Entrevista:O Estado inteligente

segunda-feira, maio 21, 2007

PF ACUSA MINISTRO DE RECEBER R$100 MIL DENTRO DO GABINETE

PROPINA ENTREGUE NO GABINETE

Jailton de Carvalho e Evandro Éboli
O Globo
21/5/2007

DINHEIRO PÚBLICO NO RALO

PF acusa ministro de Minas e Energia de receber R$100 mil da Gautama; ele nega

As investigações da Polícia Federal na Operação Navalha atingem o ministro de Minas e Energia, Silas Rondeau. No relatório enviado ao Superior Tribunal de Justiça (STJ), a PF acusa o ministro de corrupção passiva. O documento afirma que Rondeau recebeu a quantia de R$100 mil em seu gabinete, em Brasília, no dia 13 de março deste ano. O dinheiro, segundo a PF, teria sido levado por emissários do empresário Zuleido Veras, dono da empresa Gautama, que está no centro do esquema de desvio de recursos públicos.

"Apurou-se ainda que Silas Rondeau (ministro de Minas e Energia) recebeu, por meio de Ivo Almeida Costa (assessor especial do ministério), a quantia de R$100 mil, entregue por Maria de Fátima, uma vez que teria destinado recursos oriundos do PAC (Programa de Aceleração do Crescimento) para convênio que beneficiaria a construtora Gautama", diz o relatório da PF.

De acordo com o documento, quem levou o dinheiro ao ministério foi Maria de Fátima Palmeira, diretora comercial da Gautama presa semana passada na Operação Navalha. Com gravações telefônicas e imagens do circuito interno do prédio do ministério, a PF flagrou Fátima entrando no prédio. Lá, ela encontrou-se com Sérgio Pompeu Sá, lobista que teria intermediado o suposto pagamento de propina ao ministro. Ele a esperava no gabinete de Rondeau.

Segundo a PF, o dinheiro foi repassado ao ministro por seu assessor especial Ivo Almeida Costa, que também está preso. Ivo aparece nas imagens e leva Fátima até a saída, após o encontro.

A diretora da Gautama chegou ao gabinete pela entrada privativa do ministro, para evitar que fosse identificada na outra portaria. Essa recomendação foi feita por Sérgio Sá, em conversa que foi registrada pela Polícia Federal.

- Quando você chegar, entra por aquela outra portaria pra não ter que passar lá, identificar nem nada. Tá? - pediu Sérgio.

-Tá bom. Tá fechado - disse Fátima, na gravação.

Silas Rondeau não aparece em qualquer imagem e não há gravação de sua voz. Mesmo assim, a PF concluiu que "há indícios suficientes que apontam para a prática de corrupção passiva, tendo em vista as diversas menções que Sérgio Sá e o próprio Zuleido fazem a conversas e reuniões com o mesmo (ministro)".

Rondeau é citado nas conversas, segundo o relatório, com a alcunha de "chefão maior". Assim ele é chamado pelos diretores da Gautama. No diálogo, Sérgio diz a Zuleido que o ministro está indócil.

- Você dá um toque na tua Tereza (Freire, secretária da Gautama em Brasília) porque o chefão maior tá indócil com aquilo... Ele (Silas Rondeau) me ligou ontem à noite e falou: "Pelo amor de Deus, a água tá transbordando" - diz Sérgio a Zuleido, que dá uma risada.

O dinheiro, que, segundo a PF, foi entregue em 13 de março, foi sacado quatro dias antes numa agência da CEF em Salvador. De lá foi levado para Brasília, no mesmo dia, por Florêncio Vieira, do setor financeiro da Gautama. O montante seria entregue a Ivo, assessor do ministro.

Em outro trecho de conversa telefônica gravada pela PF, Zuleido diz a Tereza que o dinheiro seguiria para Brasília e que ela devia providenciar a entrega a Ivo. O empresário fica incomodado por ela referir-se a Ivo como uma pessoa que trabalha no Ministério de Minas e Energia.

- Tá indo 120 (mil reais) também, e você vai entregar ao Ivo... Sabe quem é Ivo, não sabe? - pergunta Zuleido.

- Lá do ministério - responde Tereza.

- Não precisava dizer de onde era - afirma Zuleido.

Apesar dessa referência a R$120 mil, o relatório da PF afirma que o valor repassado ao ministro e seu assessor foi de R$100 mil.

O relatório classifica a direção da Gautama de organização criminosa, que desvia dinheiro através de fraude de licitações direcionadas para a construtora de Zuleido. "Para a concretização de tais ações, corrompem quaisquer servidores públicos e agentes políticos, bem como contam com ampla rede de lobistas que praticam tráfico de influência em órgãos públicos estratégicos de interesse para a organização", diz o relatório da PF.

O esquema conseguiu até preparar e elaborar uma licitação em conluio com o presidente da Companhia Energética do Piauí (Cepisa), Jorge Targa, e ganhou uma concorrência do programa Luz Para Todos, em Teresina, segundo a PF. Targa está preso. Essa concorrência se arrastou no segundo semestre de 2006 e, em dezembro, a Gautama foi considerada vencedora do contrato.

Zuleido chegou a se reunir com Silas Rondeau, no ministério, em 27 de fevereiro deste ano. Participaram também da conversa o lobista Sérgio Sá e o diretor do programa Luz para Todos, José Ribamar Lobato Santana. Eles discutiram um anexo e um aditivo à licitação.

Sérgio Sá foi responsável também por fazer a intermediação da Gautama com o governador do Piauí, Wellington Dias, do PT. Segundo a PF, Wellington também conversou com Silas Rondeau para que fosse liberado o restante do dinheiro do Luz para Todos.

O ministro, que estava ontem no Paraguai para inaugurar obra com o presidente Lula, negou ter recebido propina e qualquer participação no esquema.

- Não se deve julgar por boatos. Meu chefe de gabinete não é a pessoa supostamente envolvida. Tomamos todas as providências que um ministro tem de tomar. Não podemos nos basear em informações que surgem a cada momento - disse, e acrescentou:

- Não há uma prova porque é uma mentira. Não há prova de uma mentira. Pode haver uma suposição. Eu não acredito que a PF tenha dito isso. Porque teria que haver uma prova.

Sobre a suposta propina, o ministro afirmou:

- Desconheço essa informação. Naturalmente, a PF, o MP, os órgãos envolvidos elucidarão essas questões. Estou absolutamente à vontade (para continuar no governo). Nada tenho a temer. Estou absolutamente convicto de que não existe nada que venha a comprometer. Isso será provado.

'Aqui é o oitavo andar'

No dia 13 de março, Maria de Fátima Palmeira, diretora comercial da Gautama, conversa com o lobista Sérgio Sá, minutos antes de se encontrarem no Ministério de Minas e Energia para, segundo a PF, entregar R$100 mil a Ivo Ivo Costa e ao ministro Silas Rondeau.

Sérgio:"Oi Fátima, tudo bem?"

Fátima:"Tô indo lá pro ministério. (...) se encontra lá embaixo, como é que faz?"

Sérgio: "Já tô aqui, já. A hora que você me ligou eu tava junto com ele, mas você chegando eu vou sair aqui pra fora do gabinete e te espero aqui fora."

Fátima: "Tô saindo agora, daqui a pouco tô chegando."

Sérgio: "Tá bom. Aqui é o oitavo (onde fica o gabinete do ministro Rondeau)."

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