O GLOBO
Os juros caíram como todos esperavam, mas a queda acabou ficando no valor mais baixo das previsões: 0,5 ponto percentual. O efeito combinado de juros altos e crise política começa a aparecer nas previsões da economia real. As análises de crescimento do ano estão indo para números abaixo de 3%. A MCM faz essa previsão. A Tendências também. O CSFB divulgou ontem a revisão para baixo de sua previsão: espera apenas 2,5% de crescimento.
O relatório do CSFB diz que o crescimento do PIB não passará de 2,5%. Resultado pífio para um ano que começou com pinta de que ficaria acima de 4%. Na semana passada, o economista José Júlio Senna, da MCM, disse que apostava num número abaixo de 3% porque o PIB do terceiro trimestre será negativo. A previsão do CSFB é de que caia 0,5% em comparação com o segundo trimestre e registre alta de apenas 1,6% em relação ao mesmo trimestre de 2004. A Tendências faz uma aposta semelhante: 0,4% de queda em relação ao trimestre anterior e 2,8% de crescimento ao fim de 2005.
O IBGE vai divulgar o dado do terceiro trimestre no dia 30 de novembro, mas as previsões estão sendo ajustadas para baixo por causa dos números de produção industrial dos últimos meses. A idéia generalizada é que o PIB do terceiro tri será negativo porque os dados de produção industrial foram bem abaixo do que se previa. A queda da produção chegou a 2% no último dado divulgado, de setembro em relação a agosto. No seu boletim, a Tendências comenta, diante da queda de 3,2% na produção industrial do último trimestre, que "o elevado ritmo de crescimento do segundo trimestre já prenunciava uma desaceleração no trimestre posterior". O que os surpreendeu foi a magnitude da queda.
O número acabou surpreendendo também o Ipea que, em setembro, reviu de 2,8% para 3,5% sua previsão para o PIB.
— Foi um engano — diz Paulo Levy, diretor de estudos macroeconômicos do Ipea.
O Ipea não refez ainda sua previsão, mas Levy acredita num terceiro trimestre sem crescimento, fechando o ano em torno de 3%:
— Vamos começar a trabalhar depois da divulgação do IBGE, mas menos para 2005, que já está dado, e mais de olho em 2006.
Números ruins do PIB vão legitimar as queixas em relação à política econômica e ao Banco Central. A queda da taxa de apenas 0,5 ponto percentual, quando se achava que a redução dos juros poderia ser acelerada, ajudará a alimentar o inconformismo. A queda da taxa ontem não resolve o problema. Primeiro, porque os juros permanecem altos demais e, segundo, porque alguns dos efeitos não podem ser mudados, como o fato de que o PIB vai crescer bem menos que a média mundial e a dívida/PIB parou de cair este ano, apesar do superávit primário.
O drama é que o BC está certo em tese. Diante da alta da inflação, um Banco Central tem que apertar a política monetária para evitar que se desvie da meta. O problema foi a dose e o ponto de partida. Os juros já eram altos quando voltaram a subir. A política monetária do governo Lula tem tido que pagar o preço da desconfiança às convicções do próprio governo.
Durante todo o período do ministro Antonio Palocci no governo, os ruídos em torno do caminho escolhido têm sido enormes. Inicialmente se passava a impressão de que aquele caminho era só para evitar o pior no primeiro ano, depois seria adotada uma nova política. Mas o que seria essa nova política, o que seria a alternativa oferecida pelos opositores do ministro Palocci dentro do governo nunca se soube. Essa incerteza foi adiando a normalidade do país. Agora, num momento em que os juros poderiam cair mais fortemente, o ruído das divergências em relação à política econômica ficou ensurdecedor.
Há certos empresários e economistas que consideram que os juros estão sempre altos, em qualquer nível em que estejam. Por outro lado, os críticos do Banco Central têm razão de falar o que têm falado agora. O argumento do BC tem uma contradição insanável: o país tem uma coleção de bons indicadores e de melhoras substanciais conseguidas nos últimos anos, mas continua tendo uma taxa de juros de país em grave crise.
Por outro lado, no Brasil o crédito livre é pequeno demais. Teoricamente, quando os juros sobem, a demanda reduz e a inflação cai. O problema é que a maior parte dos financiamentos no país é dada com taxas menores do que a Selic. Todos os créditos do BNDES são TJLP, todo crédito rural é com taxas diferenciadas e assim também uma parte do crédito habitacional. Os canais de transmissão da política monetária estão obstruídos. Ou seja, os juros precisam subir muito mais para fazer o mesmo efeito. O Banco Central exagerou na dose, mas tem atenuantes.
Nem só de juros vive o encolhimento do PIB. A crise política que devasta a confiança de empresários e investidores desde junho tem provocado adiamento das decisões de investimento. Isso teve impacto direto. Houve outros problemas como quebras de safra de vários produtos provocados por problemas climáticos. O que reduziu o PIB agrícola.
No último trimestre do ano, o país vai crescer, mas menos do que se previa. O CSFB reduziu de 1% para 0,5% o crescimento do PIB no quarto trimestre de 2005 em relação ao terceiro. Enfim, Papai Noel parece estar no spa neste fim de ano. Vem mais magro.
Entrevista:O Estado inteligente
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