Entrevista:O Estado inteligente

quinta-feira, outubro 19, 2006

Villas-Bôas CorrêaLula veta paulista para presidente

Coisas da Política
19/10/2006


villasbc@uol.com.br




Inebriado pela vantagem de 20 pontos sobre o adversário Geraldo Alckmin, o candidato-presidente Lula comemorou a virtual eleição para o segundo mandato com mais de 10 dias de antecedência, no deslumbramento que destravou a língua, de natural solta, e não mediu palavras nem as atentou para regras da cartilha das convenções.

A campanha já nem cuida da caça aos votos esquivos - caiu no oba-oba da celebração do feito inédito na história política para candidato com a sua biografia.

E foi com o embalo de vencedor que o presidente-reeleito cumpriu a programação do grande dia, com vários destaques. Nenhum mais significativo que o comício em Manaus, às 13h da temperatura escaldante da capital amazonense, para a assistência modesta de 5 mil pessoas.

Pouco importa o auditório quando a alma está em festa. No improviso da sua eloqüência de encantador de multidões, o orador liberou as frustrações das críticas dos invejosos. E equilibrou-se no fino fio de arame na sentença imprudente, a um passo em falso da queda. Na rija sova ao adversário, Lula foi longe na afirmação profética de que Geraldo Alckmin, se eleito, não conseguiria governar o país, porque "é um paulista com a cabeça na Avenida Paulista".

O estampido da bomba advertiu para o estrago, amortecido no repeteco: "Eu sou pernambucano e devo tudo na minha vida para São Paulo (sic), mas um paulista com a cabeça na Avenida Paulista não conseguirá governar este país, porque não vai governar para o bem da República".

E arrematou com o conselho debochado: "Ele que vá para caravana primeiro para conhecer o país". Seguiu ainda a gozação com a poeira da inveja: "Porque pensa que para governar é só ter um curso universitário, é só conhecer os números. Número não tem importância. Para governar é preciso conhecer e saber bater o coração pelo povo extraordinário, que é o povo brasileiro".

Com o desconto dos ressentimentos, do cansaço, das tensões da campanha manchada por denúncias e trapalhadas petistas, como a da frustrada compra do dossiê por R$ 1,7 milhão, expostos nas fotos de pacotes de reais e de dólares - Lula não conseguiu tirar um auto-retrato que mereça figurar no álbum de um presidente da República, candidato favorito à reeleição.

Há muita poluição, muita impureza, muito lixo toldando a limpidez da imagem e o ranço regionalista no veto ao adversário "paulista e com a cabeça na Avenida Paulista". Ora, tal carapuça de fedor provinciano pode ser enfiada na cabeça de qualquer pessoa que se queira discriminar, como o mineiro com a cuca na Avenida Afonso Pena ou gaúcho vidrado da Rua da Praia.

A clara evidência é que a campanha descolou-se do país real e borboleteia sobre temas isolados. Não apareceu nenhum projeto ou proposta de amplitude nacional, que ofereça alternativas para as perplexidades da população emparedada pelo medo, sitiada em suas casas, acuada pelas gangues do tráfico de drogas, com as favelas dominadas por quadrilhas e a mocidade sem escolas e sem futuro.

O país do Executivo inchado, da degradação ambiental, da derrubada da Amazônia, do fracasso da reforma agrária, da crise moral do Congresso é o ausente, o grande ausente da parolagem, que nada promete nas próximas rodadas de debates e de entrevistas, além dos xingamentos do horário eleitoral.

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