Entrevista:O Estado inteligente

quarta-feira, novembro 23, 2005

MERVAL PEREIRA Situação crítica

O GLOBO



A pesquisa CNT/Sensus divulgada ontem registra um momento delicado para as chances de reeleição do presidente Lula. A menos de um ano das eleições, a aprovação de seu governo caiu para 46,7% e a desaprovação chegou a 44,2%, marcas consideradas tecnicamente críticas. Um candidato com menos de 50% de aprovação, e com mais de 40% de desaprovação, não tem condições de concorrer à reeleição, dizem os especialistas. Assim como é um consenso entre políticos e analistas que um outro presidente que não Lula já poderia ter sido derrubado pelos escândalos — o próprio Lula reconheceu isso recentemente — também os índices técnicos de popularidade podem ser desmentidos pelo carisma de Lula, mas a tendência não é essa até o momento.

O reflexo disso já dá para ser sentido nas simulações de voto: apesar de tudo, Lula mantém-se como vencedor num primeiro turno, mas perde para o prefeito paulistano José Serra num segundo turno, o que já havia sido registrado em outras pesquisas. Uma indicação de que o declínio de sua popularidade começa a se refletir na decisão de voto é o fato de que todos os seus principais adversários estão tendo um crescimento, mesmo no primeiro turno. O governador de São Paulo, Geraldo Alckmin, subiu de 13,1% para 15,8%; o ex-governador do Rio Garotinho manteve-se acima de 15%, chegando a 16%. E o prefeito José Serra subiu de 23,8% para 24,4%.

Essa situação de desgaste da imagem do presidente Lula já estava desenhada anteriormente, mas aparece de maneira dramática na pesquisa CNT/Sensus divulgada ontem. Na pesquisa anterior, Lula havia chegado a um ponto crítico: de uma aprovação, em janeiro de 2003, de espantosos 83,6% logo após a eleição, chegou em setembro a 50%, considerado o mínimo para que um candidato tente a reeleição. Ao mesmo tempo, o índice de rejeição ao presidente, havia chegado a 39,4% em setembro.

O índice dos que consideram o governo do presidente Lula "ótimo ou bom" está em 31,1%, enquanto a soma de "ruim e péssimo" atingiu 29%, isto é, os dois patamares estão em nível de empate técnico, com a tendência ascendente da avaliação pessimista. O fato é que, mesmo criticada por muitos por falta de agressividade, a oposição está conseguindo erodir a imagem do governo Lula.

Nada menos do que 77,5% acham que mais fatos surgirão nos escândalos de corrupção que vêm sendo denunciados, enquanto 72,6% consideram que Lula foi afetado diretamente pelos escândalos. Essa percepção do eleitorado faz com que 64,6% dos entrevistados tenham declarado que levarão em conta as denúncias e os escândalos na hora de decidir seus votos.

Há na pesquisa também uma revelação interessante: 51% dos entrevistados entendem que a vitória do "Não" no referendo do desarmamento foi uma derrota do governo e 56,4% consideram que o resultado foi uma desaprovação da política de segurança pública. Portanto, apesar de algumas análises de que o referendo não representava um sinal de desgaste do governo Lula, a percepção da opinião pública é de que a resposta das urnas foi uma crítica direta ao governo.

As críticas à política econômica continuam majoritárias na pesquisa e talvez isso explique a última crise política, que teve ontem um de seus dias mais críticos. O ministro da Fazenda, Antonio Palocci, chegou à Câmara para depor em uma comissão na qualidade de ministro demissionário e terminou o dia confirmado no cargo pelo próprio presidente Lula, em uma declaração dada ao mesmo tempo em que Palocci, na Câmara, dizia que ficaria no cargo enquanto Lula quisesse, mas para executar a atual política econômica, não outra.

Os próximos dias mostrarão se o presidente Lula está disposto a parar de brincar com a política econômica e vai voltar a apoiá-la incondicionalmente, ou se a ministra Dilma Rousseff continuará vocalizando, com sua autorização, setores do governo e do partido que querem uma mudança.

O fato é que Lula, até ser confrontado pela disposição de Palocci de se demitir, ensaiou uma política ambígua que lhe seria muito útil na campanha eleitoral. Ele sabe que não pode mudar a economia, mas precisa sinalizar para o partido e para a opinião pública que pode ser possível uma mudança num eventual segundo mandato.

Mas essa ambigüidade enfraquece o ministro Palocci, põe em dúvida a continuidade da política econômica e parece impossível mantê-la durante a campanha eleitoral. A deputada Luciana Genro, do PSOL, no seu estilo agressivo de fazer oposição, disse que a discussão entre Palocci e Dilma Rousseff nada mais é do que uma tentativa de Lula de fingir que pode vir a alterar a política econômica a médio prazo.

O próprio Palocci, em que pese tenha repetido os elogios aos governos anteriores e se mostrado compreensivo com os eventuais erros que identificou, espantou-se com críticas de alguns deputados do PSDB. Foi o ex-presidente Fernando Henrique quem deu início à crítica ao que classificou de "ultra-ortodoxia" da equipe econômica, e ontem essa foi a tônica dos oposicionistas.

Chamando a atenção para a discrepância entre os discursos e a prática do governo anterior, Palocci rejeitou as críticas. A tática deu certo na Câmara, mas certamente não será possível adotá-la na campanha eleitoral.

A pesquisa de opinião divulgada ontem só mostra como vai ser difícil a Lula resistir a uma campanha eleitoral que vai pôr em choque o que o PT defendia antes de ser governo e a política econômica que adota. E vai revolver todas as denúncias de corrupção que estão corroendo seu prestígio junto ao eleitorado.


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