Entrevista:O Estado inteligente

domingo, abril 29, 2007

CELIO BORJA Surto de intolerância

Os educadores sabem como é importante assegurar às crianças o direito de serem crianças; e esforçam-se por livrá-las do sexo precoce, da violência e da habitualidade de comportamentos autodestrutivos e socialmente danosos. O advento da transmissão de imagens que arrasta os sentidos, diferentemente da comunicação impressa e escrita que se dirige à razão, tornou ainda mais difícil a obra educativa, que nunca foi fácil. Por isso, a Constituição assegura à criança e ao adolescente o direito “à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão” (art. 227). E, cuidando da comunicação social, compromete o Estado na instituição de meios legais de se defenderem, a pessoa e a família, de programas ou programações de rádio e televisão que desrespeitem desrespeitem os valores éticos e sociais da pessoa e da família (arts. 220, II e 221, IV).

Os titulares do direito de defesa são, pois, as pessoas e as famílias, da mesma maneira que o ofendido pode exigir a cessação e reparação dos abusos sofridos por meio da imprensa escrita. Mas isto não dá ao Estado o poder ou a prerrogativa de censurar o veículo impresso ou o pensamento de quem escreve.

O ofensor é responsabilizado, na forma do devido processo legal.

O que o legislador está, portanto, autorizado a fazer é instituir os meios de responsabilização dos veículos de imagens pelo desrespeito aos valores éticos e sociais da pessoa e da família, permitindo que uma e outra possam pleitear ao Judiciário a cessação do abuso e, eventualmente, a reparação material ou imaterial do dano. Esses meios de defesa devem ser eficientes e prontos, e assegurar a obediência aos princípios da boa justiça.

Mas, com fundamento nas disposições referidas, não é lícito submeter ao controle estatal o pensamento, a ciência, a arte e quaisquer manifestações do espírito ou ditar-lhes regras jurídicas ou técnicas de elaboração, produção, expressão e veiculação, uma vez que elas são constitucionalmente livres (art. 220, caput). Mas os seus agentes podem e devem ser responsabilizados pelo abuso dessa franquia.

Com esse criterioso arranjo, o Constituinte de 1988 teve por escopo evitar que o indeclinável dever de proteger a infância e a juventude fosse usado como fundamento ou pretexto do controle político dos meios de comunicação. Lembrar esses princípios da Constituição é, hoje, imperioso, à vista do alarmante surto de intolerância, de prepotência e de opressão que grassa na América do Sul, com a partidarização das concessões de televisão e rádio, e a ocupação, pelo poder político, travestido de empresário de cultura e entretenimento, do espaço público de expressão de idéias, suprimento de informação e produção cultural. Na sociedade aberta que a democracia é, esse espaço é patrimônio comum de todos e não deve ser dominado por partidos, governos ou grupos.

Agentes do Estado podem e devem ser responsabilizados pela repressão à liberdade de expressão

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