SERIA EXAGERO atribuir toda a desventura que se abateu sobre a oposição ao enredo "Alckmin, um privatista", que a campanha de Lula vem desfilando na avenida desde 2 de outubro.
A rapidez com que o presidente se recobrou do susto do segundo turno, mobilizando o governo inteiro e um exército de aliados nos Estados para trabalhar pela reeleição, ajuda a explicar seu conforto nas pesquisas. A morosidade e a desarticulação do time adversário também.
Mas é inegável que a imagem de "mãos de tesoura" colou em Alckmin, e que esse fenômeno contribui para fazer de Lula o herdeiro majoritário dos votos de Heloísa Helena e Cristovam Buarque.
Dois aspectos chamam a atenção no bombardeio retórico executado por petistas e agregados. O primeiro é que ele tem sido muito bem feito. Ao contrário dos imprevistos surgidos durante a negociação para a compra do dossiê, nada há de "tabajara" na operação em curso.
Não passa dia sem que um dos pitbulls de Lula avance sobre Alckmin -vide Tarso Genro, o homem da "concertação", comparando o tucano a Pinochet. Gente que a partir do dia 30 estará, caso se confirme o quadro desenhado pelas pesquisas, se esfaqueando por espaço no governo e pela vaga na sucessão presidencial de 2010 atua neste momento em perfeita sintonia. Falam todos a mesma língua.
Enquanto isso, Alckmin fala cada vez mais sozinho. A operação também é bem feita porque não consiste apenas em atacar.
Concentra-se em algo mais sutil e eficaz para conquistar o eleitor "migrante" e portanto em processo de decisão: semear a dúvida. Quando o mediador Paulo Markun perguntou a Lula, no "Roda Viva", por que insistir em insinuar que Alckmin venderia Petrobras, Banco do Brasil, CEF etc. se o tucano já havia descartado essa hipótese com todas as letras, o presidente discorreu sobre privatizações passadas e encerrou a resposta com a frase: "Agora, ele que se explique".
Alckmin não tem feito outra coisa, o que em si já é ruim em campanhas eleitorais. Para piorar, as explicações dão a entender que os tucanos se sentem algo envergonhados das privatizações. A imagem do candidato vestindo boné do BB e jaqueta salpicada de logomarcas das estatais "ameaçadas" simboliza a vitória do adversário na batalha retórica.
Outro aspecto curioso é que se trata de uma discussão de faz-de-conta, colocada em pauta por um único motivo: o segundo turno tornou necessário "desconstruir" Alckmin, e para tanto era preciso ligá-lo a FHC, e a palavra mágica, indicavam as qualitativas, era "privatização".
A venda dessas empresas não está na agenda de nenhum dos dois candidatos. A indignação antiprivatista é um discurso com prazo de validade. Morre no próximo dia 30.
Entrevista:O Estado inteligente
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