Pesquisa mostra que jovens de origem
asiática vão mais longe nos estudos e
estão deixando os brasileiros para trás
Camila Antunes
Fotos Roberto Setton |
A estudante Liane Iwahashi: o maior sonho dos avós japoneses era ver a neta na universidade |
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Ao embarcarem num navio rumo ao Brasil, na década de 40, os Iwahashi fugiam de um Japão destroçado pela guerra e alimentavam uma idéia fixa: ver os filhos com diploma universitário. Como camponeses no interior de São Paulo, gastaram cada centavo poupado com livros. Dos nove filhos, sete chegaram à universidade. A jovem Liane, estudante de artes plásticas que aparece na foto acima, integra a nova geração de universitários da família. São atualmente doze Iwahashi no ensino superior brasileiro. Uma nova pesquisa mostra que eles compõem um universo bem maior. De acordo com dados do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), 37% dos alunos de origem asiática no Brasil concluem a universidade – quatro vezes mais do que a média dos estudantes brasileiros. Uma das evidentes razões para o sucesso desses jovens é mensurável – e simples: eles estudam mais. Enquanto um típico aluno brasileiro passa cinco horas por dia às voltas com aulas e livros, os que vêm de família coreana, chinesa ou japonesa dedicam pelo menos oito horas aos estudos, segundo a pesquisa. Em suma, eles repetem no Brasil a fórmula aplicada em seu país de origem: investem tudo o que têm em educação – e varam noites debruçados sobre apostilas e equações matemáticas. Deu certo lá. Está funcionando aqui. Conclui o pesquisador Kaizô Beltrão, autor do estudo, também descendente de japoneses: "Os asiáticos no Brasil estão deixando o restante da população para trás".
Outro fator que esclarece a superioridade dos estudantes pesquisados por Kaizô é um aguçado senso de competição – alimentado em casa e incentivado em escolas que recebem os filhos dos imigrantes, como a Polilogos, em São Paulo. Em salas nas quais se ouve apenas a voz do professor (sim, os alunos asiáticos costumam permanecer em silêncio durante as aulas), a briga pelo posto de melhor da classe é um eficiente motor ao bom resultado geral. A escola implantou um sistema para premiar os campeões. A cada três meses, produz um novo ranking dos estudantes, baseado nas notas. No fim do ano, os melhores são celebrados na frente dos demais e recebem como prêmio aparelhos eletrônicos variados, bem à moda asiática. No ano passado, o estudante Clinton Sung Shin, de 14 anos, foi o número 1 de sua turma. Vibrou. Agora mergulha nos livros para repetir a dose. Tímido, ele se assume nerd. "Entre meus amigos de família asiática, isso é sinal de prestígio, e não de vergonha, como para os brasileiros", diz. Um detalhe sobre a escola de Shin: lá os bons professores também são recompensados. Antes de serem efetivados, eles precisam responder a uma prova sobre a matéria que vão ensinar. Os que vão mal ficam de fora. Aqueles que se destacam, por sua vez, recebem os salários mais altos. A meritocracia que impera nessa e em outras escolas do gênero é coisa rara no Brasil. Em geral, o que predomina no país é um modelo que coloca os bons e os maus alunos (e professores) no mesmo patamar – e não incentiva ninguém.
De família coreana, Olívia, Jaqueline e Clinton são os melhores da turma: eles estudam dez horas por dia |
Os estudantes de origem asiática não sobressaem apenas na escola. Um levantamento feito pela Universidade de São Paulo revela que eles chegam a ocupar quase 20% das vagas nas carreiras mais disputadas, como medicina e engenharia. O número surpreende, uma vez que, na população brasileira, os asiáticos são bem poucos: apenas 0,45% do total. Em outros países, como os Estados Unidos, a situação é semelhante. Nas melhores universidades americanas, eles circulam por toda parte (especialmente nas carreiras tecnológicas, uma outra tradição importada de casa). Não passam de 4% da população no país, mas em Stanford são donos de 24% das vagas. Na Universidade da Califórnia, em Berkeley, o número chama ainda mais atenção: concentram quase a metade das matrículas. "Eles têm o estudo no DNA", define a especialista americana Soo Kim, descendente de coreanos e autora de um livro sobre o assunto. Desde os primeiros anos de vida, são estimulados pela família a dedicar-se à escola (e às vezes engatam em rotinas maçantes, que incluem noites insones e muita decoreba). A ativa participação dos pais na vida escolar, como ocorre na casa dos estudantes Liane Iwahashi e Clinton Shin, é certamente um fator decisivo ao ótimo desempenho alcançado em sala de aula. Resume o economista Claudio de Moura Castro: "As famílias asiáticas entenderam há muito tempo que o sucesso depende de sacrifícios e paciência para esperar pelos resultados". Os brasileiros ainda não.