Entrevista:O Estado inteligente

quinta-feira, outubro 12, 2006

Foi o melhor debate da história da política brasileira

Ao nível de equilíbrio do bem e do mal

Rosângela Bittar, Valor Econômico (11/10/06)

O presidente Lula, candidato várias vezes na vida, foi assíduo freqüentador de debates. O ex-presidente Fernando Collor humilhou-o diante de milhões de eleitores na campanha de 1989. O falecido governador Leonel Brizola ridicularizou-o, dando-lhe apelidos jocosos. O ex-presidente Fernando Henrique preferiu a condescendência e dispensou com ele a discussão, alegando ser desnecessário por se tratar de um mito. O PT se submete, os ministros não o enfrentam. Lula esteve sempre acima do bem e do mal.

Luiz Inácio Lula da Silva, na reflexão que se pretende aqui fazer, nunca teria sido tão respeitado como o foi no domingo por seu adversário na disputa da Presidência da República, Geraldo Alckmin, durante debate da TV Bandeirantes. Uma constatação que contraria tudo o que têm dito Lula, o PT e os que agora firmaram a estratégia de vitimizá-lo para sensibilizar o eleitor indeciso.

Há, porém, um petista, o deputado mineiro Paulo Delgado, que sempre foi independente e crítico e talvez por isso mesmo não tenha conseguido a reeleição para a Câmara, que tem uma visão diferente: "Nem Lula foi agredido, nem o debate só tratou de 'baixarias'. Foi o melhor debate da história da política brasileira. O nível foi alto, o Lula foi respeitado e também respeitou, houve um embate político duro entre dois homens adultos". Se os petistas insistirem em ver o debate como hostil, diz Delgado, "é sinal de que querem ganhar a disputa sem resolver os problemas. O PT não pode querer ganhar sem debater essas questões, essa é a agenda, nós temos que explicar os problemas".

Em sua opinião, a exigência da sociedade brasileira é o esclarecimento da agenda negativa da política. O segundo turno teria a função de decantar o principal da agenda que, segundo o deputado, tem hoje dois temas principais, e ele começa pelo segundo para destacar a importância do primeiro. "O segundo grande tema da sociedade brasileira é o progresso industrial e vigor tecnológico. Isto inclui gerar emprego, aumentar o PIB, criar um país com crescimento econômico que possa prescindir de políticas sociais emergenciais".

O primeiro grande tema, porém, "é a moral e os bons costumes da vida pública". Para Delgado, seria inédito no mundo uma sociedade em que existe "desonra na política" com um PIB de primeiro mundo.

"O primeiro debate do segundo turno foi o melhor debate desde a abertura. Os dois candidatos foram tratados como adultos e isso permitiu que a vaidade, as idiossincrasias de cada um, não se tornassem o elemento central". A síntese humorada de Paulo Delgado é: "Foi um debate americano com temas paraguaios".

O Brasil, a seu ver, ainda não se elevou, não tem a dureza que europeus e americanos têm quando se trata do confronto com a moral pública. "A idéia de que a agenda da honestidade é 'baixaria', e que a indignação é irritação, é de um país que não está acostumado a ver essa questão tratada com objetividade e de maneira adulta e respeitosa, como foi".

Paulo Delgado discorda também dos que não perceberam no debate a exposição de programas de governo. São três as funções do debate, diz. A primeira, é ver a integridade do homem público diante do seu contendor. A segunda, principalmente no caso do presidente de um país, é ver como ele reage em situações de risco, a capacidade que tem de absorver críticas sem considerá-las pessoais. E a terceira é colocar na mesa, para discussão, o que está nas fábricas, nas empresas, nas universidades, os assuntos que estão nas instituições e nas ruas.

Há 10 anos, lembra, já coube em debate uma pergunta sobre Aids, e hoje a questão não está mais na rua; como já esteve na agenda a questão do aborto, da fé - este debate derrotou Fernando Henrique Cardoso há 15 anos, porque era da agenda brasileira. "Hoje, perguntar a Lula se ele é católico ou evangélico não seria uma agressão, da mesma maneira que não seria agressão pergunta a Alckmin qual a verdadeira vinculação dele com a Opus Dei".

"Um debate americano com temas paraguaios"

Lula e o PT reclamam que não houve discussão sobre programa de governo, mas houve, sim. Todas as perguntas, respostas, réplicas e tréplicas sempre incluíram críticas a opções feitas pelos partidos em disputa e embutiram também projetos para o futuro. O que não houve foi a substituição total da agenda da honestidade.

Paulo Delgado define: "Não houve debate acadêmico sobre programa de governo, nem ali era o lugar; houve debate político sobre programa de governo". O encontro, diz, elevou o nível da política: "Quem está querendo baixar o nível é o PT. O PT não aguenta esse tipo de debate"

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