Entrevista:O Estado inteligente

quarta-feira, outubro 18, 2006

Miriam Leitão Em oposição


Houve um tempo em que Geraldo Alckmin não defendia o governo Fernando Henrique e fugia das perguntas sobre privatização, dizendo que era o momento de olhar o futuro, e não o passado. O embate eleitoral tirou-o do muro: agora, ele defende as privatizações feitas e pontua o que considera serem os avanços do governo FH: “Muita coisa que é colhida hoje foi plantada no governo passado.” Defende “reformas estruturantes”, mas antecipa apenas duas: a tributária e a política.

Alckmin diz que não é preciso a introdução da idade mínima de aposentadoria no INSS e usa um argumento que parece bom; mas não é. Diz que, como o Brasil é um país desigual, com expectativas de vida diferentes, a introdução da idade mínima prejudicaria os mais pobres, que têm esperança de vida menor. Os dados do INSS mostram que quem ganha mais é quem se aposenta por tempo de serviço. Os pobres têm mais dificuldade de comprovar vínculo formal. Aposentam-se bem mais tarde ou acabam encostados no Loas, que é uma ajuda a quem tem mais de 65 anos e é muito pobre (menos de 1/4 de salário mínimo de renda familiar per capita). Mesmo quando ponderei isso, Alckmin continuou dizendo ser contra a idade mínima. A mudança tem sido introduzida em todas as reformas que vêm sendo feitas atualmente no mundo.

Em alguns pontos, o discurso do candidato de oposição é muito parecido com o do presidente Lula: diante de qualquer pergunta sobre como fará ou de onde tirará dinheiro, a tendência de Geraldo Alckmin é dizer que o país vai crescer, e isso aumentará a arrecadação. Ótimo; se o país crescer, tudo fica, de fato, mais fácil, mas é preciso saber como o país vai sair do impasse que tem mantido a economia prisioneira do baixo crescimento.

Alckmin promete corte de gastos, redução de impostos e desoneração da folha. Mas quando perguntei sobre demissão de funcionários, ele disse que sabe que não pode demitir funcionário público e, ao mesmo tempo, promete uma administração “mais enxuta”. Tem razão quando diz que há uma série de desperdícios a cortar e ineficiências a corrigir na máquina pública e defende a interessante tese que é também um problema ético o gasto descontrolado.

A maior contradição do candidato Geraldo Alckmin nasceu no apoio da família Garotinho. Ele, que repetiu como mantra a frase “Diga-me com quem andas e dir-te-ei quem és”, agora diz que “apoio não se recusa”.

— Quero o apoio de todos os brasileiros, eu sou candidato. Num segundo turno, é natural que quem não queira ficar com o PT me apóie — diz ele.

Quando se compara isso ao apoio recebido pelo presidente Lula de Jader Barbalho, Newton Cardoso e outros notórios, Alckmin afirma que é completamente diferente e passa ao rol dos crimes como mensalão, compra de dossiê etc. São dois pesos e duas medidas. Para o candidato do PSDB, apoio a ele é voto; apoio ao governo é conluio.

Geraldo Alckmin critica a taxa de juros, mas, quando o PSDB estava no poder, os juros nominais foram sempre mais altos; os juros reais, em algum momento, também. Ele responde a isso dizendo que o governo Fernando Henrique enfrentou quatro crises externas e, quando a moeda está sob ataque, é preciso mesmo subir os juros, mas que agora o mundo está num dos seus melhores momentos, e a taxa de juros real brasileira é a mais alta do mundo.

Alckmin acha que a política macroeconômica está errada: juros altos demais, câmbio baixo demais, queda de investimento interno e externo, baixo crescimento. Perguntei que política cambial ele faria diferente, afinal o câmbio é flutuante e parte da valorização da moeda se deve à entrada dos dólares da exportação. O candidato do PSDB falou em “câmbio flutuante administrado”. Quis saber o que era isso, e ele disse que é como o atual; que, quando fala em “administração do câmbio”, está falando em compra de reservas, como é feito atualmente. Mas, ao mesmo tempo, critica a compra de reservas, lembrando que os dólares rendem 5%, enquanto os títulos que se tem que emitir para comprá-los custam 14%.

— O Brasil está queimando dinheiro — afirmou.

Até existe mesmo esta avaliação de que, acima do nível em que estão, as reservas já representam um péssimo negócio, e são apenas uma forma de o governo tentar evitar novas valorizações do real. Mas Alckmin, até agora, não deu uma resposta satisfatória sobre como seria a mudança que introduziria para evitar a valorização excessiva do real. A proposta feita por Yoshiaki Nakano de adotar mecanismo de controle de capital na entrada não foi apoiada por ele.

É natural a semelhança de propostas na política econômica, com diferenças apenas de nuances. Primeiro, porque foi o PT que se moveu em direção a uma política que antigamente chamava de “neoliberal” e, segundo, porque países amadurecem assim mesmo, sem que uma mudança de governo represente trocas dramáticas de rumo. Seu melhor ponto é ter uma consciência clara de que o Brasil tem um problema fiscal, e que o próximo governo precisará dar sinais de curto, médio e longo prazo nessa área para mostrar que está no caminho de resolver o impasse.

Alckmin nunca demonstra desânimo, apesar de o tempo e as pesquisas de opinião estarem claramente contra ele. Ao longo da campanha, foi se tornando menos um ser solitário, um enclave no PSDB, e mais um integrante de um partido e um projeto. Agora ele fala com freqüência do esforço eleitoral feito por Aécio Neves e José Serra e, não por acaso, defende o fim da reeleição e a manutenção de quatro anos de mandato.

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