Entrevista:O Estado inteligente

domingo, outubro 22, 2006

Miriam Leitão Nossa culpa

O candidato Lula acusou o candidato Alckmin de ver a Amazônia de uma janela da Avenida Paulista.Pode-se dizer dele que vê a Amazônia de um pátio do ABC. E antes que um leitor mais lulista me acuse de ver a floresta de uma praia do Rio, admito fazer parte do problema: o Brasil tem vivido toda a sua história de costas para a floresta. Tanto que, nesta eleição, o tema ambiental — que mobiliza o mundo — passou batido. Por culpa só dos candidatos? Não, por culpa de todos, inclusive minha que sou jornalista e entrevistei os candidatos.

Patético o artigo escrito por três ministros, Marina Silva, Celso Amorim e Sérgio Rezende, dizendo: “Os que se preocupam com o clima do planeta deveriam se dedicar a influenciar seus governos. Da Amazônia nós estamos cuidando.” Nós quem? No governo Lula, só nos três primeiros anos, foram destruídos 70 mil km² de floresta.A afirmação de que o esmatamento está em queda de 32% não faz sentido por dois motivos. Primeiro, depois do pico de 29 mil km² de 95, o governo Fernando Henrique derrubou a taxa para 13 mil km², após isso, voltou a subir.No começo do governo Lula, foi a 26 mil km² e, depois, caiu para 18,9 mil km² no ano passado. O que os dados mostram é uma subida constante de patamar, com algumas quedas episódicas, que não alteram a tendência. Segundo, isso lá é número que se comemore? Para se ter ordem de grandeza, no livro “A ferro e fogo”, Warren Dean informa que: a exploração predatória de pau-brasil pelos portugueses e o tráfico de madeira feito pelos ingleses, espanhóis, franceses conseguiram desmatar 6 mil km² de mata nos primeiros 100 anos do Brasil. O governo Lula comemora ter destruído em um ano “apenas” 215% mais do que foi desmatado em um século de exploração predatória do extinto pau-brasil.

Estamos cuidando muito mal da Amazônia, essa é a verdade que a coalizão ministerial deveria admitir antes de brindar a chegada de Al Gore ao Brasil com esse bolorento discurso xen ó f o b o .

O ex-futuro presidente dos Estados Unidos, como ele se apresenta fazendo blague consigo mesmo, tem feito um excelente trabalho difundindo alertas sobre os riscos que o planeta corre, os erros do governo americano, o perigo da produção excessiva de gases do efeito estufa, principalmente pelos cidadãos do país dele. Gore faz um alerta à Humanidade e, para ela, trabalha. Não devemos apequenar seu discurso.

Na entrevista ao GLOBO, ele se encheu de cuidados para dizer que “a Amazônia é um assunto exclusivo dos brasileiros.

Mas se você me perguntar o que eu faria se fosse brasileiro, argumentaria que o valor econômico da biodiversidade da Amazônia é milhares de vezes maior do que o valor das árvores que são cortadas”. Talvez por delicadeza, não falou das árvores que são simplesmente queimadas por grileiros.

Estamos cuidando da Amazônia da mesma forma que cuidamos da Mata Atlântica, reduzida a um resíduo de 7% que continua sendo desmatado ainda hoje.

Betty Mindlin, economista e antropóloga, que trabalhou no estudo do impacto do Pólo Noroeste, que pavimentou a estrada Cuiabá-Porto Velho, viu de perto a destruição de parte da floresta. Ela lembra que a área mais protegida da Amazônia é a entregue aos poucos milhares de índios remanescentes: — Só 3% da terra indígena estão desmatados.

Quando é que o Brasil vai perceber que mata em pé é dinheiro? — diz ela.

Assisti ao filme de Al Gore, em São Paulo, ao lado do secretário de Meio Ambiente do estado, José Goldemberg.

Ele diz que o programa do PSDB — sobre o qual Geraldo Alckmin nem falou — defende o fim de qualquer desmatamento na Amazônia.

— Nós temos 600 milhões de hectares desmatados, e isso é o suficiente para qualquer exploração econômica que se queira fazer na região.

É preciso investir em cadeias produtivas que explorem a biodiversidade, o que daria muito dinheiro — afirmou o professor.

Para interromper qualquer derrubada, como propõe Goldemberg; ou para autorizar a exploração da floresta em regime de concessão, como propôs o governo Lula, é preciso uma fiscalização rigorosa. Não basta ter leis; elas têm que ser respeitadas. Portanto os dois partidos — com experiência de governar o Brasil — terão que fazer mais do que fizeram até agora para proteger a Amazônia.

Ela é nossa, mas não a temos merecido.

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