Entrevista:O Estado inteligente

domingo, outubro 08, 2006

CELSO MING

Hora de semear

Celso.Ming@grupoestado.Com.Br

Não foram apenas as eleições que dividiram o Brasil. A crise da agricultura, que já dura mais de dois anos, ainda castiga o Centro-Oeste, mas já aponta algum alívio no Sudeste e no Sul.

Em resumo, é essa a foto do setor às vésperas do plantio que se intensifica à medida que avança a temporada de chuvas.

A situação ainda é grave no Centro-Oeste. Aí, o principal produto agrícola é a soja, que deverá perder espaço para outras culturas. É a região que já sofre com o maior distanciamento dos portos e que agora vai sendo castigada pela deterioração das condições das estradas.

No ano passado, a sojicultura foi duramente atingida pela estiagem, fator que a Conab desconsidera nas projeções dos próximos meses. A produção de soja deve crescer 3,0% sobre a safra passada, mesmo levando-se em conta a perspectiva de redução da área plantada, entre 5,1% e 7,6%.

Essa redução pode chegar a 11% em Goiás, 15% em Mato Grosso e 12% em Mato Grosso do Sul. Já na Região Sul, as condições parecem melhores: espera-se aumento de até 2,5% na área plantada no Paraná e de até 3,5% no Rio Grande do Sul. Mesmo em recuperação, a agricultura gaúcha tem contas a ajustar. A vitória do candidato dos PSDB à Presidência, Geraldo Alckmin, na região mostra que a quebra de renda do agricultor em conseqüência da valorização do real deixou ressentimentos contra o governo Lula.

Mas o mesmo vento também sopra a favor. O diretor da consultoria Agroconsult, Daniel Pessoa, observa que, nas Regiões Sul e Sudeste, o custo de produção ficou mais baixo. Por isso, a rentabilidade dos produtores pode voltar a ficar positiva.

Uma das razões dessa redução de custos é, paradoxalmente, o câmbio, até aqui apontado como vilão. Se, por um lado, reduz a renda em reais do agricultor, por outro, o câmbio valorizado empurra para baixo os preços dos defensivos. 'Apesar disso, é mínima a possibilidade da volta aos bons tempos da safra 2003/2004', adverte Pessoa.

Mesmo com os preços mais baixos, na última safra o consumo de defensivos foi relativamente fraco. Dados da Associação Nacional para Difusão de Adubos (Anda) mostram que o ano de 2006 deve fechar com um consumo entre 19,0 milhões e 19,2 milhões de toneladas, quase 5% abaixo do registrado no ano passado, que, por sua vez, já havia sido 11% mais baixo do que o de 2004.

Para o diretor-executivo da Anda, Eduardo Daher, a próxima safra deverá apontar números parecidos com esses. 'O consumo de defensivos só não cairá mais porque há aumento da demanda nas áreas dos quatro Cs, as atrações da hora: cana-de-açúcar, café, cítricos e celulose.'

Este é outro fator que explica a divisão do País, já que esses produtos são menos relevantes no Centro-Oeste e no Sul. Ainda conforme os dados da Anda, o consumo de defensivos até agosto deste ano caiu 26% em Mato Grosso, mas cresceu 7% em São Paulo.

Pela forte concentração das atividades nesses quatro Cs, embora também se queixem, os agricultores paulistas não foram tão atingidos pela crise. É o que observa o pesquisador do Instituto de Economia Agrícola (IEA), Celso Vegro. Ele crê que, em vez de diminuir, a área plantada em São Paulo deve crescer até 10%.

De acordo com o primeiro levantamento de intenção de plantio para a safra 2006/2007 divulgado pela Conab na quinta-feira, as estimativas são de uma redução de até 5,3% na área total plantada com grãos no País. A produção está estimada em alguma coisa entre 117,7 milhões e 120,6 milhões de toneladas.

Se esses cálculos estiverem certos, isso significa que, na melhor das hipóteses, o aumento da produção em relação à safra passada, que foi de 119,9 milhões de toneladas, será de mísero 0,6%.

As informações divulgadas pela Anfavea sobre vendas de máquinas agrícolas confirmam que o setor ainda precisará de tempo para se recuperar. Apesar do avanço de 4,5% das vendas totais, nos nove primeiros meses deste ano, as vendas de cultivadores foi 4,5% menor do que no mesmo período do ano passado. E as de colheitadeiras caíram uma enormidade: 47,4%.

Os serviços de meteorologia indicam que o clima deve colaborar, especialmente com a retração do fenômeno El Niño. O dólar, outro adversário, dificilmente afundará mais em relação ao real. Isso sugere que o câmbio de comercialização não será muito diferente do câmbio da fase de plantio, quando são feitos os cálculos do retorno da atividade.

'A perspectiva para a próxima safra é de que os produtores ao menos não terão prejuízo', aposta José Carlos Hausknecht, da MB Associados. Pode ser pouco, mas já é mais encorajador do que a história da safra passada.

COLABOROU DANIELLE CHAVES

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