Entrevista:O Estado inteligente

domingo, outubro 08, 2006

AUGUSTO NUNES Sete Dias

Sete Dias JB

08/10/2006
Augusto Nunes
augusto@jb.com.br


Lula pousa no pátio de horrores

Luiz Morier
Em 2002, um debate na televisão reúne Ciro Gomes, José Serra, Anthony Garotinho e Lula | foto de Luiz Morier

"Lula é ruim de debate. Como informa o livro do jornalista Ricardo Kotscho, o próprio candidato admite ter sido massacrado por Fernando Collor no último duelo da campanha de 1989. A edição do confronto pela TV Globo ampliou o estrago, mas nem alquimistas da telinha lograriam juntar trechos de modo a tornar vencedor alguém que, na frase de despedida, trocou "maracutaia" por "maracagalha".

No primeiro turno de 2002, beneficiário do efeito dispersivo causado pela aglomeração de presidenciáveis, nem assim Lula foi bem. E escorregou com penosa regularidade em armadilhas banais, uma delas montada por Garotinho.

Inspirado na compulsão de Lula para discorrer sobre o desconhecido com a loquacidade dos especialistas, Garotinho pediu-lhe uma opinião "sobre a Cide". Lula não sabia tratar-se de uma contribuição tributária. Pensou que aquilo era a sigla de alguma entidade federal e soltou o palavrório. Há quatro anos entretido em monólogos, deve ter piorado.

Distante de debates desde 2002, o presidente também se manteve à distância dos jornalistas. Entrevistas coletivas, nem pensar. O campeão do improviso só fica à vontade quando contemplado por platéias de devotos. Fora do templo, o pregador perde a fala.

Lula se engana caso imagine que Geraldo Alckmin não é do ramo. Deputado federal, líder da bancada do governo, é homem familiarizado com o debate parlamentar. Candidato a governador, mostrou que sabe renunciar ao bom-mocismo na hora do ataque.

Terá de agir assim agora, até para mostrar que Lula não o assusta. Terá de escancarar ao país o medo que o confronto instila num adversário supostamente confiante. O candidato à reeleição detesta ser contrariado. E teme as verdades que enfim haverá de ouvir.

"Lula agora terá a chance de mostrar os casos de corrupção que envolvem o PSDB", alvoroçou-se o ex-ministro Ciro Gomes. Não explicou por que o chefe desperdiçou tantas chances oferecidas por emissoras de TV. "O presidente está sequioso pelo debate", fantasiou o pastor-auxiliar Tarso Genro. Bobagem.

Lula juntou-se ao elenco de comediantes. "Preferiria discutir projetos para o país, mas estou com muita vontade de debater ética e corrupção", disfarçou. A menos que Alckmin sofra de inclinações suicidas, o presidente vai matar a vontade. Porque o Brasil quer saber sobretudo de ética, de valores morais, de honradez.

Lula poderá atirar ao adversário, a FH, às elites ou às caravelas de Cabral as acusações que quiser. Mas terá de falar (além de ouvir muito) sobre o escândalo do dossiê, sobre as safadezas do churrasqueiro de estimação ou do companheiro Berzoini. E também sobre mensaleiros, sanguessugas, vampiros, okamottos, lulinhas. E mais. Muito mais.

Essa bancada promete fazer bonito

Embora constrangido com o amadorismo da ala do PT, Paulo Maluf, do PP paulista, deverá aceitar a liderança da bancada da bandalheira na Câmara dos Deputados. Transformado no deputado mais votado do país, Maluf (um pouco de tudo) vai comandar gente como Antonio Palocci (estupro de contas bancárias), Ricardo Berzoini (comércio de dossiês), João Paulo Cunha (mensalão e tráfico de influência) ou José Mentor (mensalão e venda de informações sigilosas).

A última do sherloque

Candidato a deputado federal, Ciro Gomes mostrou que é bom de voto. Candidato a investigador de polícia, confirmou que é ruim de cabeça. A última do sherloque cearense foi o esclarecimento sumário do escândalo do dossiê forjado.

"Conheço a prática do José Serra e do PSDB", gabou-se o onisciente vice-rei do Nordeste. "Montaram eles próprios o dossiê e procuraram os aprendizes de mafiosos do PT de São Paulo, que caíram de quatro patas, idiotas e irresponsáveis".

Um Clodovil sem projetos é menos inquietante que um Ciro Gomes cheio de idéias.

Luta pelo emprego

Na entrevista coletiva que convocou para terça-feira, o ministro da Fazenda, Guido Mantega, poderia ter explicado melhor o corte de R$ 1,6 bilhão sofrido pelo Orçamento dias antes. Ou, então, avisado que, horas depois, o governo liberaria R$ 1,5 bilhão para amaciar Estados eleitoralmente hostis. Mas Mantega não gosta de lidar com temas econômicos. Prefere tratar de política.

"Talvez o mercado goste mais do Alckmin, mas a população gosta do Lula", recitou. "Mercado" é uma entidade tão misteriosa quanto a presença de alguém como Mantega num ministério.

Pela amputação de São Paulo

O bravo colunista Mauro Santayana fez uma ousada síntese do primeiro turno. "O peso de São Paulo opôs-se a uma vontade majoritária do resto do Brasil", resumiu no JB. Como observou o Estadão, Alckmin venceu no Brasil que sustenta o governo federal. Perdeu no que é sustentado. Mas Santayana é duro na queda.

"Os grandes problemas brasileiros dos últimos 12 anos surgiram no pujante Estado", jura o arquiteto da revolução constitucionalista pelo avesso. Impiedoso com os rebeldes de 32, Santayana só sossegará quando separar o Brasil de São Paulo.

Controlador descontrolado

Jorge Hage, chefe da Controladoria-Geral da União, foi à reunião de ministros na mansão de Hélio Costa (Comunicações) para ensinar à companheirada o pulo do gato. Como virar cabo eleitoral de Lula sem ferir a ética, o decoro e a legislação? Como caçar votos para o chefe sem se expor às denúncias da imprensa a serviço das elites?

O professor Hage queimou a língua antes da aula. Ao deslocar-se para o local do encontro a bordo do carro oficial, Hage atropelou a lei que proíbe o uso do veículo para atividades desvinculadas do cargo. O controlador precisa de controles.

Sorriso revogado

Depois de ter freqüentado a contragosto a campanha do inimigo íntimo Aloizio Mercadante, a ex-prefeita Marta Suplicy assumiu alegremente o comando da locomotiva lulista em São Paulo. E abriu a discurseira com a sem-cerimônia de sempre. "O Alckmin acabou de juntar-se aos Garotinho", indignou-se. "Como vai falar em ética?"

Amnésia é coisa contagiosa na turma da estrela. Na temporada eleitoral de 1998, a ex-prefeita enfeitou os palanques do Rio de braços dados com Garotinho, candidato ao governo apoiado pelo PT da companheira (e vice) Benedita. Marta sorria.

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