Editorial |
O Estado de S. Paulo |
25/1/2008 |
A reunião ministerial de anteontem, a 16ª da era Lula, ficará na memória da opinião pública por mais de um motivo, além da alusão sem pé nem cabeça do presidente à Santa Ceia. Textualmente: “Muitas vezes nós ficamos cinco anos juntos, sentamos a esta mesa aqui e parece a Santa Ceia: todo mundo amigo (nem todo mundo, como se sabe). Mas depois passamos um ano sem conversar entre nós.” Em primeiro lugar, serviu de pano de fundo para um retrato irretocável do que é este governo - traçado involuntariamente pelo próprio Lula a certa altura do evento que se arrastou por cinco horas e meia, incluída a pausa para a distribuição de sanduíches de presunto (um alimento inconcebível na refeição com que Jesus e os seus 12 apóstolos celebravam o Pessach, a páscoa judaica). Insistindo na crítica à sintomática falta de entrosamento entre os seus 37 ministros e secretários com status ministerial - o que motivou a disparatada analogia com a célebre passagem bíblica -, Lula os repreendeu porque “há quase meses e meses (sic) que vocês não trocam idéia”, para arrematar: “Muitos aqui não sabem 20% do que o governo já realizou.” Assim é pela simples razão, decerto inadmissível para o presidente, mas nem por isso menos verdadeira, de que a maioria deles não realizou coisa alguma, até porque nesse enxundioso, abagunçado Gabinete alguns não têm mesmo nada que fazer, portanto, nenhuma idéia para trocar. (É de se perguntar, a propósito, se Lula seria capaz de dizer, de bate-pronto, os nomes de todos os membros dessa sua superpovoada equipe. Mas passemos.) O ponto a reter da confissão presidencial é o que o levou a fazê-la. E isso remete ao segundo aspecto do caráter memorável do encontro. Pois só no mundo das aparências o acontecido pode ser equiparado a uma reunião ministerial, no sentido clássico de iniciativa tomada pelo chefe de governo para anunciar ou passar em revista, com o primeiro escalão da administração nacional, os programas concebidos para formar o cerne de sua gestão. O que ocorreu quarta-feira no Planalto foi uma reunião de cunho exclusivamente eleitoral. Isso se pode afirmar sem qualquer hesitação com fundamento no que o presidente disse uma vez e outra e outra ainda - insuflando em suas palavras uma ênfase e uma convicção que encantariam qualquer platéia se se referissem à defesa do interesse público. “A política é o centro da atividade de um governo”, ensinou Lula. “Tudo o que nós fazemos começa pela política e termina tendo um resultado político.” Seria uma demonstração de descortino se a política que ele tem em mente se escrevesse com P. Como a escreve com p, substitua-se política por eleição e resultado político por resultado eleitoral e se chegará ao centro da atividade que o absorve incessantemente e na qual ele deseja engajar todo o governo. Se não nunca antes, poucas vezes antes um presidente brasileiro terá sido tão explícito ao exortar os seus colaboradores diretos a usar a máquina, acertando os respectivos ponteiros para agir no Executivo e no Congresso como expoentes de uma coalizão de 14 partidos: ministros não podem se furtar a atender às demandas dos correligionários por verbas e nomeações. Em dado momento, Lula disse que a derrota na votação da CPMF foi uma “lição”. O ministro de Relações Institucionais, José Múcio Monteiro, cujo papel não pode ser subestimado doravante, explicaria por quê. Com uma franqueza reveladora do que o lulismo entende por governar, diagnosticou: “Erramos quando demoramos a preencher os cargos. Capitalizamos pouco o potencial político que cada ministro tem.” Ele, o presidente, já está decidido a capitalizar o seu ao máximo nas eleições municipais deste ano, caracterizadas como “pré-disputa” de 2010. Comprometeu-se explicitamente a participar da campanha naquelas grandes cidades em que a base, devidamente apaziguada pelo Planalto, se una em torno de um só candidato. “Lula quer participar intensamente das campanhas”, confirmou o líder do governo na Câmara, o petista Henrique Fontana. Em suma, essa Santa Ceia em que só se tratou da “distribuição do pão” vaporizou as derradeiras ilusões que pudessem ter sobrevivido sobre o que o presidente considera ético e legítimo no exercício do poder - simplesmente tudo. |
Entrevista:O Estado inteligente
- Índice atual:www.indicedeartigosetc.blogspot.com.br/
- INDICE ANTERIOR a Setembro 28, 2008
sexta-feira, janeiro 25, 2008
A distribuição do pão
Arquivo do blog
-
▼
2008
(5781)
-
▼
janeiro
(418)
- Muito cartão para pouco governo
- Para não dizerem que poupo Lula
- Clipping de 31 de janeiro
- Míriam Leitão - Falta biodiesel
- Merval Pereira - Solidariedade na crise
- Jânio de Freitas - As verbas submersas
- Eliane Cantanhede - De dentro do navio
- Dora Kramer - O velho truque da investigação
- Clóvis Rossi - Os donos do mundo
- Celso Ming - Mais dólares nos mercados
- Alberto Tamer - Fed optou pela inflação
- Rei Juan Carlos telefona para Marta: “Por qué no t...
