Entrevista:O Estado inteligente

sexta-feira, outubro 13, 2006

Luiz Garcia - Os dois americanos




O Globo
13/10/2006

Este artigo não é sobre a campanha eleitoral. Não é, juro, soberba ou facécia do autor. Simplesmente, resignada incapacidade de acrescentar fatos novos ou opiniões originais ao aluvião de comentários, interpretações e palpites que no momento derrama-se na mídia nacional.

Acho que ninguém discorda de que tudo que poderia ser dito e escrito sobre o debate de domingo já foi lido e ouvido nos últimos dias. Já se pronunciaram tanto os competentes como os apaixonados, sem esquecer os apaixonados competentes. (Dos indiferentes incompetentes não temos notícia nem nos interessam.)

Enquanto não passa água nova debaixo dessa ponte, outro tema na mesa: os possíveis novos capítulos da trágica colisão no céu de Mato Grosso entre o Boeing da Gol e o Legacy comprado por um grupo americano.

A investigação vai bem mas não acabou, e o tempo pode esquentar. Não é absurdo esperar uma pressão de Washington contra o resultado das investigações do acidente por autoridades brasileiras, mesmo que o nosso inquérito seja, como deve ser, submetido a foro internacional.

Por enquanto, o problema está sendo agitado nos Estados Unidos quase exclusivamente pelo jornalista Joe Sharkey, passageiro do Legacy. Um carona agradecido, ele está em campanha contra a competência das autoridades brasileiras e pela libertação dos pilotos americanos, mesmo antes de determinada sua culpa ou inocência. Escreve num jornal de média importância, o "Newsday", de Long Island.

A grande imprensa acompanha as investigações discretamente, e a Casa Branca não se manifestou. Nem mesmo deu resposta pública a um apelo para que pedisse ao Brasil a libertação dos pilotos do Legacy.

Mas se as investigações não terminarem rapidamente, com provas irrespondíveis de incompetência ou desídia dos dois pilotos - ou sua absolvição, com autoridades internacionais assinando embaixo - as coisas podem mudar.

O presidente Bush enfrenta até novembro uma dura eleição no Congresso, e corre risco de perder a maioria. De repente, por alguma razão doméstica pode ser importante para a Casa Branca pedir ao Brasil, com bons ou maus modos, a liberação dos dois americanos antes do fim das investigações. Em tese, a presença da dupla no Brasil não é essencial para que se chegue à verdade. Isso disse outro dia o ministro da Defesa, revelando-se insuspeitada autoridade em direito aeronáutico.

Esqueceu-se de acrescentar que, se os pilotos voltarem para casa antes de tudo esclarecido, pode-se apostar que, mesmo sendo declarados culpados de negligência criminosa, dificilmente pagarão por isso.

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