A única política de Lula
Luiz Inácio Lula da Silva fez carreira no sindicalismo e no PT arbitrando divergências a que ele próprio muitas vezes dava corda para servirem exatamente de instrumento de afirmação e consolidação de sua liderança tutelar. Quando o partido cresceu e começou a ganhar eleições para o Executivo, e se multiplicaram - como em qualquer agremiação - os nódulos de interesses insuscetíveis de serem aplacados pelo carisma do pai de todos, foi José Dirceu quem assumiu a incumbência de fazer a terraplenagem das diferenças, impondo aos petistas a sua modalidade particular do "centralismo democrático" dos antigos partidos comunistas. No governo, enquanto tinha a força e era o capitão do time do presidente, Dirceu continuou a ser o seu braço executor de companheiros e políticas tidas como contraproducentes ao projeto reeleitoral que já estava na agenda de Lula quando ele subiu a rampa do Planalto. Assim foi fulminada, por desastrosa na concepção e desastrada na execução, a versão original do Fome Zero, com o devido defenestramento dos seus responsáveis. Afinal, poucas coisas poderiam atrapalhar mais o projeto que viria a se chamar "Fica Lula" do que o assistencialismo malfeito. Só o comando da política econômica ficou fora do alcance de Dirceu. Isso porque o ministro Antonio Palocci recebeu carta branca não só para levar adiante as promessas da Carta aos Brasileiros de julho de 2002 de que não haveria ruptura com o que estava aí, mas também para escolher a sua equipe sem interferência do PT. E ele fez uma coisa e outra de forma tal que a esquerda petista não imaginaria nem nos seus piores pesadelos. Obrigado pela crise da corrupção a se desfazer de Dirceu, Lula transferiu para a Casa Civil a aguerrida ministra de Minas e Energia, Dilma Rousseff, sintomaticamente saudada pelo antecessor, na cerimônia de posse, como "companheira de armas". Dilma, com a anuência ou o incentivo de um presidente assolado pelo "denuncismo", como deu de dizer, e pelo desencanto dos neolulistas - a classe média cujo voto foi decisivo para elegê-lo -, resolveu retomar por outros meios o combate a Palocci, também ele enfraquecido pelo que começou a emergir de seu passado. Além de fustigar a sua política no plano conceitual, investiu contra a alegada avareza da Fazenda na liberação das verbas orçamentárias para os Ministérios. A história dirá se ela foi ou não longe demais no ataque frontal ao "rudimentar" plano de ajuste fiscal de longo prazo, cujos formuladores entendem ser o desdobramento lógico e desejável do atual modelo de gestão das finanças públicas - como voltou a defender ontem, na Camara dos Deputados, o ainda ministro Palocci. O certo é que a entrevista ao Estado em que ela também disse que a política monetária equivalia a "enxugar gelo seco" complicou, muito além do que Lula previa, a sua perceptível intenção de mexer na política econômica sem mexer no seu titular - o "Palocci sem paloccismo" de que já se falou neste espaço. O presidente parece ter achado que poderia comer o bolo e guardá-lo, revivendo a tática que usava na luta sindical e no PT, citada no início deste editorial. Faltou combinar com Palocci - cujo cenho franzido na solenidade da sanção da chamada MP do Bem proclamava eloqüentemente o fracasso da esperteza do chefe. Este usou o evento para dar com uma mão o que retiraria com a outra: celebrou a continuidade da política econômica, mas acabou com a ascendência do seu condutor sobre ela. "Neste governo não tem política econômica do Palocci", estabeleceu. "Tem política econômica do governo." Tivesse ele dito isso imediatamente em seguida à entrevista de Dilma, soaria como um desagravo ao ministro. (Além de como demonstração de que tem um mínimo de noção de qual seja o papel de um presidente numa briga entre dois importantes ministros.) Agora, soou como um convite para que pedisse as contas. Contrariando o noticiário de ontem, Palocci até poderá fingir que não era com ele e dobrar-se à política econômica "do governo", que já não será o que foi - ao preço de uma perda devastadora de patrimônio político. Já se sair, decerto sairá a sua equipe, nela incluído o presidente do Banco Central, Henrique Meirelles. Acabará então o que resta do governo do presidente que a rigor só foi responsável por uma única política - a de promover, irresponsavelmente, dissensões públicas entre os seus, para, diante delas, posar de líder.
| |
|
Entrevista:O Estado inteligente
- Índice atual:www.indicedeartigosetc.blogspot.com.br/
- INDICE ANTERIOR a Setembro 28, 2008
quarta-feira, novembro 23, 2005
EDITORIAIS de O ESTADO DE S.PAULO
Arquivo do blog
-
▼
2005
(4606)
-
▼
novembro
(452)
- PT, a frustração de Marx
- Pisavam nos astros, distraídos... CÉSAR BENJAMIN
- Quem pode ser contra as políticas sociais?
- José Nêumanne O mandato de Dirceu vale uma crise?
- LUÍS NASSIF Tem marciano no pedaço
- FERNANDO RODRIGUES Os sinais das bengaladas
- CLÓVIS ROSSI De "exército" a supérfluos
- EDITORIAIS DA FOLHA DE S PAULO
- MERVAL PEREIRA Continuidade
- ELIO GASPARI As leis da burocracia no apocalipse
- MIRIAM LEITÃO Destinos da América
- EDITORIAIS de O ESTADO DE S.PAULO
- EDITORIAIS de O ESTADO DE S.PAULO
- Nota (infundada) de falecimento Luiz Weis
- DORA KRAMER Controle externo subiu no telhado
- Lucia Hippolito As trapalhadas do Conselho de Ética
- O PT reescreve a história
- LUÍS NASSIF A dama de ferro
- Fazenda promete liberar R$ 2 bi para investimentos...
