Entrevista:O Estado inteligente

terça-feira, novembro 29, 2005

ELIANE CANTANHÊDE Não é proibido gastar

FSP
BRASÍLIA - Como ministro da Fazenda do governo Sarney, nos anos 80, Francisco Dornelles impunha superávit fiscal pesado, juros altos, arrocho. Aliás, seguindo à risca o discurso escrito para o tio, Tancredo Neves, e lido pelo sucessor de última hora, José Sarney: "É proibido gastar".
Ortodoxo e cheio de si, o técnico Dornelles foi chamado à razão (daqueles tempos) pelo então ministro da Justiça, o político Fernando Lyra: "Nós levamos 20 anos para chegar ao poder. Você acha que a turma vai ficar sem emprego, sem verba, sem obra? Você está maluco!".
Ao concluir que não tinha força para enfrentar a lógica política, Dornelles pediu o boné. Deu no que deu. Uma festa! O ministro caiu, os cofres se abriram, o PMDB foi bem votado nas eleições e o governo chegou ao fim com uma inflação recorde de 80%... ao mês! Sarney não tinha alternativa. Era ceder e ficar ou resistir e sabe-se lá o que iria acontecer.
Duas décadas depois, a discussão de gasta-não-gasta, de "ortodoxos" e "heterodoxos", de "desenvolvimentistas" e "financistas" continua. A diferença é que Dornelles perdeu apoio político com a morte de Tancredo, e Palocci se enfraqueceu à custa de Burattis, Polettos, Barquetes. Quando bateu, Dilma Rousseff sabia que podia bater. Palocci balançou. Talvez não tenha caído, como o argentino Lavagna, porque a oposição maneirou e Lula recuou.
Lula mandou Palocci e Dilma acertarem os ponteiros, sob a mais elementar constatação de que, com tanto solavanco ético, tanta inércia administrativa e um PIB negativo no trimestre, não dá para brincar de mudar a economia. Aliás, nem há mais tempo para Lula e o PT negarem tudo e improvisarem outro discurso para o palanque reeleitoral.
Palocci abre um pouco a mão, Dilma arranca uns trocados a mais para gastar, os dois posam de casal feliz e toca-se a vida, rumo a 2006. Lula, Palocci, Dilma e o PT parecem, enfim, perceber que a guerra não ajuda ninguém. Ninguém deles, claro.

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