Entrevista:O Estado inteligente

domingo, maio 20, 2007

VINICIUS TORRES FREIRE Uma troca de câmbio liberal



Economista sugere sistema parecido com o de Chile, China, Noruega e Rússia para conter danos da torrente de dólares

NAS INFINITAS falações dessa rede varejista de oráculos que são os economistas de banco e assemelhados, diz-se que nada se pode fazer diante da torrente de dólares que entra pelos canos da economia e de seus efeitos no câmbio. Tomás Málaga, experimentado economista-chefe do Itaú, acha, sim, que há alternativas. Málaga sugere que parte das reservas internacionais (ou melhor, parte do dinheiro que poderia acabar nas reservas) seja destinada a um fundo de investimentos em papéis de empresas privadas de fora do Brasil.
O Banco Central compra parte dos dólares que entram no país; os empilha nas "reservas internacionais". Isto é, as aplica em ativos seguros, na maior parte papéis da dívida pública americana, de risco teórico zero, mas que rendem pouco. A idéia de Málaga é que o Tesouro compre "reservas" (divisas em moedas fortes) e as aplique em grandes empresas, com ótimo crédito (que não devem dar calote). "Basta de financiar o governo dos EUA com taxas de retorno reduzidas", diz.
As empresas-alvo seriam aquelas cujo desempenho não depende diretamente do setor de commodities (produtos básicos, matérias-primas), como as de tecnologia ou serviços. Por quê? Como cerca de metade das exportações brasileiras é commodity, ou algo assim, há enxurrada de dólares no Brasil quando o preço das commodities sobe, como nos últimos três, quatro anos, e seca quando elas despencam. Diz-se que o preço das commodities vai continuar alto devido a China e cia., mas o Brasil costuma viver dias tristes com o fim desses ciclos altistas.
Ao aplicar em papéis cujo preço não está associado à variação do preço das commodities, o país como que criaria um fundo de compensação da seca de moedas fortes decorrente da queda dos preços dos produtos básicos. É uma medida que pode "livrar a economia e as finanças públicas da maldição da dependência dos recursos naturais", diz Málaga. Seria como que um modo de "hedgear" a conta corrente.
Países diferentes como Chile, China, Rússia e Noruega adotam medidas semelhantes. O Chile é muito mais dependente de commodities que o Brasil: do cobre, quase 50% de suas exportações, mais de 20% da receita do governo (a estatal do cobre é 25% do setor). Mantém fora do país parte dos dólares das exportações de cobre, o que evita valorizações adicionais do peso, tarefa auxiliada por medidas prudentes como juro e déficit público baixos. A China criou uma instituição (fora do Banco Central) para administrar um fundo que diversificaria a aplicação de parte de suas reservas de US$ 1 trilhão.
O economista do Itaú sugere ainda que o país pare de fazer "captações" (empréstimos no exterior) e liquide a dívida antiga e cara (o que tende a baixar o risco país e atrair mais dólares, mas ajuda a derrubar os juros). Juros: "É preciso reduzi-los mais agressivamente", diz.
Claro, Málaga propõe abertura comercial planejada. Prega que o governo gerencie de modo "pró-ativo" a bonança financeira. Por exemplo, acelerando concessões de serviços públicos (sim, privatização de portos, ferrovias de trem-bala, o que seja) a fim de empregar os dólares em importações úteis, e não em comida de gato francesa.

vinit@uol.com.br

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