Mesmo que venha a ser reeleito, como indicam as pesquisas de opinião, o presidente Lula e o PT terão que rever seus métodos políticos se quiserem que o segundo mandato tenha um mínimo de governabilidade.
Com uma coalizão parlamentar enfraquecida pelos escândalos sucessivos, precisariam de pontes com a oposição para tentar aprovar pelo menos pontos consensuais de reformas como a previdenciária ou a tributária. Mas andaram radicalizando tanto a disputa política, e cometeram tantos erros, que ajudaram a reforçar a unidade dentro do PSDB, tarefa que parecia impossível no início da campanha. Paralelamente à disputa presidencial, corre dentro do PSDB uma disputa de longo prazo para ver quem sairá da campanha como a nova liderança política do partido.
Eleito ou não, Geraldo Alckmin, que parecia fadado a uma derrota estrondosa ainda no primeiro turno, já tem seu lugar garantido entre essas novas lideranças. Ressaltar na propaganda eleitoral que obteve 40 milhões de votos no primeiro turno faz parte da estratégia de marketing para colocá-lo diante dos eleitores como uma alternativa viável a Lula, mas serve também para marcar sua posição num futuro sem a Presidência.
Alckmin demonstrou ser um politico obstinado e lutador, muito além do que se imaginava no início da campanha, a ponto de tornar anacrônico o apelido de “picolé de chuchu”. Já ganhou um espaço próprio dentro do PSDB, e não é mais uma aposta absurda imaginar que ele possa vir a ser o próximo presidente da República, embora o sucesso na empreitada seja improvável. Com muito mais razão, torna-se quase natural que venha a ocupar a presidência do partido, da mesma maneira que José Serra assumiu o cargo após a derrota para Lula.
Para obter o apoio dos dois governadores mais importantes do PSDB — Aécio Neves, de Minas, e José Serra de São Paulo — Alckmin, a muito custo, assumiu o compromisso público de dar fim à reeleição. Uma demonstração de fraqueza política, mas também de que sabe quando tem que abrir mão de um projeto de mais longo prazo para tentar assegurar a vitória imediata.
De qualquer maneira, numa análise retrospectiva, teria sido pior se aceitasse os termos dos potenciais concorrentes no começo da campanha, quando ainda era um candidato desacreditado.
Naquele momento, soube resistir às pressões e impôs lentamente seu estilo à campanha.
Serra e Aécio só entenderam que seus futuros políticos dependiam mais do sucesso do PSDB do que de eventuais acordos tácitos com o governo quando Lula e o PT demonstraram que, tendo chance, tentam alijar os adversários, mesmo os que possam representar pontes de entendimento político mais adiante.
Ao mesmo tempo em que, através de emissários como o ministro da Justiça Márcio Thomaz Bastos, o governo enviava sinais a Serra de que seria possível um relacionamento político profissional num futuro segundo mandato de Lula, um grupo do PT tramava o dossiê contra sua gestão no Ministério da Saúde, numa tentativa de desestabilizar sua candidatura ao governo de São Paulo.
Estava implícito no golpe a vontade de garantir o controle para o PT do maior e mais rico estado brasileiro e, ao mesmo tempo, fazer de Aloizio Mercadante, eleito governador de São Paulo se a manobra desse certo, o candidato petista a sucessor de Lula.
Também Aécio Neves, que tinha uma eleição em Minas mais fácil ainda do que a de Serra, sentiu o peso da mão de ferro da política petista.
Inventar do nada a candidatura de Newton Cardoso ao Senado, para conseguir a aliança branca com o PMDB, não fazia nenhum sentido estratégico, já que Aécio representava uma parcela do PSDB que se dispunha a uma relação respeitosa com o governo Lula, fazendo a intermediação de um diálogo que considera necessário, apesar das pendências que continuarão existindo, especialmente no plano ético.
O próprio Lula revelou o quanto é difícil para o PT aceitar parcerias políticas, mesmo quando é o mais necessitado.
Com uma esperteza política que perde a eficácia na medida em que vai sendo muito exposta, Lula insinuou por diversas vezes que Aécio poderia ser um candidato à Presidência apoiado pelo PT, que não tem nenhum nome consensual para sua sucessão.
Chegou mesmo a estimular o PMDB a convidar Aécio para trocar de legenda, na suposição de que a predominância paulista na direção do PSDB levará à escolha de José Serra como candidato em 2010. As surpresas que o PT aprontou no final de uma campanha eleitoral que poderia ter sido tranqüila para Lula fizeram com que as principais lideranças tucanas se empenhassem cada vez mais na campanha de Alckmin.
Foram estimulados também pela chamada à luta que o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso fez com o seu manifesto aos militantes, onde ressaltava as diferenças entre tucanos e petistas, e chamava a atenção para o perigo de o projeto petista de poder se consolidar sem uma oposição vigorosa do PSDB. Hoje, tudo indica que tanto Aécio quanto Serra já entenderam que o fortalecimento do partido será a única maneira de chegarem à sucessão de Lula em condições políticas de vencer os petistas em 2010, caso Alckmin não vença agora.
Mesmo perdendo,Alckmin será um eleitor importante dentro do partido para a escolha do candidato em 2010.
Quando lançou Aécio Neves candidato, parecia que havia escolhido antecipadamente seu lado na disputa. Mas, dias depois, fez o mesmo com Serra, embaralhando novamente as cartas tucanas.
Dependendo das circunstâncias, poderá até mesmo tentar concorrer novamente à Presidência, o que complicaria mais ainda a situação interna do PSDB.
Entrevista:O Estado inteligente
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