Entrevista:O Estado inteligente

domingo, outubro 08, 2006

MERVAL PEREIRA - A sombra de 2010

O panamenho José Perigault, que fundou o Ibope juntamente com Paulo Montenegro, descobriu certa ocasião que o bairro do Méier era representativo de todo o Estado do Rio de Janeiro. O resultado de uma pesquisa no bairro dava praticamente o mesmo resultado do estado. Muitos anos depois, Carlos Augusto Montenegro, filho do fundador e atual presidente do Ibope, descobriu que o Estado de Minas Gerais é o reflexo do Brasil. Tem sua parte nordeste na região do Vale do Jequitinhonha, e por isso faz parte da Sudene; ao mesmo tempo é a segunda economia do país (disputando com o Rio), com uma região fortemente industrializada, grande influência paulista na divisa com São Paulo; Juiz de Fora é muito ligada ao Rio de Janeiro; e o estado tem no agronegócio uma parte influente de sua economia.

O resultado da eleição presidencial lá foi praticamente igual ao nacional: Lula com 50,80% (48,6% no país), contra 40,6% (41,6% no país). O estado votou literalmente dividido para presidente, enquanto para governador deu uma vitória consagradora em todas as regiões ao governador Aécio Neves, de 77% contra 22% para o petista Nilmário Miranda. Isso não quer dizer que Aécio Neves poderia repetir a façanha em termos nacionais, se for candidato à Presidência da República.

Primeiro porque contou com adversários muito fracos na disputa ao governo.

Além do mais, como lembra Montenegro, a mostra fica distorcida pelo fato de um filho da terra estar na disputa.

Mas, havendo dois paulistas na disputa pela Presidência, numa eleição polarizada, Minas serve como reflexo do resto do país. Mais do que nunca, portanto, uma vitória do tucano Geraldo Alckmin no segundo turno depende da sua performance em Minas Gerais.

Também em São Paulo, Alckmin tem possibilidade de crescer um pouco mais, pois o governador eleito, José Serra, teve 57,93% dos votos paulistas, enquanto Alckmin teve 54,2%. Nesses dois estados, e mais o Rio de Janeiro — o chamado triângulo das bermudas da política nacional —, estão as chances de Alckmin mudar o resultado desta eleição, que ainda tem Lula como o favorito. Mas qual será o empenho real de potenciais candidatos à Presidência da República em 2010 de fazerem de Alckmin o futuro presidente? José Serra, Aécio Neves, Garotinho e talvez até Cesar Maia são adversários entre si, postulantes à mesma vaga, e, elegendo Alckmin, terão dois problemas imediatos: fazer com que, eleito, Alckmin cumpra o acordo tácito de dar fim à reeleição, e colocar de volta na disputa de 2010 ninguém menos do que o próprio Lula. Se, ao contrário, Lula for reeleito, a disputa em 2010, que se prenuncia difícil, ficará mais fácil sem um candidato forte do PT.

Dificilmente haverá um acordo para que alguém de fora da legenda, por mais desmoralizada que esteja, seja o candidato a presidente.

Assim como não aceitaram que Ciro Gomes fosse o vice de Lula pelo PSB, temendo que se tornasse o virtual candidato a sucessor em 2010, com muito mais razão o PT não o quererá agora, que teve uma votação consagradora para deputado federal no Ceará.

A ex-prefeita Marta Suplicy, que assumiu a coordenação da campanha presidencial em São Paulo depois da crise do dossiê, certamente será ministra de um segundo governo Lula, e se cacifará para disputar a indicação do partido para disputar a Presidência.

Também o ministro Tarso Genro nutre essa expectativa, e tudo dependerá da correlação de forças dos diversos grupos que ainda dominam o PT. Genro, que tentou “refundar” o PT e foi atropelado pela turma de José Dirceu, ganhou força depois que o caso do dossiê arrastou para o mesmo limbo em que já estão Delúbio Soares e “companheiros” Ricardo Berzoini, o segundo presidente do partido apeado do poder devido a escândalos de corrupção, o que certamente é mais um recorde para Lula adicionar à sua coleção de m e g a l o m a n i a s .

Ao contrário das previsões, o PT teve apenas castigos brandos do eleitorado.

Apesar de ter perdido cerca de 2 milhões de votos de 2002 para cá, continuou sendo o partido com maior número de votos para a Câmara — 13.989.017, correspondendo a 15,01% dos votos válidos, elegendo 86 deputados. Caiu em relação a 2002, quando obteve 18,39% dos votos e elegeu a maior bancada, com 91 deputados.

Com isso, perdeu o direito de indicar o presidente da Câmara, que será do PMDB, que fez bancada de 89 deputados e pretende chegar a cem, com a adesão de eleitos por partidos que não cumpriram a cláusula de barreira.

Mesmo Lula sendo derrotado agora, o que ainda é uma hipótese remota, continuará sendo o grande líder da oposição, e candidato automático a voltar ao cargo em 2010, quando estará com 65 anos, o que tornará muito mais complexa a disputa p re s i d e n c i a l .

O ex-governador do Rio Anthony Garotinho, que ainda não arquivou seus planos de se candidatar à Presidência, teria então um concorrente muito mais estruturado na área populista, ao passo que, se Lula estiver fora da disputa em 2010, ele poderá disputar esse eleitorado sem uma concorrência tão forte.

Talvez apenas Ciro Gomes, entre os possíveis candidatos, tenha uma entrada forte nesse eleitorado.

É claro que todas essas especulações são sujeitas a alterações radicais nos próximos quatro anos. Mas os potenciais candidatos é claro que trazem para o tempo presente seus projetos futuros, e eles certamente pesarão na hora de se empenharem na campanha eleitoral.

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