O Estado de S. Paulo |
29/1/2008 |
Raros são os ministros que afrontam abertamente a Comissão de Ética Pública, mas muitos são os que falam mal dela no lusco-fusco de gabinetes, protegidos pelo anonimato. Entre os ousados - não chamemos de corajosos em respeito ao adjetivo -, só dois até agora disseram, com todos os efes e erres, o que pensam das recomendações da comissão. Carlos Lupi, do Trabalho, não só ignora a orientação para que opte entre o ministério e a presidência do PDT, como passou a presidir atos do partido no horário do expediente, e Geddel Vieira Lima, da Integração Nacional, já avisou aos navegantes que atenderá a quantos convites lhe forem feitos por empresas privadas para desfiles e festas de carnaval, a despeito do gesto ser considerado impróprio pela comissão. Os demais dividem-se entre os que consultaram e seguiram a orientação sobre conflito de interesses e os que se calam em público, mas, no particular, criticam a “hipocrisia” da comissão e suas exigências, consideradas excessivas, não raro mais realistas que a lei. A presidir a polêmica surda, o silêncio conivente do presidente Luiz Inácio da Silva, o único servidor de primeiro escalão fora do alcance dos ditames da comissão e também o único com o poder de exigir o cumprimento de suas orientações. Nenhuma das autoridades, porém, nem as ousadas nem as retraídas nem o árbitro, têm a coragem - aí sim se aplica o termo - de propor abertamente o fim da Comissão de Ética Pública, criada em maio de 1999 para fazer frente à crescente sensação na sociedade de que agentes públicos têm a prerrogativa da impunidade. Se propusessem, pareceriam antiéticos, embora seja isso mesmo que pareçam ser ao sinceramente desconhecerem o que faz e para que serve a comissão ou propositadamente fingirem não conhecer suas atribuições. Está tudo escrito no Código de Conduta da Alta Administração Pública, criado em 2000 para municiar a comissão, uma vez que nem todos os desvios de conduta são enquadrados na legislação e para muitos a punição é difícil, demorada e cheia e escapes. Na época pensou-se numa forma de evitá-los por meio de um compromisso moral ao qual todos aderissem ao tomar posse, concordando, assim, com a necessidade de melhorar comportamentos e elevar o padrão ético, com o objetivo muito simples de “assegurar a lisura e a transparência dos atos praticados na condução da coisa pública”. A idéia central está definida na exposição de motivos apresentada pelo então chefe da Casa Civil de Fernando Henrique Cardoso, Pedro Parente: “A conduta dessas autoridades ocupantes dos mais elevados postos da estrutura do Estado servirá como exemplo aos demais servidores que, não obstante sujeitos às diversas normas, tais como o Estatuto do Servidor, a Lei de Improbidade e o Código Penal Brasileiro, ainda assim sempre se sentirão estimulados por exemplos e demonstrações de seus superiores.” Quando resistem a seguir a comissão, ou pior, tentam desmoralizá-la e ignorá-la, como se faz agora, essas autoridades recusam-se à indispensável tarefa de melhorar o padrão de conduta e, mais grave, dão o exemplo oposto ao pretendido. Passam a mensagem de que o enfrentamento às exigências éticas é sinônimo de independência e sinal de presunção de lisura. Quando vêem isso, os escalões inferiores se sentem autorizados a confrontar da mesma forma valores que podem não constar na escrita da legislação, mas, quando seguidos, aumentam a confiabilidade e a legitimidade do poder público. Por que resistir se a finalidade é do bem? Há um livro editado pela Secretaria-Executiva da Presidência da República em 2002, chamado Encontros entre Meios e Fins que explica tudo, razões, objetivos, metas, meios e modos, ponto por ponto. Vale a reprodução de alguns trechos, mas vale mais ainda a leitura do texto completo onde são relatadas experiências de outros países (www.presidencia.gov.br/estrutura_presidencia/cepub/publicacoes/). Ponto de partida: “Grande parte das atuais questões éticas surge na zona cinzenta - cada vez mais ampla - que separa o interesse público do privado.” Objetivo: “Tentar prevenir condutas incompatíveis com o padrão ético almejado para o serviço público, tendo em vista que a punição nem sempre é muito eficaz.” Metodologia: “Explicitação de regras claras de comportamento. É um fator de segurança do administrador público, protegendo-o de acusações infundadas. Na ausência de regras claras de conduta, corre-se o risco de inibir o cidadão honesto de aceitar cargo público de relevo.” Compromisso: “A transgressão dessas normas não implicará, necessariamente, a violação da lei, mas principalmente o descumprimento de um compromisso moral e dos padrões qualitativos estabelecidos para a conduta da Alta Administração.” No livro há uma entrevista com o primeiro presidente da comissão, João Geraldo Piquet Carneiro, cujo título é inspirado na música Estatuto da Gafieira, de Billy Blanco resume o sentido da orientação às autoridades: Dance a Noite Inteira, mas Dance Direito, porque “o ambiente exige respeito”. A administração pública também. |
Entrevista:O Estado inteligente
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terça-feira, janeiro 29, 2008
Dora Kramer - Dance, mas dance direito
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