Como, de resto, sempre se soube no governo que não iria acontecer. Tirando os interessados em disseminar a idéia (falsa) de que o "diálogo com a sociedade" ocorreria por intermédio de seus 103 conselheiros, cujas opiniões serviriam para orientar ações do presidente que, com isso, não seria um refém das pressões do Congresso, os demais tinham perfeita consciência de que o Conselhão nasceu fadado a produzir palavras ao vento.
Pois eis que reportagem de Luciana Nunes Leal publicada ontem no Estado desenha a evidência com provas e o insuspeito aval de antigos e atuais integrantes.
Não que o Conselhão jamais tenha debatido temas importantes. Ao contrário, discutiu a respeito de tudo: reformas da Previdência, política, sindicatos, leis trabalhistas, tributos, política econômica, estrutura do Estado, desenvolvimento, estratégias de futuro, etc.
Mas nenhuma proposta produzida pelo CDES teve repercussão ou acolhimento, nem social nem institucional. Os conselheiros falaram literalmente para as paredes da sala de reuniões. Eles mesmos atestam o vazio dessa estrutura de aconselhamento do presidente, que muitas vezes participa, "prestigia" as reuniões, envia ministros aos debates. Mas, dessas trocas de idéias, sobra apenas a conta das passagens e estadias dos debatedores.
No ano passado o orçamento foi de R$ 1,5 milhão e para 2008 está previsto um aumento, serão R$ 2,6 milhões. Segundo a secretária do CDES, Esther Bemerguy, um reajuste imprescindível, dado o aumento de despesas com viagens agora que o Brasil assumiu a Associação Internacional de Conselhos, o Conselhão ganha novas responsabilidades e "cresce de importância".
Não é o que se depreende da fala dos conselheiros. Arthur Henriques da Silva Santos, da CUT, acha a experiência do "diálogo social muito positiva", mas não cita uma experiência produtiva sequer.
Zilda Arns, ex-coordenadora da Pastoral da Criança elogia no conselho "a possibilidade de todos se manifestarem". Cezar Britto, presidente da Ordem dos Advogados do Brasil, comemora o fato de se produzirem "discussões fundamentais para a sociedade", mas aponta "um vácuo" entre produção e execução.
O presidente do Sindicato dos Eletricitários de São Paulo, Antônio Carlos dos Reis, gostaria que "os conselheiros fossem mais ouvidos pelo governo" e nutre a esperança de que a proposta elaborada por um dos grupos de trabalho sobre reforma tributária ganhe importância a partir do momento que o governo encaminhe ao Congresso a reforma.
A realidade das reformas da Previdência, política e sindical mostra o quanto vale, no Congresso, a chancela do Conselhão.
O próprio Antônio Carlos traça um quadro do mundo real: "O que acontece é que o presidente fala, os ministros falam, o presidente sai, os ministros saem e aí ficam os conselheiros falando. Dali a pouco, todo mundo vai embora." E nada acontece, faltou acrescentar.
O presidente da Fiesp, Paulo Skaf, é outro entusiasta do Conselhão. Crítico de quem não entende a função de aconselhamento. "O conselho não nasceu para tomar decisões", diz, lembrando que o presidente não é obrigado a acatar as opiniões. Para ele, o papel de assessoria está sendo muito bem cumprido. "Se alguém entende que não, é porque não entende o que é um conselho consultivo."
De fato. É difícil entender qual a serventia de uma instância de consultoria cujas consultas não são levadas em consideração.
Skaf não esclarece o detalhe. Dá pistas a respeito de outros aspectos, porém. Sobre a importância para si - "Me considero um membro do conselho do presidente" -, para seus pares - "É uma oportunidade para as pessoas se conhecerem" - e para a liberdade de expressão - "Os conselheiros têm independência".
Falta terem eficácia. Senão, convalidam um gasto inútil de dinheiro, avalizam uma propaganda enganosa e protagonizam muita conversa jogada fora.
Dizer que conselhos semelhantes existem em outros 70 países não resolve a questão. Pois não é sobre o funcionamento deles que se impõe uma justificativa e sim sobre o serviço que presta o colegiado brasileiro à sociedade que supostamente representa.
A secretária Esther Bemerguy enxerga nele o valor da "composição heterogênea" que não busca o consenso, "mas o entendimento". Desde que em torno de algo com algum objetivo prático e alguma razão de ser legitimada pelo reconhecimento da sociedade.
Na trave
No afã de defender a nomeação de seu ministro de Minas e Energia, o presidente Lula disse que o técnico de um time não precisa ser o melhor jogador da equipe.
Mas, isso não disse, precisa, e muito, entender de futebol.