- Ameaça nacionalista à Vale
- Na comparação com governo FHC, gastos com cartão c...
- Lucia Hippolito:Ética Pública ladeira abaixo
- Míriam Leitão - Hora de cautela
- Merval Pereira - Ganância e complacência
- Dora Kramer - Sem pai nem mãe
- Clóvis Rossi - Os com e os sem-fronteiras
- Celso Ming - É o reforço do crédito
- Uma tendência
- Marcos Sá Corrêa
- AUGUSTO NUNES - A absolvição dos assassinos da mata
- Clipping de 30 de janeiro
- Antonio Sepulveda Efeméride
- Clóvis Rossi - Os Alpes já não estão brancos
- Celso Ming - O neurocirurgião tem tremedeira
- Eliane Cantanhede - Novo amor
- Dora Kramer - Dance, mas dance direito
- Míriam Leitão - Os duelos
- Merval Pereira - Mudança de guarda
- Luiz Garcia - Operação Porta Fechada
- Clipping de 29 de janeiro
- O valor do silêncio-Noblat 28/1
- Clipping do dia 27/01/2008
- Clipping do dia 26/01/2008 ...
- Clipping de 28 de janeiro
- Megalópole
- Xenofobia rediviva investe contra expansão da Vale
- Cora Ronai - Crônica de duas cidades
- O uso político das elétricas
- Celso Ming
- Mailson da Nóbrega
- Fernando Henrique Cardoso
- Alberto Tamer
- DANIEL PISA
- DORA KRAMER Um fio desencapado
- O poder da cidade
- As universidades federais sob Lula
- Os incêndios no HC
- As promessas não decolaram
- Miriam Leitão O preço da riqueza
- Merval Pereira Água, fogo e terra
- AUGUSTO NUNES SETE DIAS
- Zé mineiro e João baiano
- VEJA Carta ao leitor
- VEJA Entrevista: Bruno Chateaubriand
- Diogo Mainardi
- André Petry
- Stephen Kanitz
- MILLÔR
- Reinaldo Azevedo
- Roberto Pompeu de Toledo
- Corrupção O relatório final do escândalo do...
- O PMDB aumenta seu espaço na gestão Lula
- Eleições de brincadeirinha com partido único
- Volatilidade e medo da recessão continuam
- Francês dá desfalque de 7 bilhões de dólares
- Radar
- A máquina que trata pacientes de osteoporose
- Trânsito Combinação mortal: álcool e direção
- As conseqüências do desperdício global de água
- Ecologia
- Imagens aéreas da América Latina
- Onde os Fracos Não Têm Vez, dos irmãos Coen
- A CIA e a cultura durante a Guerra Fria
- Música A vida de um tocador de pratos
- Miriam Leitão Dois mundos
- Merval Pereira Parece, mas não é
- Celso Ming Um barulho na escuridão
- DORA KRAMER Um homem vertical
- IGOR GIELOW Moratória amazônica
- Clipping de 25 de janeiro
- A greve dos advogados
- A distribuição do pão
- Dora Kramer - Quando o carnaval passar
- Celso Ming - Tranca na porta arrombada
- Míriam Leitão - Como se desmata
- Merval Pereira - Onda protecionista
- Clipping Valor Econômico
- Prêmio ao invasor
- NELSON MOTTA Feijão, pagode e globalização
- Epidemia de bobagens
- Brasil, uma potência econômica
- Clipping de 24 de janeiro
- Carlos Alberto Sardenberg Mérito e sorte
- Como frear a queda?- Joseph E. Stiglitz
- Merval Pereira - A Besta
- Míriam Leitão - Mundo mais difícil
- Demétrio Magnoli Uma estrela vermelha no jardim
-
▼
janeiro
(418)
- Blog do Lampreia
- Caio Blinder
- Adriano Pires
- Democracia Politica e novo reformismo
- Blog do VILLA
- Augusto Nunes
- Reinaldo Azevedo
- Conteudo Livre
- Indice anterior a 4 dezembro de 2005
- Google News
- INDICE ATUALIZADO
- INDICE ATE4 DEZEMBRO 2005
- Blog Noblat
- e-agora
- CLIPPING DE NOTICIAS
- truthout
- BLOG JOSIAS DE SOUZA