O Estado de S. Paulo |
9/1/2008 |
O governo cometeu um equívoco ao apostar no discurso dos ricos contra os pobres na tentativa de assegurar a aprovação da CPMF. A opinião pública “comprou” a bandeira da oposição contra o excesso de impostos e o improvável aconteceu. Na avaliação do desastre, o Palácio do Planalto reconheceu erros, mas valorizou basicamente as falhas de relacionamento no Congresso, não incluindo na lista dos maus passos a concepção de que imposto é assunto de “elite”. Resultado: vai repetindo o engano agora, no enfrentamento às reações ao pacote tributário com o qual inicia 2008 no mesmo clima de conflito político que marcou o fecho de 2007. Dois políticos governistas - um federal, outro municipal - explicitaram o desprezo à anunciada tática oposicionista de fazer da luta contra os impostos uma motivação eleitoral nas disputas para prefeituras e Câmaras Municipais. O líder do governo no Senado, Romero Jucá, disse que imposto é “assunto alienígena para os municípios” e comparou a abordagem de “um negócio desses” à introdução da crise no Afeganistão no debate das campanhas municipais. Já o presidente do PT paulista, vereador José Américo Dias, comemorou a escolha do tema por parte dos adversários, “porque aí ficará mais claro o discurso pró-elite do DEM e do PSDB”. Tanto a opção governista quanto a oposicionista de estabelecer uma aliança com eleitorado específico, dando por perdida a luta na seara do adversário, tem sua validade como estratégia de atuação. Desde que as perdas e os ganhos tenham sido bem pesados e medidos. A oposição escolheu falar da classe média para cima, entendendo que é inútil tentar buscar apoio entre o público beneficiado pelos programas assistencialistas. É a conta de quem está em desvantagem. No prejuízo, qualquer ganho é lucro. Já o governo, com um nicho de votantes garantido, em tese não poderia se pôr em confronto com outras camadas que, se não garantem sozinhas uma vitória, são indispensáveis para assegurar a vantagem. Desprezá-las significa um risco de perder vantagem, entregando de bandeja ao adversário uma parte dos eleitores. Ao contrário do que diz o líder Romero Jucá, imposto não é assunto “alienígena” aos municípios. Diz respeito a todos os cidadãos - embora o governo trabalhe com a parcela deles que não se dá conta disso - que, por sua vez, residem todos nos municípios. Diferentemente do que acredita o vereador José Américo, a causa dos impostos não isola os dois maiores partidos de oposição em nicho elitista, como ficou demonstrado nas pesquisas de opinião que registraram apoio amplamente majoritário aos que combateram a CPMF. Esta lição da derrota não foi aprendida pelo governo, que também revela uma visão deformada de cidadania ao preferir apostar na ignorância de muitos sobre o destino do dinheiro transferido à administração federal. O agente público bem-intencionado assumiria o debate do tema como fator de tomada consciência social sobre a boa gestão dos recursos de todos. Mas, pelo andar da carruagem, nesta campanha eleitoral o governo terminará por imprimir caráter de conspiração e preconceito de classe à discussão de um assunto que representa o mais essencial dos direitos sociais. Bico calado Tecnicamente, o PSDB não aderiu à ação de inconstitucionalidade do Democratas contra o aumento do IOF porque seus advogados consideram a causa perdida. Politicamente, estava em jogo a coerência: o governo Fernando Henrique Cardoso também recorreu à elevação da alíquota do Imposto sobre Operações Financeiras quando ficou por seis meses sem a arrecadação da CPMF. Porta aberta O presidente do Tribunal Superior Eleitoral, Marco Aurélio Mello, deu a dica: criticou abertamente a medida provisória editada no fim do ano passado aumentando os recursos e incluindo entre os atendidos pelo Bolsa-Família jovens de 16 e 17 anos de idade, por infringir a proibição legal de distribuição de benefícios em ano eleitoral. A oposição, no entanto, até agora não manifestou intenção de recorrer à Justiça contra a MP que, segundo Marco Aurélio, poderia ser também objeto de ação junto ao Supremo Tribunal Federal. “A medida é flagrantemente inconstitucional” porque, potencialmente, influi no resultado das eleições. O ministro reconhece que a hesitação dos partidos oposicionistas é compreensível, o mesmo não se aplicando, entretanto, ao Ministério Público, que tampouco se pronunciou. De acordo com a legislação em vigor, no ano de eleição só pode haver distribuição de benefícios em casos de calamidades, emergências ou de continuidade de programas sociais com recursos previstos no Orçamento anterior. Não é o caso da ampliação do Bolsa-Família feita nos últimos dias de 2007. Se a verba adicional já constasse do Orçamento não seria necessária a medida provisória. |
Entrevista:O Estado inteligente
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quarta-feira, janeiro 09, 2008
Dora Kramer - Impostos e cidadania
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