Entrevista:O Estado inteligente

quarta-feira, outubro 18, 2006

Clóvis Rossi - O sono eterno




Folha de S. Paulo
18/10/2006

A lógica (sadia) de programas de transferência de renda, tipo Bolsa Família, é a seguinte: o governo dá a uma família uma quantia para que ela mantenha os filhos na escola. Devidamente escolarizadas, as crianças têm chances reais de inserir-se no mercado de trabalho e, por extensão, de deixar de depender dessa esmola oficial.
Pena que no Brasil essa "porta de saída" não esteja devidamente aberta, como demonstra o estudo de Sônia Rocha (Instituto de Estudos do Trabalho e da Sociedade), relatado ontem nesta Folha por Antônio Gois.
A partir dos 13 anos, a idade em que a garotada deveria começar efetivamente a abrir a "porta de saída", as taxas de evasão escolar crescem em ritmo acelerado.
Não é culpa do programa em si, ainda que possa haver sérias deficiências de controle para garantir a observância da contrapartida à doação oficial, que é a manutenção da criança na escola.
O problema é da desgraçada combinação entre a pobreza do país e o seu estancamento econômico nos últimos 25 anos. A renda das famílias é tão baixa que não dá para manter os filhos na escola, seja pelo custo, seja pela necessidade de fazê-los trabalhar para ajudar em casa.
Convém lembrar que o máximo que o Bolsa Família paga são R$ 95 por mês -ou US$ 1,5 por dia. O Banco Mundial usa US$ 2 ao dia como medida de pobreza extrema. Ou seja, quem ganha até esse limite ou abaixo dele é miserável.
Gabar-se da expansão do Bolsa Família, como Lula faz, é legítimo, mas insuficiente. Prometer ampliá-lo, como faz Alckmin, é igualmente legítimo, se sincero, mas insuficiente da mesma forma.
O nó verdadeiro só foi, de novo, tratado no gogó durante a campanha. É crescimento forte, educação universal e de qualidade, inclusão social. Na prática, dorme no Brasil um sono eterno.

Arquivo do blog