Entrevista:O Estado inteligente

sábado, outubro 28, 2006

Suave é a noite


Com um filme simples e divertido,
o octogenário Robert Altman avisa
que não vai entregar os pontos


Isabela Boscov


Divulgação
Keillor, Lily, Meryl e Lindsay: a última noite não tem por que ser diferente da primeira

DA INTERNET
Trailer do filme

Aos 81 anos (os dez últimos com um coração transplantado), algo como cinqüenta filmes e um Oscar honorário – espécie de homenagem póstuma antecipada que a Academia presta aos seus decanos –, Robert Altman poderia estar se preparando para a aposentadoria e ninguém teria do que reclamar. O diretor, porém, tem outros planos. Em A Última Noite (A Prairie Home Companion, Estados Unidos, 2006), que estréia nesta quinta-feira no país, ele se junta ao escritor Garrison Keillor, outra instituição americana, para mais um filme com a vivacidade que tem marcado seu retorno à forma, desde o início da década de 90 e O Jogador. Num pequeno teatro de St. Paul, Minnesota, o elenco de um programa radiofônico de variedades se reúne para aquela que será sua apresentação derradeira, depois de décadas no ar. A emissora foi comprada por um grupo religioso do Texas, que considera a atração fora de moda. O elenco, como de hábito populoso, inclui Lily Tomlin e Meryl Streep como irmãs cantoras, e Lindsay Lohan como a filha depressiva desta última; Kevin Kline como um detetive particular; Woody Harrelson e John C. Reilly como um duo de caubóis; e o próprio Garrison Keillor, que há mais de trinta anos transmite um programa semelhante (e de muito sucesso) a partir de St. Paul. Alguns desses personagens estão tristes porque a festa vai acabar, outros fazem planos para o futuro, outros ainda não têm opinião conhecida sobre o assunto. No geral, nada de muito momentoso acontece.

Cineastas adoram últimas coisas – últimos tangos, trens de metrô, imperadores, ceias, sessões de cinema – porque elas avisam que um determinado drama está para atingir seu ponto crítico e de fato rendem ótimos filmes, como todos acima. Altman, que é um pouco cínico e nada sentimental, jogou seus personagens numa última noite para desmentir esse pressuposto. Paixões, ódios e eventos históricos que eclodem não são, no seu entender, necessariamente mais interessantes ou relevantes que os atritos e comunhões comezinhos do dia-a-dia. Como seu astro e roteirista Keillor, ele é um admirador e um excelente retratista do pequeno e do prosaico. Essa noite é a última, mas, pelo que se vê, não é muito diferente da segunda ou da centésima. O que é o jeito de Altman esclarecer que não é que a mortalidade não o preocupe. É que ela não é sua única preocupação, nem a maior.

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