- JANIO DE FREITAS Pinga-pinga demais
- ELIANE CANTANHÊDE Não é proibido gastar
- CLÓVIS ROSSI Votar, votar, votar
- Jarbas Passarinho Maneiras diversas de governar
- EDITORIAIS DA FOLHA DE S PAULO
- EDITORIAIS de O ESTADO DE S.PAULO
- DORA KRAMER Movimento dos sem-prumo
- ALI KAMEL Não ao Estatuto Racial
- Arnaldo Jabor Vamos continuar de braços cruzados?
- MERVAL PEREIRA A paranóia de cada um
- Luiz Garcia Joca Hood
- MIRIAM LEITÃO Meio-termo
- AUGUSTO NUNES Iolanda só quer morrer em casa
- A hora das provas
- Carlos Alberto Sardenberg Menos é melhor
- EDITORIAIS de O ESTADO DE S.PAULO
- Denis Lerrer Rosenfield A perversão da ética
- Alcides Amaral O circo de Brasília
- FERNANDO RODRIGUES Uma boa mudança
- EDITORIAIS DA FOLHA DE S PAULO
- EDITORIAIS DA FOLHA DE S PAULO
- EDITORIAIS DA FOLHA DE S PAULO
- Lucia Hippolito O Supremo entrou na crise
- Lula é que é a verdadeira urucubaca do Brasil. Há ...
- A voz forte da CPI
- AUGUSTO NUNES O atrevimento dos guerreiros de toga
- MERVAL PEREIRA Mentiras políticas
- MIRIAM LEITÃO A balança
- Gaudêncio Torquato Lula entre o feijão e o sonho
- Paulo Renato Souza Há dez anos nascia o Provão
- DORA KRAMER Crise faz Jobim antecipar decisão
- JOÃO UBALDO RIBEIRO Os Independentes do Ritmo
- RICARDO NOBLAT Lições esquecidas em Cuba
- Celso Ming - Má notícia
- Daniel Piza O homem-bigode
- Mailson da Nóbrega Cacoete pueril
- FERREIRA GULLAR Paraíso
- DANUZA LEÃO Bom mesmo é namorar de longe
- LUÍS NASSIF O iconoclasta internacionalista
- Negociações comerciais e desindustrialização RUBEN...
- ELIO GASPARI
- JANIO DE FREITAS De olho na TV
- ANTÔNIO ERMÍRIO DE MORAES Gargalos brasileiros Tra...
- ELIANE CANTANHÊDE O sonho da terceira via
- CLÓVIS ROSSI Nem para exportação
- EDITORIAIS DA FOLHA DE S PAULO
- As manchetes deste sábado ajudam a campanha da ree...
- VEJA Como Darwin influenciou o pensamento moderno
- VEJA André Petry Soltando os presos
- VEJA Tales Alvarenga Bolcheviques cristãos
- VEJA Diogo Mainardi Posso acusar Palocci?
- VEJA MILLÔR
- VEJA Roberto Pompeu de Toledo A farsa cruel de um ...
- VEJA PSDB e PFL pegam leve de olho na governabilidade
- VEJA Como a turma de Ribeirão quase virou dona de ...
- VEJA Palocci vence queda-de-braço com Lula
- Corrupção ontem e hoje ZUENIR VENTURA
- MERVAL PEREIRA Dilema tucano
- MIRIAM LEITÃO Boa forma
- Complacência da imprensa Mauro Chaves
- EDITORIAIS de O ESTADO DE S.PAULO
- EDITORIAIS de O ESTADO DE S.PAULO
- EDITORIAIS de O ESTADO DE S.PAULO
- DORA KRAMER Imponderados Poderes
- Fogo baixo GESNER OLIVEIRA
- FERNANDO RODRIGUES A tese da alternância
- CLÓVIS ROSSI A vassoura e a China
- EDITORIAIS DA FOLHA DE S PAULO
- EDITORIAIS DA FOLHA DE S PAULO
- EDITORIAIS DA FOLHA DE S PAULO
- LULA TEM JEITO? por Villas-Bôas Corrêa
- Lula sabia, diz empresária
- Cadastro de internet
- MERVAL PEREIRA Até Lúcifer
- LUIZ GARCIA Cuidado: eles cobram
- MIRIAM LEITÃO A lona cai
- EDITORIAIS de O ESTADO DE S.PAULO
- DORA KRAMER Impasse continuado
- LUÍS NASSIF Cartas à mesa
- "Sou Palocci desde criança" LUIZ CARLOS MENDONÇA D...
- ELIANE CANTANHÊDE Em pé de guerra
-
▼
novembro
(452)
- Blog do Lampreia
- Caio Blinder
- Adriano Pires
- Democracia Politica e novo reformismo
- Blog do VILLA
- Augusto Nunes
- Reinaldo Azevedo
- Conteudo Livre
- Indice anterior a 4 dezembro de 2005
- Google News
- INDICE ATUALIZADO
- INDICE ATE4 DEZEMBRO 2005
- Blog Noblat
- e-agora
- CLIPPING DE NOTICIAS
- truthout
- BLOG JOSIAS DE SOUZA