JOSEF BARAT*
Na inóspita paisagem do Estado brasileiro predominam, até hoje, as características herdadas dos velhos tempos coloniais: patrimonialismo, compadrio e nichos de corporativismo, todos abrigados na sólida e onipresente burocracia ibérica. O ambiente hostil, ou, no mínimo, pouco amigável, se contrapõe às dinâmicas da economia e da sociedade na busca da contemporaneidade. É como se a tartaruga vencesse sempre a corrida com a lebre pelos obstáculos e armadilhas que sorrateiramente põe no caminho. O que são, afinal, carga tributária, conflitos de instâncias decisórias, emaranhado de procedimentos judiciais e prolixidade dos instrumentos legais, senão obstáculos e armadilhas para conter iniciativas de pessoas, empresas e grupos sociais?
Neste contexto são escassas as inovações visando a modernizar efetivamente o Judiciário, o Legislativo e o Executivo. No panorama geral prevalecem os excessos de normas e controles que, a pretexto de impedir desmandos e desvios, na verdade acabam por estimulá-los. Acima de tudo e permeando os três Poderes paira impávida a burocracia estatal que inferniza a vida dos contribuintes (chamados de “patrões” em época de eleições). Burocracia que, no dizer do comediante Woody Allen, “existe para criar um problema onde é clara uma solução”. Do ponto de vista do desenvolvimento econômico, há mais de duas décadas o Estado brasileiro perpetua o marasmo, em vez de fomentar e induzir mudanças estruturais e taxas mais elevadas de crescimento.
Mantido quase tudo como antes no Judiciário e no Legislativo, a novidade, no Executivo, foi a criação das agências reguladoras para fiscalização, controle e monitoração de concessões de serviços públicos. Criadas como autarquias especiais, as agências se vinculam a ministérios tendo, porém, autonomia administrativa, financeira e de gestão. Essa autonomia, associada à capacitação técnica especializada, é o que garante a eqüidistância que o poder regulador deve ter em relação aos interesses envolvidos, quais sejam: a) do governo, com as políticas públicas; b) dos concessionários e agentes regulados, com a preservação do equilíbrio econômico e financeiro das concessões; e c) dos trabalhadores, com suas pautas de reivindicações. O importante é que, ao arbitrar conflitos e coibir abusos, a agência reguladora visa, primordialmente, à defesa do consumidor e dos interesses difusos da sociedade. Ou seja, a defesa intransigente do interesse público prevalece sempre sobre a intervenção dos interesses privados.
Portanto, uma agência reguladora independente, por meio dos seus atos administrativos, visa: a) a manter a continuidade, regularidade e eficiência na prestação de um serviço público de interesse coletivo; b) a preservar um ambiente confiável para os agentes públicos e privados que irão investir nos diversos segmentos objeto da regulação; c) a zelar pelo interesse de usuários e consumidores; e d) a cumprir rigorosamente a legislação pertinente ao setor por ela regulado.
O desconhecimento das atribuições e responsabilidades das agências reguladoras – fundadas principalmente na legislação concernente: a) às concessões de serviços públicos; b) às licitações; c) à natureza e funcionamento das agências; d) aos direitos do consumidor; e e) à defesa da concorrência – tem causado incontáveis conflitos de jurisdição e competência. Tais conflitos se configuram mais graves quando se dão entre as agências e o Judiciário.
Caso exemplar se deu em relação à aviação civil. Desde que foi incluída na Lei de Falências a possibilidade de recuperação judicial de uma empresa de transporte aéreo – portanto de uma concessionária de serviço público – criou-se, inevitavelmente, um sério conflito entre decisões judiciais pautadas pelo foco na recuperação da empresa, de um lado, e a preservação do interesse difuso da sociedade, de outro. O processo judicial extravasa, assim, os seus limites de universalidade de créditos e débitos inerentes à recuperação de uma empresa, para atingir o próprio processo de regulação da aviação civil.
A sociedade tem assistido – em geral por divulgação da mídia – ao conflito entre a defesa dos interesses privados de uma empresa em recuperação judicial e a defesa do interesse público. Agindo com independência e responsabilidade, a agência reguladora tem contado com o apoio do Ministério Público Federal, bem como dos órgãos de defesa do consumidor e da concorrência. A autonomia das agências reguladoras é o cerne da questão e provoca os temores e as resistências comuns a todas as inovações. Todos têm medo de perder parcelas de poder.
*Josef Barat, consultor, é membro do Conselho de Economia e Política da Federação do
Comércio do Estado de São Paulo
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