Entrevista:O Estado inteligente

quinta-feira, outubro 19, 2006

Reacomodação



EDITORIAL
Folha de S. Paulo
19/10/2006

Políticas públicas de Lula ajudam a explicar o seu favoritismo à reeleição, mas o modelo está no limite do insustentável

APESAR DE as duas primeiras pesquisas feitas pelo Datafolha após o primeiro turno já indicarem uma inversão de tendência na disputa presidencial, a escalada nas intenções de voto de Luiz Inácio Lula da Silva apurada na sondagem mais recente não deixou de surpreender. O candidato à reeleição subiu quatro pontos percentuais em uma semana, e sua vantagem sobre o ex-governador Geraldo Alckmin, desconsiderados os eleitores indecisos e aqueles dispostos a votar nulo ou em branco, ampliou-se de 12 para 20 pontos.
Se as eleições fossem hoje, o tucano amealharia praticamente a mesma fatia de escrutínios que obteve em 1º de outubro, cerca de 40% dos votos válidos. Lula, que teve quase 49% no primeiro turno, agora agrega a este patamar preferência comparável à soma dos que, na primeira votação, optaram por Heloísa Helena e Cristovam Buarque.
Confirma-se, em velocidade impressionante, a correlação entre o favoritismo de Luiz Inácio Lula da Silva e o distanciamento, no tempo, dos desmandos éticos ocorridos na gestão petista. A reeleição só foi ameaçada, de acordo com as pesquisas, no segundo semestre do ano passado -crise do mensalão- e nas duas semanas que antecederam o primeiro turno, com a eclosão do chamado escândalo do dossiê.
Essa reacomodação do favoritismo do candidato do PT decerto foi incentivada por outros fatores. O factóide, disseminado pelos petistas, sobre a "ameaça" que a eleição de Alckmin representaria à Petrobras e ao Bolsa Família parece ter sido eficaz como tática de campanha. Se não logrou ampliar o apoio a Lula, pelo menos enredou o seu adversário: há dias Alckmin vem consumindo grande parte de seu tempo desmentindo que vá privatizar a estatal e cortar recursos do programa social.
Há, porém, um fator menos conjuntural nessa ampla preferência por Lula, que quase inercialmente se refaz tão logo esfria o noticiário sobre falcatruas. Mais de um ano de pesquisas eleitorais ininterruptas deixa clara a esmagadora popularidade do presidente nas camadas de renda mais diretamente beneficiadas por políticas públicas deslanchadas sob seu governo.
A inflação baixa (menor ainda nos itens que mais pesam no orçamento da maioria da população), o forte reajuste do salário mínimo, o Bolsa Família e outros programas de transferência de recursos parcial ou totalmente subsidiados beneficiam dezenas de milhões de brasileiros pobres ou próximos da pobreza.
A opção dessa massa de eleitores por Lula, portanto, é racional -bem como o são os seus movimentos de hesitação, associados a desmandos gravíssimos sob a esfera do petismo governista.
É uma pena, no entanto, que nem a campanha de Lula nem a de Alckmin estejam contribuindo para esclarecer o eleitor acerca dos limites desse modelo que melhora o padrão de vida dos mais pobres à custa do gasto público e da competitividade da economia -prejudicada pelos juros astronômicos e pelo câmbio muito valorizado. Ou o Brasil cresce e passa a fazer a inclusão social pelo mercado de trabalho ou os ganhos sociais obtidos nos últimos anos serão corroídos.

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