Entrevista:O Estado inteligente

quarta-feira, novembro 23, 2005

EDITORIAIS de O ESTADO DE S.PAULO



Reviravolta política em Israel

Quando o Partido Trabalhista - agora sob a liderança de Amir Peretz, um dirigente sindical de tendência esquerdista, que derrotou Shimon Peres nas primárias do partido, na semana passada - comunicou que se retirava da coalizão governamental, no domingo, parecia que só restava ao primeiro-ministro Ariel Sharon dissolver o Parlamento e convocar novas eleições. Tudo indicava que Sharon obteria facilmente um novo mandato nas urnas. Afinal, aos 77 anos, ele é o mais popular líder político de Israel e as pequenas rebeliões que vinha enfrentando dentro de seu próprio partido, o Likud, desde que, em setembro, ordenou a retirada das colônias na Faixa de Gaza e a restituição do território aos palestinos, incomodavam, mas não ameaçavam a sua liderança.

Mas Sharon tinha outra interpretação da dinâmica política israelense. Já não queria perder tempo com "pugilato político" e desperdiçar a oportunidade de avançar o processo de paz com os palestinos, nesta fase iniciada com o desmantelamento dos assentamentos da Faixa de Gaza. Além disso, afirmou, "o Likud, com sua atual configuração, não pode liderar a nação rumo aos seus objetivos".

Assim, deixou o partido, fundou um outro - o Partido da Responsabilidade Nacional - e pediu a dissolução do Knesset e a convocação antecipada de eleições para março. O velho general, que na Guerra do Yom Kippur, contra todas as expectativas, atravessou com suas tropas o Canal de Suez, cercou um exército egípcio e ficou a cavaleiro do Cairo - precipitando o final da guerra -, promoveu, em menos de 24 horas, a maior revolução da vida política israelense dos últimos 30 anos, como avaliam os observadores políticos locais.

À primeira vista, Ariel Sharon teria cometido uma temeridade. Sendo um primeiro-ministro popular, deixou o partido com maior representação no Knesset e lançou-se numa disputa de resultados imprevisíveis. Mas a verdade é que o velho general fez os seus cálculos. Ele deixou o Likud - que continua majoritário - levando 14 deputados, sendo 5 ministros. O seu novo Partido da Responsabilidade Nacional passou a ser o segundo maior partido no Parlamento. Além disso, pesquisas de opinião feitas logo após o anúncio de sua decisão indicaram que o Partido da Responsabilidade Nacional poderá eleger 28 deputados em março, o suficiente para garantir a Sharon um terceiro mandato como primeiro-ministro e condições para formar uma coalizão com pequenos partidos.

A manobra de Ariel Sharon o leva declaradamente para o centro do espectro político israelense. O Partido Trabalhista, nos últimos dias, moveu-se para a esquerda. Durante a campanha eleitoral, pretende, sob a liderança de Amir Peretz, dar ênfase à discussão dos problemas econômicos e sociais do país, lembrando que, durante o governo do Likud, o ministro das Finanças e ex-primeiro-ministro Benyamin Netanyahu tirou Israel de uma longa recessão, mas à custa do corte de benefícios sociais e do aumento da pobreza. E o Likud, que provavelmente será novamente liderado por Netanyahu, ficará ainda mais à direita, prevalecendo a linha que considera as concessões de Ariel Sharon aos palestinos uma traição a Israel.

Sharon, por sua vez, não deverá ficar pouco à vontade na liderança de um partido centrista. Ele tentará capturar os votos dos trabalhistas que não desejam o confronto sindical prometido por Peretz - e nesse grupo estão o ex-primeiro-ministro Shimon Peres e seus seguidores - e os votos dos eleitores da direita, para os quais as questões de segurança nacional devem ser encaminhadas com prudência e firmeza. Afinal, não foi outra coisa que Ariel Sharon fez. Venceu duas eleições apresentando-se como linha-dura, mas implementou uma política moderada, que nos últimos tempos rompeu o impasse entre palestinos e israelenses, a partir da devolução da Faixa de Gaza.

Mas o fato é que Ariel Sharon, durante os seus anos de governo, nunca revelou publicamente os seus planos estratégicos de longo prazo. Sempre solapou a Autoridade Palestina, para não ser obrigado a ir mais longe do que desejava nas negociações, mas aproveitou todas as oportunidades que surgiram para ceder território e garantir fronteiras seguras para Israel. Tudo indica que continuará essa política.

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