmo que remota, com o apocalipse previsto por Fidel, Chávez e pela "Foreign Affairs".


crossi@uol.com.br

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