Oposição surfa na crise, mas não diz por que mesmo pretende voltar ao poder O presidente Luiz Inácio da Silva não dispõe, pelo menos por enquanto, de um discurso consistente para convencer o eleitor de que merece um segundo mandato, isto é um fato reconhecido dentro do governo e até por especialistas no ramo cuja convicção na reeleição de Lula era inabalável até antes da eclosão desta última, e pelo visto interminável, crise.
Para sorte dele, porém, não há sinal de vida eleitoralmente inteligente na oposição. Ocupados em surfar na onda da crise - nem sempre se equilibrando com sucesso, diga-se -, os oposicionistas freqüentam as pesquisas de opinião com nomes de destaque, mas ainda não apresentaram um argumento forte nem uma linha de raciocínio impactante o suficiente para justificar sua pretensão de voltar ao poder a partir de janeiro de 2007.
Das dificuldades de Lula para organizar uma campanha e se reeleger muito se fala. Mas o vazio propositivo do governo não é preenchido pela apresentação das credenciais dos adversários, dedicados exclusivamente à tarefa da administração cotidiana da veemência das críticas, seja à conduta ética ou à eficácia administrativa dos eleitos em 2002.
É possível que PFL, PSDB e parte do PMDB, para citar apenas os grandes, considerem a fase propícia apenas à "desconstrução" da imagem de Lula.
Entretanto, se a idéia é se "construir", talvez fosse prudente que levassem em conta também o dia de amanhã e tratassem de esclarecer ao prezado eleitor as razões pelas quais ele deve dar vazão ao arrependimento e à decepção votando diferente.
Caso contrário, o eleitorado poderá começar a nutrir a estranha sensação de que não vale a pena engatar uma marcha à ré na história e retomar o curso interrompido com a eleição do PT.
Principalmente o PSDB parece confiante em excesso no próprio taco. Ao ponto de arriscar-se no perigoso terreno da dubiedade e da incoerência ao martelar a política econômica de sua autoria e fazê-lo sem a firmeza dos autocríticos, pois ora bate, ora assopra na direção do ministro Antonio Palocci.
Não exibe prumo nem tampouco rumo. Quer se mostrar como "oposição responsável", mas não resiste à tentação de cometer lá suas irresponsabilidades bravateiras. Não privilegia a unidade de ação ou de pensamento estratégico e provoca desconforto nos aliados quando adota, em relação ao PFL e aos oposicionistas do PMDB, uma atuação personalista.
Quando conquistaram o poder em 1994 e 1998, os tucanos o fizeram a bordo da idéia-força da estabilidade econômica. Em 2002, Lula nadou nas águas da esperança. Para 2006, nenhum dos dois dá sinais de que tenham encontrado substitutos à altura.
Autocombustão
É possível que o presidente Luiz Inácio da Silva tenha um plano a ser revelado mais adiante. Por enquanto, porém, seu aval tácito ao bombardeio sobre o ministro da Fazenda por parte de governistas não prejudica a oposição.
Antes, ao contrário, rende malefícios à bem arquitetada construção publicitária da campanha de 2002 para preencher as, digamos assim, lacunas de preparo na formação do candidato, dando a impressão de que o presidente seria bem assessorado para governar.
Inclusive Antônio Palocci não é o primeiro - e talvez só seja o último porque não sobrou mais ninguém - auxiliar percebido como eficaz a ser incinerado na fogueira dos problemas políticos do PT.
Corpo fora
A pressão sobre o presidente da Câmara, Aldo Rebelo, para que convoque uma sessão extraordinária hoje de forma a cumprir prazos regimentais e permitir a realização da sessão de votação do processo contra José Dirceu amanhã, é a maneira mais confortável de suas excelências transferirem a ele a responsabilidade sobre a falta de quórum ontem e sexta-feira.
O quórum exigido para a contagem das sessões equivale a 10% do colegiado, cerca de 50 deputados. Só os maiores partidos de oposição, PFL e PSDB, têm mais de 100. Se não conseguem convencer os seus a comparecer ao trabalho fora da semana parlamentar de três dias, deveriam assumir a falha.
Exigir agora que Aldo Rebelo manobre o regimento para resolver o problema é usar das mesmas artimanhas tão ao gosto de Dirceu.
Na muda
Eduardo Paes, Rodrigo Maia e Laura Carneiro, todos deputados de oposição, embarcavam do Rio de Janeiro para Brasília junto com os petistas Lindberg Farias (prefeito de Nova Iguaçu) e o também deputado Luiz Sérgio.
O assunto, "a cassação do Zé", seguia animado, com apostas sobre a decisão do STF amanhã, observações bem-humoradas, considerações de toda sorte. Entre os oposicionistas, bem entendido. Lindberg sorria e Luiz Sérgio, de estrelinha na lapela e tudo, nem isso. Ambos mudos.
Não abriram a boca nem para concordar ou discordar da convicção geral de que o ministro Sepúlveda Pertence optará pelo meio-termo, acompanhando o voto do colega César Peluso, que altera o conteúdo, mas não protela o julgamento do pedido de cassação.