Entrevista:O Estado inteligente

sábado, abril 28, 2007

França Diminui o fosso entre esquerda e direita

A era do consenso

Apesar da polarização entre esquerda e direita na eleição
francesa, os dois campos nunca estiveram tão próximos


Jerônimo Teixeira

Michel Euler/AP
Ségolène Royal: proposta de semana de 35 horas que agrada ao eleitor de esquerda


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Blog de Antonio Ribeiro, de Paris

Os dois candidatos que disputam o segundo turno das eleições presidenciais na França, no domingo, dia 6, estão encenando mais uma vez o clássico embate entre esquerda e direita. A socialista Ségolène Royal e Nicolas Sarkozy, do partido de centro-direita UMP, têm posições distintas sobre geração de emprego e leis trabalhistas, entre outros problemas-chave para um país que amarga baixos índices de crescimento e uma dívida pública de 1,2 trilhão de euros. Diante de uma eleição aparentemente tão polarizada, fica difícil notar as semelhanças evidentes entre os dois campos em disputa. O fato, porém, é que o terreno consensual entre os dois lados opostos do espectro político cresceu muito desde que o comunismo europeu ruiu, na virada da década de 90. Nascida na Assembléia dos Estados-Gerais, nos primórdios da Revolução Francesa, a dicotomia esquerda/direita foi uma das muitas contribuições da França republicana ao moderno vocabulário político. A divisão continua em cena, na França como no resto do mundo, mas já não há mais um abismo intransponível entre os dois lados. Nas democracias contemporâneas, todos reconhecem alguns marcos institucionais inescapáveis, como a economia de mercado e as liberdades civis. Na margem limitada em que o estado opera, desejam-se eficiência, transparência e responsabilidade no equilíbrio orçamentário, marcos do que se convencionou chamar de boa governança.

O desaparecimento do comunismo – que, em sua forma ortodoxa, hoje só vigora em grotões como Cuba e Coréia do Norte – foi fundamental para a consolidação dos novos consensos. Documento fundamental do movimento, o Manifesto Comunista, publicado por Marx e Engels em 1848, admitia e até exaltava a imensa capacidade criativa da burguesia, mas também decretava que essa classe inovadora encontraria seu fim com a revolução proletária internacional. No esquema do marxismo, operários e capitalistas são grupos antagônicos, e não há lugar para conciliação. Ao longo do século XX, porém, apareceram algumas soluções de compromisso entre o liberalismo estrito e a intervenção estatal (todas elas, saliente-se, à margem do totalitarismo da União Soviética). O New Deal – conjunto de programas governamentais para socorrer os Estados Unidos durante a recessão dos anos 30 – é um bom exemplo. Alguns opositores chegaram a acusar o governo de Franklin Roosevelt de estar instalando o socialismo nos Estados Unidos. Exagero evidente: a economia de mercado nunca foi posta em questão. As social-democracias da Europa do pós-guerra aprofundaram a intersecção entre esquerda e direita, construindo um novo modelo de estado de bem-estar social.

Christophe Ena/AP
Nicolas Sarkozy: propostas de mudança em um país atolado na dívida pública

Por mais que a clivagem entre esquerda e direita tenha se mostrado relativa, ela ainda tem um certo poder de orientação para o eleitor. Uma pesquisa de opinião da Fundação Jean Jaurès e da revista Le Nouvel Observateur concluída no fim de março, pouco antes do primeiro turno das eleições francesas, traz dados interessantes nesse sentido. Revela que 41% dos franceses ainda consideram a distinção entre direita e esquerda relevante, contra 53% que a julgam ultrapassada. Em relação a uma pesquisa semelhante realizada há cinco anos, cresceu o número dos que acreditam na divisão – em 2002, somente 30% lhe davam crédito. O aumento é provavelmente resultado da recente polarização entre Sarkozy e Ségolène. Os eleitores seguem alguns parâmetros gerais de acordo com sua orientação política. Propostas de limitação de impostos, por exemplo, contam com a aprovação de 76% dos que se declaram de direita, contra 53% da esquerda. A maioria dos esquerdistas (55%) quer a generalização da semana de 35 horas (uma temerária promessa eleitoral de Ségolène), ao passo que só 25% dos franceses de direita aprovam essa medida. A revelação mais importante da pesquisa, porém, vai além das diferenças ideológicas: os franceses começam a perceber que a esclerosada estrutura estatal de seu país precisa de mudanças urgentes. Metade dos eleitores deseja uma reforma profunda da sociedade – há dois anos, só 40% pensavam assim. O próximo presidente, da esquerda ou da direita, terá de encontrar o rumo da boa governança.

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