Entrevista:O Estado inteligente

domingo, outubro 29, 2006

Simpático, Lula não entende a democracia


Acabei de ver o pronunciamento-entrevista do presidente reeleito, Luiz Inácio Lula da Silva. A Veja On Line e os outros sites noticiosos certamente destacarão os principais itens sobre os quais ele falou. Para bom observador, o clima era menos triunfalista do que poderia ter sido. Lula já não fica mais com a voz embargada. O PT promove uma festança em São Paulo. Ele deve ter reservado as lágrimas para o seu chamado público-alvo. O Apedeuta é mesmo um caso sério. COM ABSOLUTA CERTEZA, A MAIORIA DA IMPRENSA NÃO DARÁ DESTAQUE às evidências de que ele não compreende direito o regime democrático — ele e seu partido.

Sim, sua fala teve de tudo: estendeu a mão para as oposições; disse que o processo eleitoral acabou e que é preciso pensar no Brasil; vai conversar com todos os partidos, vai ouvir a sociedade; prometeu crescimento de 5% no ano que vem; afirmou que a população pobre é que será privilegiada etc, etc, etc. Descontraído, brincou com a imprensa. Disse que vai dar mais coletivas neste mandato. Transformou, aliás, o que seria um pronunciamento numa pequena entrevista. Simpático a mais não poder. E por que afirmo que ele não compreende a democracia?

Em dois momentos, Lula se traiu. Indagado sobre como será a sua relação com o Parlamento, disse, primeiro, uma frase daquelas lapidares: “O Congresso é uma cabeça pensante com muitas cabeças pensantes ao mesmo tempo”. O que isso significa? Sei lá eu. Talvez seja a peruca da Medusa... Ao falar de com quem manterá a interlocução, pôs em pé de igualdade o Congresso, os partidos e os “movimentos sociais”. Todos, segundo ele, vão interferir. Eleito com mais de 60% dos votos válidos, Lula vai tentar ir para a galera. Querem apostar quanto?

De volta
Quando Lula foi eleito, em 2002, anunciou-se com pompa a criação do tal Conselho do Desenvolvimento Econômico e Social, o tal Conselhão. Era formado por pessoas indicadas pelo presidente. Em 2003, o então presidente da Câmara, o mensaleiro João Paulo Cunha (PT-SP), chegou a propor que sessões daquele órgão valessem por sessões do Congresso, para apressar as reformas.

Desta feita, Lula não veio de “Conselhão”, mas anunciou: “Medida tomada na minha mesa terá de ser implementadas em 30 dias. Os problemas que sejam resolvidos antes”. Ou ele está contando uma mentira antecipada ou pretende se tornar, mesmo, um ditador. Não são os rituais jurídicos que entravam a máquina pública, não. A ineficiência é política.

Pegue-se o caso das licenças ambientais para construir hidrelétricas. Não se tem a decisão, positiva ou negativa, porque há um conflito entre correntes petistas no governo. O que Lula anunciou é impossível. Em muitos casos, é só a partir da decisão presidencial que se mobiliza a máquina. Fazê-lo antes pode implicar deseconomia, gastos desnecessários. Mas ele disse com todas as letras: quer fazer com que as coisas “não tenham o tempo normal que têm no Brasil”. Então será o tempo anormal.

Nos dois casos, trata-se de alguém que não entende a diferença entre o tempo da pressão dos grupos organizados e o tempo das instituições. Falar isso hoje parece quase lunático. Também parecia em 2002, quando afirmei num texto, em Primeira Leitura, que as instituições seriam rebaixadas com Lula. E foram.

Eternamente em campanha
Depois de afirmar que está com os braços estendidos; depois de pregar a união nacional, de ignorar solenemente que ele é reeleito sob acusações inéditas de corrupção, voltou a fazer proselitismo eleitoral. Afirmou que, “mesmo apanhando como nenhum governo apanhou neste país”, conseguiu fazer uma administração melhor do que os oito anos de seu antecessor. E filosofou: “Agora, a comparação vai ser comigo mesmo”. Besteira. Lula não vai largar jamais o osso do antitucanismo; mais particularmente, jamais deixará de mobilizar a máquina do PT para satanizar FHC. Agora, são 4 contra 8; depois, 8 contra 8. No mais, fez o que dele se esperava: prometeu mais emprego, mais renda, mais trabalho, mais felicidade, mais o que der na telha. Nestepaiz...

E, vejam só: eu e Lula temos certas divergências. Como vocês já leram, para divertimento dos que postam mensagens contra mim no Blog do Noblat, eu acho que o povo não é um tipo de muita confiança, hehe. Lula é diferente. Na sua camiseta, estava escrito: “A vitória é do Brasil”. Logo, quem votou contra ele votou contra o país. Eu desconfio é do povo inteiro; Lula, só de quem vota na oposição.

Faz sentido...
Por Reinaldo Azevedo

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